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608 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 200

curso, assim tão largo, parece-me um convite para su embarcar na aventura, que pode transformar em naufrágio de angustiosas dificuldades o encanto da viagem, iniciada sob os melhores auspícios.
Com as cautelas e limitações necessárias, julgo que, na verdade, se poderá utilizar, com a condição de não estancar as fontes da iniciativa particular, dada a pequenez do nosso mercado de capitais.
Afirma-se a necessidade de uma reforma bancaria pela qual se modifique a orientação actual da banca portuguesa, mais dada a operações comerciais do que ao abastecimento da indústria, em operações a largo prazo. Concordo com a criação de um Banco de Fomento, destinado a este fim dado que a banca particular não pode, por sua natureza e estrutura, aventurar-se no campo do financiamento a prazo largo.
Reclama-se a urgência de uma reforma fiscal destinada a proteger a indústria e os seus lucros, mesmo quando anormais e excessivos, desde que estes possuiu investir-se em novas indústrias, ou no reequipamento das já existentes, que ofereçam as condições óptimas da produção, determinantes dos mais baixos custos.

O Sr. Daniel Barbosa: - V. Ex.ª dá-me licença?
Vejo-me obrigado a uma rectificação. Eu não disse que era partidário duma reforma fiscal capaz de permitir lucros excessivos, mas sim duma reforma fiscal que saiba respeitar os lucros considerados justos e obrigar os excessivos, que eventualmente aparecem, a desviarem-se para investimentos e melhoria de condições sociais.

O Orador:- Como a certa altura da intervenção de V. Ex.ª há uma referência a lucros anormais e excessivos, eu interpretei-a no sentido que exprimi, mas, consultando o Diário das Sessões, que passo a ler naquela passagem, verifico que V. Ex.ª tem inteiramente razão na rectificação que acaba de fazer, e que muito agradeço.
Com lucros normais ou anormais, excessivos ou não, teríamos uma produção em cadeia em que esses lucros seriam sucessivamente investidos em novos empreendimentos, num arremedo de organização à americana, de grande e pura concentração capitalista.
Esquece-se que estamos num regime política, económica e socialmente corporativo, que a sua moral condena esses lucros anormais e excessivos e manda procurar o justo preço, o justo lucro e o salário justo.
Será isto de lamentar, do ponto de vista, económico, mas é doutrina aceite, e temos de respeitá-la.
A organização capitalista da empresa naqueles moldes conduz à, concentração da. riqueza nacional em poucas mãos, à formação das grandes organizações industriais, contra as quais é impossível lutar, e traz o desânimo à iniciativa privada, que se teme do seu gigantismo, impossibilita-a de entrar em concorrência com ela, por medo e debilidade financeira relativa, e por vezes pesa decisivamente na liberdade do acção do Poder Executivo, impondo-lhe a sua orientação.
Veja-se o que acontece na América.
Mesmo entre nós já temos organizações poderosas, algumas à escala mundial, cujos braços tentaculares, abraçando a metrópole, se estendem já para as nossas províncias de além-mar.
Mesmo entre nós já se assiste a uma perigosa concentrarão de capitais em meia dúzia de mãos e a uma lenta mas progressiva proletarização da classe média, o que, ao contrário do que o Sr. Deputado avisante, supõe, determinaria uma cada vez maior redução do poder de compra dessa classe, que é a mais numerosa do País.
Não.

Nós não queremos meia dúzia ou mesmo um cento de muito ricos; o que pretendemos é uma razoável mediania, que a todos - operários, funcionários e servidores do Estado, empregados e classe média permita, no mais curto prazo, um viver mais confortável e feliz.
Desta forma já emiti a minha opinião acerca da concentração industrial em larga escala que ali se defende e eu condeno. Ainda a poderia admitir, por uma reforma adequada, legal e funcional das nossas sociedades anónimas, se conseguíssemos nelas interessar, não os grandes lucros, mas as pequenas economias, que felizmente abundam, e limitássemos, não já os poderes, mas os lucros dos seus conselhos de administração, que são quase sempre de majestosa imponência e promovem a desconfiança e o descrédito da sua eficiência na grande maioria da população nacional.
E, para finalizar, uma palavra apenas sobre o problema da agricultura em Portugal - a filha enjeitada da nossa economia - e tal como é encarado no programa apresentado pelo Sr. Deputado avisante.
Esta terá do ser sempre, diz-se nele, a primeira sacrificada nos ramos da produção (p. 500), em consequência do nosso subconsumo.
«Para subsistir e trabalhar é preciso comer».
E é precisamente por causa desta necessidade fisiológica que o drama da lavoura se torna mais pungente. O consumo dos produtos agrícolas não é elástico, como acontece com os produtos industriais; não aumenta, como estes, numa proporção geométrica, mas simplesmente aritmética.
A lei de King domina inexoràvelmente toda a economia agrícola, e parece eterna porque assenta sobre uma das características da natureza humana: a capacidade limitada do nosso estômago, escreve Pierre Fromont.
E é assim mesmo.
Fala-se muito em aperfeiçoamentos técnicos da produção para aumentar a produtividade da terra e melhorar a qualidade dos produtos agrícolas, que trariam uma apreciável redução dos custos.
Está bem e está muito certo.
Mas esta possível redução de custos acarretará um incremento sensível do consumo que corresponda ao menos ao aumento da produção resultante desse aperfeiçoamento? Não o creio. Fala-se muito na mecanização da agricultura, para, dispensando o esforço humano, baixar ainda mais esses custos. Ainda que possível em certas regiões e apesar de a maquinaria entre nós ser extremamente cara, admitamo-lo. Produzimos mais, melhor e mais barato. E depois quem consome? Num país como o nosso, em que já temos largos excedentes de vinho, de arroz, de batata e em que o trigo, o milho, o feijão, o azeite e os demais produtos agrícolas, se normalmente não sobram muito, também normalmente não escasseiam: quando as perspectivas de aumentos substanciais da produção se antevêem, em face das obra de irrigação, que transformarão terras de sequeiro em regadio, de mais fartas produções, como absorver os excedentes que já existem e os que se prevêem? Este um dos aspectos do problema. Falta-nos um programa de fomento agrícola.
E não será suficiente o aumento do poder de compra resultante do mais altos níveis de vida, a absorção pela indústria do uma parte da população activa emprega-la na lavoura que resolverá esse problema. Da lavoura vivem cerca de 4 milhões de braços e da indústria 1 milhão. Ainda que esta viesse a absorver outro tanto, o que é uma perspectiva optimista, ficariam 3 milhões a cargo daquela, que continuariam a lutar, sem esperança de melhores dias.
O problema não é só de subconsumos. Ninguém come mais do que aquilo que é necessário. Não é de quantidades maiores de alimentos que a nossa gente carece.