682 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 104
blemas do seu abastecimento. Neste particular, na zona suburbana têm de reservar-se áreas suficientemente extensas para a produção agrícola (principalmente nos sectores da horticultura e fruticultura) e ainda para outras actividades com ela relacionadas, nomeadamente a criação de gado, com destino ao fornecimento de leite, e a avicultura, para fornecimento de ovos e carne (p. 535, n.º 28).
Tal ponto de vista não é, porém, novo, pois em 1930 inicia-se na Inglaterra a defesa das melhores terras de cultura e de criação pecuária contra a invasão delapidadora dos construtores.
Sem cairmos na rigidez da cidade jardim de Howard, que tomava como limites do centro urbano- uma zona verde circundante para exploração agrícola, e que, sobretudo ao sul do Tejo, não seria possível estabelecer, importa, todavia, que junto de cada cidade ou vila, de preferência distribuídas em vários sentidos, sejam salvaguardadas zonas de cultivo e de exploração pecuária limitada, as quais serviriam ainda como verdadeiros pulmões do aglomerado.
Este conceito de cidade, que não é apenas aglomerado urbano, mas inclui também, entre os serviços de utilidade pública, centros produtores de géneros frescos, onde os, agricultores, trabalhando no amanho da terra, teriam consciência da sua cidadania, não sendo, por isso, levados a abandonar a terra para emigrar para a cidade, leva-nos a outro dos problemas que me propus aqui trazer, qual seja o da racional distribuição das actividades específicas de cada cidade, que entendo como um conjunto de bairros.
Aponta o parecer da Câmara Corporativa (ip. 523, n.º 15) o fenómeno verificado em mais de metade das freguesias de Lisboa, que no decénio de 1940 a 1950 diminuíram de população. De duas delas mesmo, tão acentuado era esse declínio, tiveram de ser extintas; pertenciam à área mais central da cidade. Pelo contrário, os freguesias afastadas do centro e já na periferia acusam u
Não se poderá hoje já fazer com que a «baixa» deixe de ser o que é, mas evite-se que o fenómeno se repita noutras zonas da cidade - ou mesmo noutras cidades -, determinando-se, em percentagens adequadas, que tantos prédios sejam para residência, que tantos outros sirvam para escritórios e outros ainda para comércio.
Quanto à indústria, mais naturalmente instalada em zonas apropriadas, tem de ter também acompanhá-la o conjunto de construções suficientes para a instalação do maior número possível de operários e empregados, com os órgãos necessários à vida integral da comunidade. Bairros para operários construídos tantas vezes em lugares opostos aos centros fabris são um atentado contra as energias e a riqueza da Nação. Que rendimento poderá dar um operário que, para pegar no
trabalho, tem de se levantar de madrugada e percorrer tantas vezes a pé quilómetros e quilómetros?
E eis-nos, Sr. Presidente, chegados ao último dos problemas do meu interesse. A natureza humana é contraditória e tenho para mim que o homem foi realmente feito para o sacrifício.
Quando eu era estudante, porque o dinheiro era pouco, tive de fazer diariamente durante dois anos, de comboio, o caminho Setúbal-Lisboa, para frequentar a Universidade.
Anos depois, também durante dois anos, fiz o mesmo trajecto de camioneta para frequentar um estágio. Avaliei pelo meu sono e pelo meu cansaço o que seria o sono e o cansaço daquelas muitas centenas de pessoas que como eu faziam para irem ao emprego de Lisboa, tendo do lado de cá do Tejo apenas a sua cama e um jantar retardado. E também das que iam de Setúbal ao Barreiro atraídas pela C. U. F.
Pois passados quinze anos volto a encontrar v a mesma gente, nos mesmos lugares dos comboios e dos carros, fazendo já parte deles, mais velha, mais cansada ... A mesma gente e outra já que a há- de substituir nesses lugares. E o curioso é que também volto a encontrar aquela gente que fazia o caminho contrário, isto é, que vinha de Lisboa ao seu emprego fora de Lisboa, agora aumentada pelo pessoal das Escolas Técnicas de Almada, Barreiro e Setúbal e indústrias novas. Há uma multidão deslocada que passa grande parte do dia a correr de cá para lá, atingindo cifras de milhões nos transportes fluviais, apinhando comboios, enchendo até aos estribos eléctricos e autocarros.
Também, tal como a indústria, há- de ser difícil arrumar quem há tantos anos, por necessidade ou gosto, vive desarrumado, mas atente-se na realidade e procure-se, no futuro, que a distribuição dos serviços e das empresas entre em linha de conta com os valores humanos e, se possível, se discipline a sua arrumação, delimitando-se áreas de residência, tal como as zonas de protecção dos monumentos.
Os próprios serviços e as próprias empresas muito beneficiarão com a medida que lhes convém apoiar e os operários e empregados, com o constrangimento de um ou outro mais espevitado nus seus direitos de livre escolha, acabarão por sentir também a sua utilidade. Hás para isso tem de ser encarada com vigor a política de construção económica, acabando-se com esses prédios de renda elevadíssima, onde poucas famílias podem viver sós e que absorvem funda percentagem do vencimento mensal.
Sr. Presidente: expostos os problemas que me propusera tratar e que foram a proibição de construção da beira das estradas, a modificação das zonas antigas de habitação, de preferência à criação de novos núcleos populacionais, a proximidade dos centros urbanos de zonas de exploração agrícola e pecuária, a arrumação da cidade em bairros auto-suficientes e a fixação da população interessada em determinada zona nessa mesma zona, deveria dar aqui por finda a minha intervenção. Mas, correndo embora o risco de perder a objectividade, pela minha qualidade de setubalense, não posso deixar de me referir a um outro pormenor da proposta de lei a que a Câmara Corporativa não deu o seu apoio.
A proposta de lei, partindo de dados estatísticos que, quanto à margem esquerda do Tejo, apenas se referem a Almada, Barreiro, Seixal, parte da Moita e parte do Montijo, aqueles concelhos suburbanos que mais directamente estão sujeitos à influência da capital, veio depois a incluir na região de Lisboa, na sua base I, mais os concelhos de Alcochete, Palmeia, Setúbal e Sesimbra.
A Câmara Corporativa estranhou a divergência e, embora tenha procurado e encontrado razões que a ex