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11 DE JUNHO DE 1959 913

b) Para que exista num país um estado de direito é necessário que nele exista também nina alta jurisdição que reúna todos os requisitos de independência, de imparcialidade e de competência perante a qual possa ser interposto recurso de anulação das decisões tomadas com infracção da lei e ofensivas dos direitos dos particulares que a mesma lei garante e protege.

O princípio da legalidade acha-se consagrado no nosso ordenamento jurídico em algumas leis ordinárias e infere-se do disposto nos já citados artigos 4.º e 6.º, n.º 1.º, da Constituição.
A garantia contenciosa jurisdicional ria fiscalização d« legalidade da Administração acha-se consignada na última parte do n.º 4.º do artigo 104.º da Constituição, onde se diz que compete ao Governo «superintender no conjunto da administração pública, fazendo executar os Leis e resoluções da Assembleia Nacional, fiscalizando superiormente os actos dos corpos administrativos e das pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e praticando todos os actos respeitantes à nomeação, transferência, exoneração, reforma, aposentação, demissão ou reintegração do funcionalismo civil ou militar com ressalva para os interessados do recurso aos tribunais competentes».
Mas tem-se entendido, e a meu ver bem, que a garantia contenciosa da fiscalização da, legalidade dos actos da Administração, que aflora na última parte do preceito que acabamos de reproduzir, se deve considerar restringida neste preceito constitucional só aos actos nele especificados de «nomeação, transferência, exoneração, reforma, aposentação, demissão ou reintegração do funcionalismo civil ou militar».
A sujeição ao recurso para o tribunal competente apenas dos autos administrativos que acabamos de referir e a omissão quanto aos restantes nesse texto constitucional, a não representar um simples lapso, não me parece que tenha justificação possível, em face do princípio da legalidade, tal como o enunciámos.
Mas o que há de mais grave é que tal omissão não só torna possível s irremediável o arbítrio na prática de certos actos administrativos por parte dos agentes da Administração, desde que tais actos se achem subtraídos à apreciação contenciosa por leis especiais, como acontece em alguns casos; como ainda pode dar lugar a suspeições injustas, quo facilmente seriam dissipadas pela acção jurisdicional do tribunal competente, acção essa de que só pode resultar benefício, tanto para os particulares, ofendidos nos seus legítimos interesses, como para o prestígio da Administração.
A esse grave inconveniente, a essa falta de garantia eficaz do princípio da legalidade poderá obviar-se com a inclusão na nossa lei fundamental, a primeira na hierarquia das leis, de um preceito geral como o que propus no artigo 2.º do meu projecto, nestes termos:

Todos os actos de conteúdo essencialmente administrativo, definitivo s executório dos órgãos da administração pública são susceptíveis de apreciação contenciosa.

Ora, sendo assim, todas as leis que contrariarem a disposição que nesse artigo 2.º se propõe serão declaradas inconstitucionais e inaplicáveis nos feitos submetidos a julgamento, em conformidade com o disposto no corpo do artigo 123.º da Constituição.
Ainda, para maior eficácia da fiscalização jurisdicional da constitucionalidade das leis, propus também uma alteração, no artigo 3.º do meu projecto, do citado artigo 123.º
Porém, como esse artigo 3.º, por lapsus calami, não traduz perfeitamente o pensamento que eu lhe quis emprestar, necessita de ser emendado, e para isso apresentarei oportunamente um projecto nesse sentido, por forma a significar que o meu intento é consignar no texto constitucional, expressamente, que as decisões sobre a fiscalização da constitucionalidade das leis deverão ser sempre susceptíveis de recurso até ao Supremo Tribunal, que tanto poderá ser o Supremo Tribunal Administrativo, como o Supremo Tribunal de Justiça, como o Supremo Tribunal Militar, de harmonia com o foro competente para o julgamento dos casos concretos que lhes estejam afectos.
A Câmara Corporativa achou por bem não recomendar n aprovação do meu projecto, como já disse, e fê-lo com base em argumentos que, com o devido respeito, me parecem absolutamente destituídos de consistência e de razão, portanto com argumentos que não lograram convencer-me.
Mas reservo para a discussão do meu projecto na especialidade a apreciação desses argumentos, pois entendo que então, e de harmonia com o Regimento, será o momento mais oportuno.
E agora que reconheço que, afinal, não fui tão breve nas minhas considerações como prometera logo ao iniciá-las, só me resta pedir desculpa a V. Exa. Sr. Presidente e aos ilustres colegas que tiveram a paciente benevolência de me ouvirem.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Franco Falcão: - Sr. Presidente: no pleno uso das liberdades e poderes constitucionais, está em discussão nesta Câmara o diploma primacial e básico que disciplina, define, consubstancia e estrutura toda a vida política nacional.
Não está em causa o estabelecimento de uma nova ordem constitucional, nem se trata de discussão que envolva alterações profundas na orgânica instituída.
Apenas se propõe, como medida renovadora, a adopção de métodos e sistemas que melhor se harmonizem com os acontecimentos e as realidades presentes, por forma a acautelar-se a dignidade directiva suprema, a manutenção dos princípios institucionais e o respeito pelos direitos, garantias e tranquilidade dos cidadãos.
É esta, sem dúvida, a grande razão de ética política, imposta em nome do prestígio do regime, do bem-estar da Nação s do bom e honrado nome de Portugal.
No que se refere à questão de saber se a presente Assembleia tinha originariamente poderes constituintes ou se apenas os adquiriu por virtude de antecipação deliberaria, é problema de pura interpretação, que me merece, aliás, o maior respeito, mas que em nada afecta a posição tomada, nem tão-pouco os propósitos visados.
Por isso relego o assunto paru os consagrados cultores do direito constitucional, sem, todavia, ter deixado de formar o meu juízo pessoal e íntimo, dominado pêlo enlevo e pela paixão da ciência jurídica, da qual tenho feito devotada profissão e que tem absorvido grande parte da minha vida.
Sr. Presidente: não quero deixar de prestar o meu depoimento nesta causa nacional e de transcendente expectativa, em que se pretendem ajustar as bases normativas do estatuto político fundamental à lição colhida dos factos e às concepções da orgânica corporativa da Nação e do Estado.
Serei, todavia, breve nas minhas considerações.
Poucas palavras, apenas as necessárias para, com a aconselhável ponderação e a indispensável objecti-