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20 DE ABRIL DE 1959 603

reira: o da dificuldade de encontrar munícipes em condições de servir e que a tal se prestem.
Decerto que os tempos maduram deveras; o absentismo rural e provinciano de pessoas com idoneidade para esses cargos, as antigas chamadas «autoridades sociais», rareiam crescentemente: fruto inauferível do atomismo individualista, consequência mecânica e irreversível da legislação dita liberal ...
Esta circunstância vê-se, porém, agravada localmente pela rede de incompatibilidades que se têm montado em relação ao exercício do cargo de presidente de câmara.
Isto, produto de uma concepção oposta - esta não individualista, mas de raiz corporativa -, do exclusivismo funcional de cada um em relação à sua profissão; e isto num país que, aspirando a ser corporativo, repugna, desconfiado, viver em grande a corporação, cora a agravante de essa tendência ao exclusivismo profissional só ser regulamentada especiosamente em relação à periferia e deixando-se no centro amplos acessos às acumulações e às compatibilidades.
Concretamente, e apenas a titulo exemplificativo, ocorre-nos citar algumas incompatibilidades a pedir que sejam removidas:
Sabido, como é, com quanta idoneidade advogados e médicos podem localmente presidir a administrações municipais, vemos os empecilhos com que para isso concorrem as incompatibilidades que se lhes antepõem.
Quanto aos advogados, são os vigentes preceitos do n.º 6.º do Estatuto Judiciário, com a redacção do Decreto n.º 37166, que estabelecem essas compatibilidades quando o cargo é remunerado (ou seja, além de Lisboa e Porto, nos concelhos de 1.ª ordem e urbanos de 2.ª ordem, segundo os Decretos n.º 31 386 e n.º 35 927).
Há ainda a acautelar as incompatibilidades que, pelo § 3.º, n.º 2.º, e § 8.º do artigo 562.º do citado estatuto, a Ordem dos Advogados pode estabelecer.
Quanto aos médicos municipais, é preciso acautelá-los, para nomeações destas, das consequências da aceitação desse cargo que lhes cria a doutrina da Direcção-Geral da Administração Política e Civil, conduzindo-os à situação de inactividade fora do quadro -, abrindo correspondente vaga em prejuízo da sua ulterior vida burocrática.
Deve ainda introduzir-se unia disposição legal no sentido de os funcionários públicos e administrativos poderem exercer em comissão de serviço o cargo de presidente de câmara, inclusive dos próprios cargos administrativos a cujos quadros pertençam.
Aí ficam, entre as muitas que estes problemas podem levantar, sugestões que nos afoitamos a formular no sentido de simplificar os problemas de preenchimento de cargos administrativos e políticos, problemas que a conjuntura tem tornado de actualidade premente:
Sr. Presidente: pelos pressupostos mencionados, é fácil ver que a disposição em debate tende a dar satisfação a forte corrente de opinião, no sentido da renovação de dirigentes da administração local, torneando riscos de ancilosamento.
Em princípio achamos bem.
Com o sistema dual ou paralelo que defendemos isso não ocorreria, porque na eleição, quanto à confiança dos eleitores, e pela nomeação e demissão, quanto à confiança do Governo, o problema carecia de objecto.
Nasce o problema da dúplice qualidade dos actuais presidentes das câmaras. Pela presidência dos juizes de fora no regime pré-constitucional, o problema achava-se afastado, dada a amovibilidade daqueles magistrados.
Não contrariarei, por isso, em princípio, a disposição proposta. Em todo o caso, entendo que, para bem da administração pública local, não deve ela comportar a rigidez de que vem revestida.
Deverão aceitar-se casos excepcionais. Como regulá-los?
Por admissão de novo prazo além dos doze unos? Por despacho fundamentado do Ministério do Interior? Por intervenção do Conselho de Ministros, em analogia com o caso afim previsto no § 3.º do artigo 75.º do Código Administrativo?
A Assembleia ponderará o assunto.
Em conclusão, Sr. Presidente, entendo que o decreto-lei em discussão merece ser aprovado, embora com emendas no sentido que acabamos de expor.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Neves Clara: - Sr. Presidente: foi por impulso natural da consciência e por amor arreigado à verdade que apus a minha assinatura no requerimento em que se solicitava a ratificação do Decreto-Lei n.º 42 178 pela Assembleia Nacional.
Ainda pelas mesmas razões me encontro nesta tribuna, colaborando numa critica honesta a um acto do Governo que certa agitação trouxe aos meios políticos da vida nacional.
Julgaram uns que se tratava de um acto de força, enquanto outros nele viram, testemunho de fraqueza, ou impotência governativa. Se nos não serve a primeira hipótese, dado que o ponto de aplicação cai em bom e mau campo, muito menos aceitamos a segunda, por isso significar o reconhecimento de um enfraquecimento do Poder Executivo, com a conclusão lógica de um Estado politicamente debilitado.
Para nós, cremos signifique que o Governo tomou a parte pelo todo e ao diagnosticar a doença de certos municípios generalizou a aplicação de um remédio doloroso, eficaz nos verdadeiramente doentes, prejudicial todavia nos que gozavam de perfeita saúde. Mais incompreensível se apresenta a terapêutica se pensarmos residir no Governo ou nos responsáveis políticos a culpa do deficiente estado sanitário a que se entendeu pôr fim.
O clima de paz e a ausência de luta política durante largos anos criou nos espíritos responsáveis a ideia de que o Governo não necessitava da colaboração da influência dos dirigentes locais para alicerçar o seu próprio prestígio. Porque a obra de renovação nacional se levou a efeito mesmo com maus elementos das câmaras municipais, o comodismo determinou a ausência de preocupações pelo mérito ou demérito dos responsáveis pela administração local.
Notou-se o esquecimento de que na autoridade municipal está em curso, como afirmou o Dr. César Moreira Baptista no seu trabalho sobre administração local, «todo um processo de formação política dos indivíduos da respectiva região na medida em que toda a câmara municipal satisfizer aos anseios das populações. E a conclusão pode redundar em prestígio ou desprestígio do regime».
Não houve a preocupação de pedir aos que tinham corajosamente tomado lugares de comando no princípio da luta e que reais serviços tinham prestado ao País, mais num acto de coragem,, de resignarem a funções, para continuidade da causa que tinham ajudado a triunfar.
Não se quis ter a iniciativa de afastar aqueles que dos lugares de administração fizeram modo de vida, esquecidos de que as funções deveriam ter características dinâmicas, como a política em que estavam integrados.