O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

25 DE ABRIL DE 1959 605

ção oportuna, incentivo para a continuação proveitosa da actividade revelada.
Nas considerações produzidas encontro, Sr. Presidente, as razões fortes que me levam a não dar o meu voto à ratificação do decreto-lei em discussão.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. José Saraiva: - Sr. Presidente: hesitei se tomaria ou não parte no debate suscitado em torno da ratificação do Decreto-Lei n.º 42 178. A matéria que principalmente, suscita objecção e crítica - imposição de um limite à possibilidade de recondução dos presidentes das câmaras - é melindrosa, e as razões que se podem aduzir pró e contra suo, umas e outras, de tal valor que quando se medita nelas nos sentimos conduzidos a um estudo de espírito de perplexidade.

O Sr. Manuel Homem de Melo: - V. Exa. sente-se perplexo? Isso, porém, não quer dizer que todos nós nos sintamos perplexos.

O Orador:- A perplexidade é o estado de espírito que serve de alicerce para implantação das grandes certezas. A única forma de atingir uma convicção correcta é começar por não estar convencido.

O Sr. Manuel Homem de Melo: - Não estou a discutir o conceito de perplexidade.
Não estou perplexo, s nesse mesmo estado se encontram vários Srs. Deputados.

O Orador: - Pois confesso que o estive e me levou a procurar definir - para uso próprio e sem o intuito de convencer ninguém - os motivos que hão-de determinar a minha atitude e o meu voto.
Os precedentes do diploma em exame são geralmente conhecidos.
Há muito tempo que se criticava com insistência a excessiva permanência dos presidentes das câmaras no exercício dos seus cargos e se denunciava o vício de transformar a recondução, que deveria ser excepcional, em regra quase constantemente seguida.
No valioso repositório de estudos sobre administração local publicado pelo Centro de Estudos Político-Sociais, a que com tanta inteligência, lucidez e dedicação presidiu o nosso ilustre colega Sr. Engenheiro Camilo de Mendonça, liam-se estas palavras, da autoria do Sr. Dr. João Paulo Cancela de Abreu:

Censura mais atendível se faz ao tempo que costumam durar essas nomeações. A lei já prevê um largo período de oito anos, renovável, renovação que se tem observado vezes de mais.
Ninguém nega as vantagens da continuidade governativa, mas com a condição essencial de se tratar fie governantes com qualidades excepcionais. Normalmente, ao fim de poucos anos, o presidente da câmara encontra-se gasto e cansado. Perdeu todo o entusiasmo primitivo. O exercício de tais funções, por mais isento e zeloso que seja - e sobretudo se for -, já lhe criou a má vontade de uns, a desconfiança de outros, a indiferença de quase todos.
É um lugar que queima. Basta lembrarmo-nos de que as câmaras, mercê dos planos de urbanização e projectos que propõem e aprovam, das áreas de construção e cérceas que fixam, são os discricionários juizes de questões em que se chocam avultadíssimos interesses particulares.
Tudo o que não se renova, morre.
Já no IV Congresso da União Nacional observações de idêntico teor tinham sido formuladas. E creio que, como regra geral, ninguém contesta que a permanência excessivamente longa nas direcções de serviços tem como consequência um abaixamento no nível de rendimento dos serviços dirigidos. E uma regra verdadeira para a generalidade das funções; mas só, em especial, quando referida àqueles cargos em que a capacidade pessoal de concepção, decisão e iniciativa desempenham papel decisivo. E estão nestas condições - creio que isto também todos o aceitarão - os cargos dos presidentes das câmaras. É portanto forçosa a conclusão de que a posição é das que não podem ser vitalícias, impondo-se a substituição sempre que o desgaste do tempo tenha produzido os seus normais efeitos.

O Sr. Pinho Brandão: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Com todo o gosto.

O Sr. Pinho Brandão: - Mas isso está no próprio Código Administrativo. O cargo de presidente da câmara não é vitalício.

O Orador: - V. Ex.ª honra-me muito revelando-me que os nossos espíritos se encontram: o cargo não só não é vitalício, como era indesejável que viesse a sê-lo. Neste ponto não pode, pois, haver desacordo.
A dúvida suscitada é, porém, outra: a de que, para uma permanente actualização dos quadros da administração local, não- seria necessária, nem conveniente, a drástica medida agora promulgada. Não seria necessária porque o regime constante dos artigos 71.º a 73.º do Código Administrativo já permitia essa constante actualização.
A disposição inovadora seria, portanto, segundo a vigorosa expressão utilizada pelo ilustre Deputado Homem Ferreira, um pleonasmo legislativo. E uno seria conveniente porque, no posso que as disposições do Código Administrativo permitiam uma actuação discriminatória, tornando possível se distinguisse, entre os presidentes que realmente o tempo gastou e aqueles que, pelo seu excepcional mérito, conservaram intacto o seu prestígio e poder de acção, a nova regra, geométrica e rasourante, mede a todos pela mesma forma e a todos afronta com igual tratamento.
São dois argumentos os que assim se formulam: o do pleonasmo e o da injustiça. Eu direi já que adiro a segunda crítica, mas não vejo o fundamento da primeira
Entre a norma que vigorava e a que de novo se promulgou há uma diferença substancial. Os artigos 71.º, 72.º e 73.º do Código Administrativo - em particular a última destas disposições e o § 2.º da primeira - davam ao Governo um poder ilimitado quanto à nomeação, recondução e demissão dos presidentes das câmaras.
Este poder ilimitado passa agora, em virtude da norma inovada, a sofrer uma restrição: a de que a recondução não é consentida depois de a permanência no cargo atingir doze anos. Portanto, ao poder de reconduzir ou não sucedeu-se o dever de não reconduzir.
Porque em direito poder e dever não são conceitos equivalentes, e porque a liberdade de acção estadual passou efectivamente a sofrer um limite, dantes inexistente, não compreendo como se pode ver na disposição nova um simples pleonasmo.
A questão a colocar é, portanto, outra: a de saber se esse limite agora consignado à discricionariedade do Governo é útil ou é nocivo.
Penso que desde há muito tempo ele era indispensável, e por motivos que se me afiguram ponderosos.