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684 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 104

(...) léguas até ao mar; mas a história destas sete léguas, se alguém com miudeza as escrevesse, não poderia ser senão dolorosíssima ...
Estas palavras do eminente hidráulico padre Estêvão Cabral, escritas em 1790, encontraram resposta naquela representação que os proprietários dos campos do Mondego dirigiram, em 1938, ao Sr. Presidente do Conselho, «súplica aflitiva que se ouve ecoar por toda essa planície, de dezenas de quilómetros de extensão: Salvem os nossos campos! e concretizada como se segue:

Ora, o rio Mondego, que deveria constituir o mais importante elemento de valorização dos terrenos que o marginam, vem-os destruindo, inutilizando com formidáveis montões de areia que todos os anos sobre eles lança. Na verdade, já se contam por muitos os hectares de terreno que, por tal motivo, não produzem coisa alguma, que estuo absolutamente estéreis.
Já anda por milhares de coutos o valor dos terrenos que para sempre se perderam para a cultura.
O património das povoações ribeirinhas já sofreu, pois, profundo golpe.
Enfim, a ruína, a miséria, com seus olhares sinistros, já estão no limiar da porta de tantos lares para entrarem e tomarem o lugar que vem sendo ocupado pelo desafogo e bem-estar que durante gerações ali Sempre reinou.

Eis o que secularmente tem constituído o drama do Mondego, a situação que justifica todo um conjunto de medidas tomadas desde tempos quase imemoriais e que ainda hoje está na base da urgência com que devemos encarar todo o arranjo da bacia hidrográfica deste rio.
Os depoimentos de Adolfo Loureiro (Memória sobre o Mondego e Barra da Figueira, Lisboa, 1874) e Mário Fortes {O Aproveitamento Geral da Bacia do Mondego pelo Sistema Confederativo Sindical Hidrográfico, 1929) são um testemunho elucidativo das dificuldades nas respectivas épocas, ao mesmo tempo que sumariam as medidas do passado.
A carta régia de D. Afonso V, de Tentúgal, datada de 22 de Julho de 1461, proibia as queimadas, com o intuito de não agravar os males da erosão e o aumento do volume dos correjos afluídos ao Mondego.
A determinação de D. João III de 1538 refere-se à construção de um emparedamento ao longo de Coimbra, e a de 1540 proibia a pesca das lampreias, para evitar que o rio fosse alombado.
O cardeal-regente D. Henrique determinou, em 1565, o estudo do encanamento do no, e em 1568 a construção de oito marachões.
O rio não desarma, contudo, e as preocupações dos homens subsistem.
Em 1791 chegou o Baixo Mondego são último estado de perdição e abandono», e «porque já em 1783 o álveo velho havia secado e o rio corria disperso pelos campos» e «as areias (em 1790) ocupavam uma área de 2 léguas e 6000 palmos de largura; as terras apenas se achavam 3 a 4 palmos superiores às águas claras do rio; havia diversos pauis de que apenas se cultivavam uma pequena parte em Julho e Agosto, sendo os principais os campos baixos de Bolão até à Geria, S. Fagundo, Cioga, Tentúgal, Arzila, Maiorca, etc, foram consideradas as soluções do padre Estêvão Cabral (cf. «Memória sobre os Danos do Mondego nos Campos de Coimbra», in Memórias Económicas da Academia Real das Ciências de Lisboa, tomo III, Lisboa, 1791).
Daqui nasceu o rio novo, traçado nas antigas vargens abertas pelas águas das cheias nos terrenos, então baixos, dos campos de S. Martinho, Taveiro, Arzila, etc., desde a quebrada grande até a barra de Montemor.

A situação actual -como se confirma na bem elaborada informação da direcção-geral dos Serviços Hidráulicos a um requerimento que, ao abrigo do artigo 96.º da Constituição, apresentei em 9 de Janeiro de 1958, porque a obra do padre Estêvão Cabral não chegou a concluir-se, porque os leitos se assorearam grandemente, porque o rio novo corre em caleira sobrelevada, porque falta continuidade ao rio velho, porque, em consequência, as cheias continuam a flagelar os campos, não é risonha. Antes pelo contrário.
No período de 19 de Junho de 1917 a 1956/1957 registaram-se no Mondego, em Coimbra, 3152 ocorrências de caudais superiores a 100m3/s1 (ou seja ao máximo comportado pelos leitos actuais sem trasbordamentos) e 796 ocorrências superiores mesmo a 300 m3/sL (ou seja um volume suficiente para generalizar as inundações aos campos).
Se restringirmos a análise à época das culturas (15 de Abril a 30 de Setembro), verificamos que no período de 1916/1917 a 1956/1957 foram 548 as cheias superiores a 100 m3/s1 e 38 as ocorrências superiores a 300 m3/s1. Daqui se pode concluir como saíram retardadas ou destruídas as sementeiras e inutilizadas ou diminuídas em seu rendimento as colheitas.
As deficiências no enxugo dos campos e a insuficiência dos caudais da rega - habitual em Julho e Agosto -, agravada com a salinidade em algumas zonas, tornam imperfeito o regadio de 10 500 ha e conduzem ao sequeiro numa área de 2300 ha.
Foi de harmonia com o plano de obras de hidráulica agrícola presente em 1937 à Câmara Corporativa que a Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola elaborou e apresentou em 1940 o exaustivo projecto de aproveitamento hidroagrícola e hidroeléctrico da bacia do Mondego (cf. o vol. I do Relatório da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola de 1939/1940).
Este notável trabalho procurava a regularização dos caudais do Mondego e afluentes (Dão, Alva e Ceira) por meio de albufeiras (uma no Dão, outra no Mondego, outra no Alva e outra no Ceira) e pela regularização dos leitos a jusante de Coimbra.
O objectivos então propostos podem sintetizar-se assim:

1) Redução dos caudais de cheia, em Coimbra, de cerca de 4000 m3/s1 verificados e 4500 m3/s1 possíveis para 1500 m3/s1 prováveis e 2050 m3/s1 possíveis;
2) Produção de energia no montante anual mínimo de 287 x 10º Kwh;
3) Defesa dos campos do Mondego por meio de diques e seu enxugo;
4) Elevação do caudal de estiagem do Mondego a 30 m3/s1, assegurando a navegação entre a foz do Dão e a Figueira da Foz;
5) Rega de 50 000 ha, sendo 15.000 ha dos campes do Mondego e 35 000 ha dos campos de Cantanhede ao Vouga;
6) Instalação de uma fábrica de amoníaco sintético em Coimbra, a localizar junto da Estação Velha. O trabalho de tal fábrica ajustava-se, sob todos os aspectos, incluindo o pessoal operário, à exploração geral do aproveitamento.

Não teve este projecto tempestivo seguimento, mas em 1954 retomou-se oficialmente o assunto, considerando, de acordo com determinação do Sr. Ministro das Obras Públicas, «o elevado interesse desta bacia