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680 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 104

Não teve esse parecer o intuito de «desfibrar exaustivamente a matéria inesgotável do urbanismo», nem pretendeu «entrar pelos domínios do pormenor técnico»; antes «pareceu mais útil observar o fenómeno na sua funda essência, fixar os traços gerais de uma evolução histórica e conceptual e destacar apenas em grandes linhas alguns dos mais relevantes problemas, de molde a não obscurecer com minúcias uma visão global do tema urbanístico.
Este, que foi o critério regra deliberadamente escolhido, não impediu, contudo, o maior desenvolvimento num ou noutro ponto determinado, quer por assim se ter julgado contribuir mais expressivamente para uma boa apreensão de conjunto, quer também pela transcendência manifesta de alguns aspectos salientes do moderno urbanismo, como, por exemplo, a localização das indústrias e o seu corolário da centralização ou descentralização».
Tal critério foi, realmente, de grande utilidade para quem teve de tomar contacto com a matéria da proposta, e em nada influiu para n boa compreensão do ponto de vista do Governo ter a Câmara Corporativa conduzido os seus raciocínios em sentido diverso, do critério orientador da proposta de lei. Adiante farei ao facto apropriado comentário.

Sr. Presidente: há muitos anos que em diversos sectores se vinha a chamar a atenção do Governo para o agravo da concentração, de indústrias na cintura de Lisboa.
Nesta Casa muitas palavras se disseram também a propósito. Mas problemas destes requerem, sem dúvida, tempo para se estudarem, não vá dar-se o caso, como às vezes acontece, de aquilo que tem a aparência de questão grave vir afinal a mostrar-se em proporções aceitáveis.
Naturalmente por isso só agora o Governo achou chegada a ocasião de intervir decididamente naquilo a que chamou o crescimento desordenado das populações suburbanas, a evasão à disciplina dos planos de urbanização, a invasão destruidora no que é tradicional e belo, a cintura asfixiante e o desenvolvimento indisciplinado da capital.
Muitos dos prejuízos de tão nefasta acção já não poderão ser remediados, mas que ao menos a sua análise sirva ao futuro, para não se tornar a cair nos mesmos erros, o que equivale aqui a dizer na mesma imprevidência.
A Câmara Corporativa, ao apreciar os preceitos de carácter provisório encerrados na base v e referindo-se à sugestão feita anteriormente, a propósito da base I, de serem elaboradas, dentro do prazo de um ano, as mesmas normas provisórias destinadas a vigorar até à data da aprovação do Plano, afirmou:
... a indisciplina da construção é de tal modo alarmante e perniciosa que não se compadece com mais um ano de espera, impondo-se, portanto e desde já, um regime de autorização prévia que previna os danos mais visíveis, independentemente de qualquer estudo de conjunto (p. 536, n.º 32).
Todavia, reconhecendo quão difícil é remediar o mal já feito e apelando antes paru o saber da experiência que evite outros males, não posso deixar de dar o meu apoio a este considerando que a Câmara Corporativa, faz no referir-se no facto de os custos de transferência da generalidade das indústrias serem tão elevados que tornam impraticável a operação:
Esta última dificuldade faz com que, para inúmeros casos, a descentralização industrial seja concebida mais na sua variante de impedir a implantação de novas indústrias nas cidades já pletóricas do que, propriamente, mediante a transferência para outros locais das que ali se encontram instaladas. Não podendo ser atacada de frente, ladeia-se a questão; mas é evidente que não será curial generalizai- semelhante atitude de espírito, confinando os objectivos de descentralizar a solução tão restrita como precária, sem comprometer a própria ideia do descongestionamento urbano, que foi o seu ponto de partida.
Sr. Presidente: ao ler a proposta de lei n. 14, elaborada pelo Governo, vieram à superfície do meu espírito, no alvoroço de os ver enfim resolvidos, alguns dos problemas urbanísticos, que lá se encontravam arquivados, depois de colhidos no dia a dia de uma vida em contacto com a realidade.
A leitura, depois, do parecer da Câmara Corporativa, provando-me que afinal eu nada pensara de novo, esclareceu-me sobre os estudos feitos à volta desses problemas, além da satisfação íntima que me deu de ter podido aferir as minhas soluções.
Segundo a Câmara Corporativa, no seu parecer:

... não houve a preocupação de resolver problemas, antes e fundamentalmente a de levantá-los, trazendo à superfície a evidência da sua magnitude e a imperiosidade do seu ataque frontal. No máximo, e só raras vezes, se deixaram entrever princípios de solução, já que não existem dados suficientes para chegar a soluções definitivas é ser exactamente essa colheita de dados, em ordem a uma tomada de posição, desígnio imediato da proposta de lei ... (p. 532, n.º 25).
Não posso eu ter a veleidade de resolver problemas; desejo porém tão-somente apontar alguns deles, tomando todavia posição, o que não é o mesmo que dizer sobre eles a definitiva palavra.
Nas minhas frequentes viagens de camioneta entre Cacilhas e Setúbal tenho ouvido bastas vezes esta observação, a propósito do casario que se vai estendendo, qual bicha de rabiar, sem outra demora senão a da construção, ao longo da estrada nacional que liga os dois centros: «Daqui a meia dúzia de anos Setúbal está ligada a Lisboa». Eis, pois, o primeiro problema que de há muito se me tem posto: deverão ou não ser permitidas as construções ao longo das estradas?
Aparentemente o caso não tem qualquer inconveniente - antes, pelo contrário, o colorido dos prédios, quase todos moradias de arquitectura agradável, num estilo que procura adaptar o tradicional ao moderno, ameniza o caminho e dá-nos por vezes a sensação de que desfilamos entre alas gritantes de povo.
Acontece, porém, que se perde aquela segurança de trânsito que toda a estrada deve oferecer, tanto mais tratando-se de uma estrada de uso internacional, aquela mesma que foi desviada do centro de Montemor-o-Novo e vai deixar de passar por Estremoz, para facilidade e rapidez de trânsito.
Pois essa estrada Cacilhas-Setúbal exige já dos motoristas que a cruzam cuidados especiais, sobretudo nó Laranjeiro, em Correios e no Fogueteiro, para citar apenas os lugares de mais- recente crescimento.
Se não se travar já a construção à beira do caminho, daqui u1 meia dúzia de anos não poderemos transitar por ela senão aos 60 km permitidos pelo código a quem atravessar povoações.
Outro inconveniente desta construção em fila ao longo das estradas é o de não ser possível numa época do exigências de comodidade dotar esses prédios de água em condições, de esgotos capazes e de energia eléctrica, sem a qual a vida hoje não pode passar.