564 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 198
(peso líquido) correspondem a 100 g de carne (peso líquido) ou a dois ovos».
Permito-me concluir daqui que, na impossibilidade de tornar rapidamente extensivo a todos o consumo habitual de carne, não é difícil alargar enormemente o consumo de peixe. Se as costas continentais não bastarem para tanto e tiverem de abandonar-se os pesqueiros habituais de Cabo Branco, onde o peixe vai rareando de forma alarmante, aí estão Cabo Verde e Angola, que podem inundar o País com pescado.
Bastará lembrar, para ilustrar a afirmação, que Angola transforma anualmente em farinha de peixe cerca de 250 000 i de pescado fresco. Cabo Verde, com a sua abundância e variedade de peixe, poderia, com navios rápidos, convenientemente equipados, substituir as pescas de Cabo Branco. É um problema que se me não afigura de difícil solução e aqui ponho por lembrança para ser considerado por quem de direito.
Insisto, porém, em que há possibilidade de abastecer, pelo menos os centros urbanos, com peixe em boas condições de preço. Isso permitirá melhorar a ração alimentar no que toca a proteínas animais, que, de resto, entram por 100 g a 150 g numa dieta alimentar equilibrada.
Volto agora ao inquérito do Dr. Salviano Cruz para dar a composição de uma sopa, da qual foram servidos quinze pratos: feijão suco, 0,51; massa, 200 g; batatas, l kg; couves, duas; cenouras, duas; chispe, chouriço e toucinho em quantidades não determinadas e de que apenas se indica o preço de custo. Esta sopa levou quatro horas a cozinhar. Pela variedade dos alimentos cozinhados suponho não poder dizer-se não ser um prato dietèticamente equilibrado.
Acrescento ainda não resultar do inquérito que a população integrada nos grupos sociais inquiridos sofra de subalimentação.
A assistência a espectáculos e diversões, não constituindo indicador suficientemente seguro, insinua, todavia, que parte considerável da população urbana e equiparada consegue satisfazer essa necessidade. Com efeito, em 1955 a frequência total aos espectáculos públicos (cinema, teatro, circo, touradas, variedades, bailados, espectáculos publicitários e pugilismo) foi de 28 335 milharei de espectadores. Acrescente-se a estes espectáculos, e diversões o futebol e teremos aquele número notavelmente acrescido. Ora, normalmente não se sacrifica a necessidade de alimentação, a primeira entre as demais, para satisfazer a última escala.
Vejamos agora, embora sumariamente, as razões do nosso atraso industrial e o que se fez já para o vencer.
Quando o carvão veio substituir-se â lenha e à força hidráulica e eólica como combustível e fonte de energia industrial, operou-se também a substituição da matéria-prima tradicional -a madeira- pelo ferro e depois pelo aço. Sem carvão e sem jazigos minerais de primeira qualidade, não tínhamos condições naturais - e não só nós - para acompanhar o surto industrial da Inglaterra, França e Alemanha, depois seguidas e ultrapassadas pelos listados Unidos. Data desta revolução técnica a estagnação económica do País.
esde D. Pedro II até D. Maria I não deixou de pensar-se no melhor aproveitamento dos recursos naturais que nos couberam. Com D. José e D. Maria tenta dar-se vigoroso impulso u indústria e ao comércio, contratam-se técnicos estrangeiros para projectarem minas, aqui e no Brasil, e dirigirem a montagem das indústrias que se reconhecesse útil instalar.
A revolução política sobrevinda interrompeu esse profícuo trabalho, aliás documentado em várias obras ainda hoje de reconhecido proveito e nas memórias económicas e científicas dessa época, parte delas publicadas pela benemérita Academia Real de Ciências.
A desordem política que se seguiu só tarde veio a permitir que os estudiosos e governantes retomassem, em novas bases, o trabalho interrompido.
plano da Regeneração, pouco amadurecido e trespassado do optimismo confiante do século, tentou de golpe, pela chamada política da circulação, a revalorização das magras riquezas do País. O plano, sem dúvida ousado, fraudou as esperanças que nele se depositaram, porque era apenas um aspecto parcial do grande problema nacional. As vias de comunicação são coisa excelente para movimentar a riqueza e valorizá-la pela circulação e distribuição e, pelo tempo adiante, acabam por exercer uma acção de fomento. Simplesmente, construíram-se as estradas e inaugurou-se o caminho de ferro, mas não se estabeleceu, paralelamente, qualquer plano de fomento agrícola ou industrial para produzir as mercadorias que por umas e por outro deviam circular. O País endividou-se, o acréscimo de riqueza que se esperava tardou em aparecer e a bancarrota surgiu.
Sem recursos naturais de fácil aproveitamento, sem capitais e depois sem crédito, não era possível quebrar de vez o marasmo económico de que padecíamos. Quem ler os escritores da época -Oliveira Martins, Basílio Teles e Anselmo de Andrade, para citar só alguns -lá encontrará indicados os males de que sofríamos e esboçados programas de acção para debelá-los, mas faltava capital para tanto.
Para consegui-lo alvitraram-se muitos meios, entre razoáveis e humilhantes, mas sempre com recurso ao estrangeiro. Não admira, por isso, que nas confabulações das chancelarias se partilhasse já o nosso domínio ultramarino.
Foi necessário reconquistar a ordem financeira e política, impor um período de austeridade e começar pacientemente a acumular reservas que permitissem iniciar a realização dos grandes aproveitamentos hidroeléctricos. A fonte de energia industrial que sempre nos faltara ia surgir agora e permitir, até onde fosse possível, o necessário movimento de industrialização.
Para se criarem as poucas indústrias que no Pais iam vivendo, foi necessário defendê-las da concorrência de indústrias alheias, mais evoluídas e melhor servidas de equipamento e técnica. Assim se foi vivendo. Quando as condições eram já outras e poderia esperar-se que os capitais repatriados e acumulados acorressem espontaneamente ao investimento, viu-se que a fraca dimensão do mercado interno os assustava. O Estado teve então de dar confiança a esses capitais pouco afoitos, decidindo-se a comparticipar em empreendimentos industriais de maior vulto.
Iniciado este movimento promissor, cujas realizações sumariamente se apontarão, veio colher-nos em plena acção a criação do euromercado. Até que ponto o Governo se verá obrigado a rever os seus planos de fomento e a acomodá-los à nova situação não sei dizê-lo, mas é certo que terá de ser prudente e submeter a novo e demorado estudo realizações porventura já projectadas.
No que toca a electricidade, o avanço exprime-se por estes dois números: em 1027 o consumo por habitante era de 26 kWh, mas em l955 passou a ser de 197,8 kWh.
Comparativamente a outros países que nos precederam, por mais bem dotados de recursos de toda a ordem, o avanço conseguido pode parecer bem mesquinha coisa, mas em valor absoluto tem ide aceitar-se pelo que realmente vale. A produção total prevista, no final do Plano de Fomento em execução, atingirá 2166 milhões de kilowatts-hora, quando em 1927 era apenas de 187 milhões.