234 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 76
ceatração até às portas dos consumidores em recipientes igualmente violáveis da mais diversa natureza e feitio; trocado, baldeado e caldeado de uns canados para outros em plena rua, a todo o tempo; sujeito até, mercê das possibilidades de tais manobras, a todas as adulterações - é óbvio que em tão precárias condições nenhuma prova de confiança poderia merecer aos que houvessem que o consumir.
Sr. Presidente: passaram sob os meus olhos ainda há pouco algumas expressivas fotografias, obtidas ao acaso nas ruas da cidade, que nos mostram, por exemplo, este espectáculo deplorável:
Sobre o pavimento da rua, uma manhã, diversos canados, panelas e outros recipientes. A volta deste estendal juntam-se diversas «leiteiras», baldeando leite de umas vasilhas para outras, e uma dessas mulheres para fazer tal operação empunha nem mais nem menos que um regador ...
Este espectáculo degradante deixou de se observar desde que entrou em vigor o novo serviço de abastecimento de leite à cidade e seus arredores, mercê da adopção do sistema de que me estou ocupando, possibilitado pelo decreto-Lei n.º 39 178, de 20 de Abril de 1953, mandado aplicar à área do Porto e Concelhos vizinhos por despache ministerial de 19 de Dezembro de 1956.
Mas se V. Ex.ª permite que me alongue um pouco mais atrever-me-ei a dar à Assembleia uma resenha mais detalhada do novo sistema, já em franca execução.
Não vou, no entretanto, fazer a história das vicissitudes ou dos percalços por que têm passado, entre nós, a produção e o comércio do leite.
Isso levar-me-ia muito longe e até me faria afastar do objectivo que me propus.
Farei, pois, tão-sòmente breves considerações para melhor compreensão da forma como foi possível instalar e pôr em execução esse novo sistema,- que, embora apenas iniciado, já constitui hoje uma realidade digna de nota e de elogio.
Sr. Presidente: os êxitos e progressos a que venho aludindo devem-se, inicialmente, a uma acertada e corajosa medida do Governo, constituída pelo Decreto-Lei n.º 39 178, de 20 de Abril de 1953, a que acabo de me referir, que modificou profundamente as condições em que até então se fazia a recolha e o comércio do leite e, do mesmo passo, estabeleceu salutares normas de disciplina e de higiene quanto & recolha, industrialização ou tratamento e venda daquele precioso produto.
Para o efeito, e com vista à consecução dê tão importantes objectivos, cometeu-se, em boa hora, pelo mesmo decreto aos grémios da lavoura, em representação dos seus associados, a manutenção e exploração dos postos de recolha e de concentração do leite e bem assim a faculdade de os mesmos grémios montarem e explorarem postos de distribuição e, numa palavra, procederem à venda colectiva do leite e das natas para a indústria e à veada do leite em natureza para o consumo público, depois de devidamente tratado e higienizado em estações tecnicamente apetrechadas para o desempenho de tais operações.
Perante a forma atrabiliária, desconexa e verdadeiramente caótica como funcionava até então todo o serviço de recolha, transporte e comércio do leite, o novo sistema instituído pelo Decreto-Lei n.º 39 178 constitui uma verdadeira, revolução contra os nossos reiterados vícios da inércia e da rotina.
Porém, posto que com este sentido acentuadamente progressivo, procurou, todavia, o Governo agir com prudência e com cautela; e por isso mesmo logo se estabeleceu que o decreto só entraria em vigor nas diversas regiões do País à medida que tal fosse determinado por despacho do Ministro da Economia.
Estava, no entanto, lançada a base legal donde haveria que se partir para a conquista dos objectivos propostos nesse diploma fundamental. Por isso mesmo, pouco tempo depois da publicação desse decreto-lei, logo os grémios da lavoura da região do Douro Litoral, reunidos em assembleia geral, deliberaram solicitar do Governo a imediata entrada em vigor nessa mesma região do dispositivo daquele decreto; e essa deliberação era logo após sancionada e corroborada pela assembleia geral da Federação dos Grémios da Lavoura de Entre Douro e Minho, instituição que viria a desempenhar um papel da mais marcada relevância para a organização e montagem do sistema.
Foi o começo.
Desde então por diante nunca mais a Federação dos Grémios da Lavoura de Entre Douro e Minho deixou de prosseguir nos seus esforços para que viesse a ser instituído na região o novo sistema de recolha, tratamento e comércio de leite criado por aquele decreto-lei.
Com o desenvolvimento desses esforços ou, antes e melhor, por via deles, coincidiu a nomeação, por portaria do Subsecretário de Estado da Agricultura de 24 de Maio de 1955, de uma comissão, composta pelas mais representativas personalidades, encarregada de elaborar o estudo que se reputou indispensável a execução daquele Decreto-Lei n.º 39 178 na zona abastecedora de leite à cidade do Porto e centros limítrofes.
Essa comissão, composta pelos Ex.mos Srs. Dr. José Frazão Nazaré, como representante da Câmara Municipal do Porto; Dr. Joaquim Correia da Costa, como delegado da Direcção-Geral dos Serviços Pecuários; engenheiro agrónomo Manuel Simões Pontes, como delegado da Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas; Dr. Vasco Maria Pereira Pinto Costa Ramos, como delegado da Junta Nacional, dos Produtos Pecuários, e António da Cunha Melo, como representante dos grémios da lavoura interessados, tomou posse do seu mandato em 15 de Julho de 1955 e deu por concluído o seu relatório em 5 de Junho de 1956.
Em suas conclusões foi essa comissão de, parecer que era possível dar-se execução rápida ao Decreto-Lei n.º 39 178, «com incalculáveis vantagens para produtores e para consumidores», sendo uma das principais n melhoria da qualidade do leite e o seu fornecimento em condições de inteira segurança e salubridade, pela adopção do sistema que se preconizou dass bilhas invioláveis
Não haveria agravamento do preço do consumo, do preço de venda ao público, e haveria, por outro lado, uma possibilidade de substancial aumento de valorização do leite, pela supressão de um sem número de intermediários, que arrecadavam o lucro de cerca de 1$ em cada litro de leite vendido ao público.
Para melhor execução do programa proposto preconizou a comissão o estabelecimento de uma zona abastecedora da cidade, formada pelos concelhos do Porto, Matosinhos e Maia e por algumas freguesias dos concelhos de Vila do Conde, Valongo, Gondomar, Gaia e Feira, e o estabelecimento de uma subzona de abastecimento - de reforço e socorro daquela zona, sempre que necessário, e também da prevista extensão e alargamento do sistema a outros centros urbanos e nomeadamente às praias da região-, constituída esta subzona pelas restantes freguesias dos concelhos citados e mais os concelhos da Póvoa de Varzim, Santo Tirso e Paços de Ferreira.
Mereceu este estudo a melhor colaboração dos serviços interessados e. particular atenção por parto do Governo.
Assim é que, por despacho ministerial de 19 de Dezembro de 1956, foi mandado pôr em execução naquelas