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25 DE ABRIL DE 1959 607

A questão que está posta é pois, quanto a mira, a seguinte: sabido que o tempo gasta os homens nas funções, e simultaneamente os enraíza da confiança dos governantes, deve deixar-se a quem governa a faculdade discricionária da recondução, ou deve-se estabelecer para esta um limite máximo, estabelecido com base na duração normal da eficiência na função?
Eu vou, decididamente, pela segunda resposta; e não oculto que desejaria ver o princípio aplicado a alguns outros sectores de actividades, onde sintomas inequívocos de estagnação começam a acusar os efeitos do prolongamento indevido de certas pessoas era certos cargos.
Sr. Presidente: expus as reflexões que me levam a entender que a disposição que está a ser discutida não é pleonástica, mas inovadora, e que a inovação que representa não é nefasta, mas vantajosa.
Resta-me pois aludir, sob este aspecto, ao segundo argumento que em seu desabono se tem invocado: o de que, não respeitando situações de excepção, a mesma disposição traz consigo injustiças e pode ocasionar sérios prejuízos à administração local.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- Este inconveniente não pode ser negado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não se distinguiu o trigo do joio. Entre os homens que se mantêm nos lugares durante muitos anos há que distinguir duas espécies-casos: o mais numeroso, que é o dos que estão, em virtude da inércia ou da intriga ou de poderosa sombra protectora, e o daqueles cuja permanência é a medida e a expressão de um mérito acima do comum, que não foram substituídos porque na realidade são insubstituíveis, que estão, e não poderão deixar de estar, sem grave ofensa do interesse público.
Aplicar a todos o mesma tratamento penso que não é justo nem político ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- ... porque trás o risco de suprimir os incentivos da dedicação e de abrir feridas em quem só mereceu louvores.
Poderia talvez, dizer-se que ó da natureza da norma jurídica, que visa a consecução do bem geral, ocasionar sempre algumas injustiças particulares. Isto é verdade, é o preço da generalidade, característica essencial da regra de direito. Mas também é verdade que as normas são tanto mais perfeitas quanto menor é a extensão dos sacrifícios que implicam.
Julgo que não seria difícil corrigir o inconveniente apontado, consignando-se na lei a possibilidade de, em casos excepcionais, o Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro do Interior, autorizar a recondução para além do período de doze anos.
A intervenção do Conselho de Ministros pode parecer menos conforme com o nosso sistema das leis administrativas, mas essa mesma anomalia serviria para traduzir o carácter verdadeiramente excepcional da autorização.

O Sr. Carlos Moreira: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador:- Faz favor.

O Sr. Carlos Moreira: - Estou a seguir com toda a atenção o discurso de V. Exa. No entanto, desejava saber se V. Exa. põe forçosamente apenas a hipótese de
nomeação dos presidentes das camarás; se não pode admitir outras hipóteses de provimento do cargo.

O Orador:- Eu é que faço a pergunta a V. Exa., que fala de forçada nomeação. E que eu não conheço esse regime de forçada nomeação.

O Sr. Carlos Moreira: - V. Exa. esta a pôr forçosamente a hipótese da nomeação como única forma de preencher os lugares de presidentes das câmaras?

O Sr. Proença Duarte: - Segundo o direito constituído, é.

O Sr. Carlos Moreira: - Mas eu estou a perguntar, Sr. Deputado Proença Duarte, segundo o direito que seria necessário constituir.

O Orador:- Segundo o direito que será necessário constituir, creio que a questão se pode resumir assim: como V. Exa. sabe, numa concepção do Estado que transcende a concepção mecanicista do século passado e não admite que a Nação seja apenas a soma aritmética dos seus municípios, mas sim uma comunidade espiritual, cujos interesses estão presentes e têm de ser representados em todas as parcelas do território, não se poderia nunca admitir que o primeiro magistrado da autarquia fosse designado por forma incompatível com a representação do interesse geral no seio da comunidade. Isso conduziria à dualidade dos magistrados, que foi experimentada e tão más provas deu. O sistema vigente representa a supuração do dualismo que nega a unidade fundamental e indivisível da Nação. O presidente do município, nomeado pelo Governo, que é quem representa aquela unidade, representa o concelho, cujo interesse não se pode admitir seja oposto ao do conjunto superior de que faz parte. Essa é a primeira razão que me leva a não poder admitir o processo de designação electiva; que V. Exa. parece preconizar.
Por outro lado, o regresso ao sistema electivo conduziria à perda da unidade espiritual da autarquia e levaria a cair na perigosíssima dialéctica da luta entre as facções concelhias.
V. Exa. não ignora que é uso na nossa administração, sempre que o concelho se desmantela, em facções que disputam a presidência da camará, o Poder Central ter o bom senso de não escolher nenhum dos dois representantes das facções, mas um terceiro, porque só quem não representa a parcialidade pode aspirar a ser representante de todos.

O Sr. Carlos Moreira: - Eu já estou esclarecido e não queria que V. Exa. estivesse a perder o seu precioso tempo.

O Orador:- Ainda bem que gastei menos tempo que aquele que julgava necessário.

O Sr. Carlos Moreira: - Parece-me que V. Exa. se interessa muito em que o presidente da câmara seja o intérprete fiel do Poder Central e esquece que deve ser também, e não menos, o intérprete e defensor dos interesses locais. V. Exa. está a ir longe demais!

O Orador:- V. Exa. é que esquece o essencial: pôr a questão nesse pé é admitir uma distinção entre o interesse geral e o interesse local e alhear-se de que a lição da história do municipalismo português é precisamente o contrário.

O Sr. Carlos Moreira: - A lição da história do municipalismo português é a de uma larga descentralização e de respeito dos foros populares.