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948 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 120

possa ser eterno para afastar de mim o caso de consciência que acabo de expor.
Tive a honra, Sr. Presidente, de subscrever o projecto de lei n.º 23, o qual visava, nos suas linhas principais, a consignar no diploma constitucional princípios que se encontram na alma do povo português e que bem merecem ser transportados para a Constituição.
Outros desses princípios suo a resultante da nova idade que nasce e aos quais temos de traçar os contornos definitivos, na frase feliz de um escritor.
E porque legislamos para o futuro não podemos perder de vista a agitação das ideias no campo político-social para melhor podermos fixar aquelas que se mostrem mais aptas para a defesa da Nação.
São de Salazar estas luminosas palavras:

As constituições Vivem, em primeiro lugar, da adaptação do regime ao sentir e ao modo de ser dos povos e, em segundo lugar, da institucionalização dos seus preceitos, isto é, da extensão e intimidade com que os preceitos abstractos tenham entrado na vida real.
Nesta orientação afigura-se preferível que a Constituição e, portanto, as alterações constitucionais vão acompanhando a organização e que os maiores esforços se empreguem para a fazer progredir, se não para a completar.

Ora o projecto de lei n.º 23 está perfeitamente dentro dos princípios que acabo de transcrever.
Entretanto, a Gamara Corporativa, à qual tributo o maior respeito e consideração, reconhecendo que muitos dos seus membros são expoente brilhante da cultura e da mentalidade,- não o reconheceu assim, sugerindo a sua não aprovação por esta alta Assembleia.
Opôs-lhe o seu veto indirecto, já que para o directo não tinha competência.
Não escapou à sua critica o preâmbulo em que o povo português afirmava a sua fé em Deus, isto num pais em que os ateus são em tão reduzido número.
Deus, que está no princípio e no fim de todas as coisas, foi relegado para o lugar das inutilidades.
Devo confessar que a argumentação empregada nem me venceu nem me convenceu, e no momento próprio da votação não deixarei de proclamar a minha fé e considerar também meu tudo quanto se disse nesta Assembleia, por forma brilhante, a propósito de tão admirável princípio, que se encontra, felizmente, bem radicado na alma e no coração da gente portuguesa.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O projecto de lei a que me venho reportando tem a profunda inspiração do estabelecimento de uma justiça social perfeita e que dê satisfação aos anseios do homem dos nossos dias.
Foi ele buscar às encíclicas sociais os seus princípios informadores.
Há, na verdade, que por cobro às pretensões injustificadas, quer do capital, quer do trabalho, estabelecendo entre estes dois factores de produção uma intima associação segundo o princípio de justiça, como proclamava o Santo Padre Pio XII no seu formosíssimo discurso na celebração do aniversário das encíclicas sociais.
Nem sempre o critério de justiça está presente nas relações entre o capital e o trabalho.
Certo é que o Estado Novo já tem obtido conquistas apreciáveis nesta melindrosa questão e o Estatuto Nacional do Trabalho, publicado há vinte e seis anos, é um padrão glorioso a atestar o desejo do Governo no sentido de conseguir um eficaz ordenamento na vida económica, social e política da Nação.
Entretanto muito há que caminhar neste sentido para que possa surgir, com toda a sua nitidez, o conceito de Spinosa quando diz:

Homem justo é aquele cuja permanente vontade consiste em atribuir a cada um aquilo que lhe ó devido.
Para que tal aconteça é necessário concluir como Garrett:

É indispensável preparar uma nova concordata entre a sociedade e o Evangelho, rico de caridade e de justiça.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-Não se pode esquecer na vida político-social da Nação o carácter marcadamente humano do trabalho e dor a este o lugar de relevo que deve ter numa sociedade em que a justiça predomine.
Se o capital e o trabalho são ambos factores da produção e da vida humana, completando-se entre si, dúvida não pode existir sobre o carácter eminentemente humano desta relação criada.
Assim os n.ºs 3.º e 4.º do artigo 31.º da Constituição, segundo o projecto de lei n.º 23, pretendem fixar bem no nosso estatuto fundamental os princípios que devem nortear as relações entre o capital e o trabalho:

Nem aquele reclamará para si a totalidade do beneficio, deixando à classe trabalhadora o mínimo, nem o trabalho poderá chamar a si todo o lucro, dedução feita das exigências de amortização e reconstituição do capital.
Equacionado o problema, cujo desenvolvimento nos poderia levar muito longe, ao Estado incumbe estabelecer as normas directivas da actual concepção de capital e
trabalho, não esquecendo que o social e o humano prevalecem sobre o económico.
Assim foi entendido, publicando-se o Estatuto do Trabalho Nacional e inserindo-se na Constituição o n.º 3.º do artigo 31.º, embora sem o complemento do sentido de humanidade social que o projecto apresentava.
E até se torna mais inexplicável a condensação deste principio por parte da Camará Corporativa quando, como ela própria reconhece, o n.º 2.e do artigo 31.º leva em consideração os interesses superiores da vida humana quando possam ser prejudicados pelas actividades das empresas contrárias a tal fim.
O artigo 31.º da Constituição encontra-se, de facto, transcrito, em boa parte, no Estatuto do Trabalho Nacional, no seu artigo 7.º
Não se diga, porém, que dal poderiam surgir inconvenientes de ordem formal, unia vez que a Constituição, o diploma maior do País, consignasse a proposta alteração, que mais não era do que o complemento de grande parte da obra levada a cabo pelo Governo do Estado Novo neste sector.
Prometi, Sr. Presidente, que a minha intervenção no debate em curso seria ligeira e não passaria de rápidos apontamentos referentes a alguns dos pontos basilares das propostas de alteração à Constituição.
Aqui me quedo, pois, visto me faltar o tempo e o engenho para poder ir mais longe.
Desejo, porém, antes de terminar, formular o voto veemente de que as alterações ao estatuto fundamental da Nação sejam fecundas, eficazes e úteis para a vida da mesma.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.