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604 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 99

A uns e outros religiosamente se respeitaram os postos e se consagrou o ancilosamento da Administração, aceitando um imobilismo perigoso, originário de uma governação local hermética e impeditiva de uma renovação reveladora de novas capacidades.
Apesar deste estado de coisas, não julgo, no entanto, que houvesse necessidade de criar novas disposições legais para o evitar. O Governo já tinha em si poderes suficientes para restabelecer o prestígio municipal e, pela reiteração de confiança que uma recondução determina, processo de distinguir os verdadeiramente cumpridores.
Pela medida promulgada e que agora discutimos parece-nos que o Governo mais uma vez condescendeu com os incompetentes, foi injusto para com aqueles que o cansaço da governação atingiu e eram dignos de consagração, diminuindo os que em pleno vigor das suas faculdades, ao País ainda podiam dispensar todo o valor da sua personalidade e dos seus méritos.
Recordo, a propósito, aquele discurso que S. Exa. o Presidente do Conselho pronunciou na sala do Conselho de Estado, em 21 de Outubro de 1929, ao agradecer a manifestação feita pelas câmaras municipais do País.
Ao analisar a verdade na administração pública, punha a descoberto as mentiras dos quadros, da disciplina, da tribulação, das previsões, dos contas, do estado industrial, da força pública, da instrução e da justiça.
Para as corrigir, a pouco e pouco e sob a orientação superior de S. Exa., foram promulgadas medidas fortes de correcção e saneamento, integradas numa verdadeira política de sinceridade e de verdade. E, porque a mentira era enorme e causa das deficiências de que o País sofria, houve necessidade de usar remédios enérgicos e violentos para lhes pôr o necessário cobro.
Se aplicarmos igual raciocínio, se atentarmos na dureza de que o decreto em discussão é portador, teremos de chegar à penosa, conclusão de que havia mentira em toda a administração local, e contra isso reage o nosso sentimento de justiça.
Não defendo todos os presidentes de câmara agora afastados, porque ignoro a acção da sua maior parte.
Basta-me, no entanto, o conhecimento do esforço de alguns, o sou espírito de sacrifício e de renúncia, para sentir que o País Lhes deve agradecimento ou, pelo menos, a justiça de os não confundir com os que foram maus, incompetentes e prejudiciais à boa marcha da causa pública.
Estou a sentir a mágoa dos que cumpriram, a reconhecer a ausência absoluta de egoísmo dos que ao serviço do seu município sacrificaram muito da sua juventude, do seu entusiasmo, da sua profissão, da sua saúde e, até, da sua vida. Quantos se excederam a si próprios, empenhando na valorização das suas terras o seu nome, os seus bens e, por vezes, a sua honra.
Se atentarmos nas inibições, nos fracos recursos financeiros, na situação aflitiva de carência de meios, tantas vezes acentuados nesta Câmara, melhor podemos avaliar da grandeza da obra de obscuros artífices que ajudaram a renovação e à redenção da Pátria.
Sr. Presidente: com este decreto os municípios, já materialmente atingidos e financeiramente incapazes de satisfazer todos os anseios dos seus munícipes, sofreram um profundo abalo de natureza moral.
Em alguns casos - e pelas manifestações de que os jornais dão eco podemos considerar numerosos viram-se privados da sua maior riqueza: o serviço dos seus melhores na obra do seu progresso e engrandecimento.
Assistiram à imolação dos dirigentes que estimavam e honravam com a sua confiança na pira onde deveriam ser sacrificados só os que não cumpriram e há muito deveriam ter sido condenados ao afastamento.
A lei, na aplicação cega da sua força, exerceu acção niveladora de méritos e ofendeu o prestígio das autarquias locais, que necessitamos de acautelar.
Somos partidários de uma renovação de quadros políticos e administrativos, mas entendemos que as substituições se devem verificar em relação aos que amoleceram nos cargos, provocara m desvios de funções, praticaram prepotências ou buscaram a satisfação dos seus próprios interesses.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por isso nos parece que em vez de renovação antes deveríamos falar era acção de saneamento, que, para bem do País, se deveria desenvolver sem desânimo em todos os sectores onde existam maus funcionários e dirigentes, de acordo com a promessa que a Nação fez o Sr. Presidente do Conselho.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Estes são os efeitos imediatos e presentes no momento que estamos a viver. Quanto às futuras consequências, sentimos não descobrir a bondade na solução apresentada. O afastamento indiscriminado, nas condições estabelecidas, de todos quantos serviram determina a avaliação da capacidade realizadora de um indivíduo pelo tempo de serviço e não pela fortaleza e ânimo do seu espírito, servido por uma forte vontade de trabalhar.
Muito embora seja normal a perda de faculdades de realização de espírito de iniciativa e o aparecimento do cansaço em quem durante muitos anos exerceu a mesma função, a verdade é que existem excepções brilhantíssimas.
Constitui política perdulária perder essas excepções, quando, como muito bem afirmava o Prof. Marcelo Caetano, «o mais grave problema de hoje em dia é a crise do escol nos meios locais». Nestas circunstâncias, corre-se o risco de entregar a administração aos medíocres, já que os bons são difíceis de encontrar, e nessa solução comprometermos o interesse nacional.
Além disso, o Governo despoja-se do direito de escolha, dos melhores, porque a si próprio impôs a limitação de não prorrogar o mandato além de doze anos. Perante o País, perante as populações que confiam, o Governo enfraquece-se na medida em que não pode satisfazer o desejo dessas gentes, aos olhos das quais se tem de valorizar para a realização de uma política de confiança ou para criação de ambiente necessário a uma obra de valorização nacional.
Nessas circunstâncias, damos a nossa preferência a medidas legislativas que admitam reconduções sucessivas dos presidentes e vice-presidentes de câmara, limitadas unicamente, pela perda das condições necessárias para o bom desempenho do lugar.
O Governo, através, das fontes usuais de informação, tem sempre meio de avaliar as vantagens ou inconvenientes resultantes da permanência no lugar dos dirigentes da administração local, e a recondução não deixará de ser medida de selecção necessária à boa marcha dos negócios administrativos.
Se manifestamos discordância em relação ao ponto já tratado, poderíamos dar o nosso acordo ao prazo previsto para cada mandato. Concordamos que os quatro anus fixados constituem, tempo bastante para que um indivíduo revele as suas qualidades para a função.
Assim, em prazo mais curto pode praticar-se ou a substituição nos que, não merecendo sanção que os afaste, não tenham todavia, feito prova de qualidades que os recomendem, ou, pelo contrário, uma recondu-