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15 DE JUNHO DE 1959 945

O Orador: - Um último ponto deve ser recordado.
A campanha eleitoral; além da sua função de suscitadora de opiniões, para o efeito do voto, tem um outro importante papel: o de luta pela conquista dos sufrágios. Não se trata só de elucidar, mas, sobretudo, de convencer e atrair. É a sua função de propaganda.
Desde que exista mais de um candidato - e esta condição é essencial, porque sem alternativa não há opção -, a concorrência entre as várias propagandas transforma-se numa verdadeira competição. E, como não pode deixar de ser, a competição, em que participam massas de milhões de pessoas e em que os trofeus disputados são os próprios comandos da vida colectiva, origina um intenso estado emocional, que, aliás, é próprio de todas as competições, e que no nosso país assume as formas exacerbadas que se podem observar era qualquer certame desportivo.
A semelhança entre a pugna eleitoral e a desportiva é tão evidente que, nos momentos de paixão mais viva ou de tumulto mais ruidoso, o que as pessoas serenas aconselham é precisamente isto: que se mantenha o espírito desportivo. É significativo que, quando se discutem coisas tão sérias, nós já nos contentamos com guardar só aquela compostura e disposição de ânimo que são requeridas nos divertimentos dos estádios.
Ninguém põe em dúvida que o estado emocional obscurece a razão, destrói o equilíbrio dos motivos e impede a formação de um juízo correcto. Também isto é da observação mais correntia, e todos sabemos que, quando exaltados, podemos dizer coisas que não traduzem aquilo que efectivamente pensamos. Este facto é tão comum que as leis o reconhecem e regulam, estabelecendo a atenuação da responsabilidade penal para as frases ditas ou actos praticados em estado de exaltação.
Com esta matéria poderiam fixar-se as seguintes premissas: o sufrágio directo não pode funcionar sem campanha eleitoral, isto é, sem mobilização emocional do eleitorado; a opinião declarada em estado emocional não exprime o pensamento verdadeiro. A conclusão resulta necessariamente: o sufrágio directo não exprime um pensamento verdadeiro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Estas críticas são mais que suficientes para ter de renunciar ao sufrágio universal directo. Não é a condenação da ideia em abstracto; não é esse aborrecimento a democracia que vejo às vezes solfejar, sem que primeiro se tenha demonstrado que, fora da democracia, há no nosso tempo caminho para a organização do Estado. É apenas a observação das coisas tais como elas efectivamente são; é talvez o próprio respeito pela ideia democrática, que é a de que a Nação tem o direito de afirmai a sua voz e a ser conduzida na obediência dessa mesma voz. Porque é essa mesma razão que nos impõe o dever de dispor as coisas por tal forma que a Nação não possa ser nunca enganada ou que a flua voz seja sempre verdadeiramente, profundamente sua.

O Sr. Simeão Pinto de Mesquita: - S. Tomás de Aquino.

O Orador: - Eu estou sempre em boa companhia.
Considero, portanto, assente mais este resultado: o método do sufrágio directo, até hoje em vigor, deve ser substituído. Aceito, portanto, a proposta governamental na medida em que ela exprime uso mesmo: a condenação do sufrágio directo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Se, porém, bem observarmos, a proposta não se limita a abrir o sufrágio directo; o que nele realmente se suprime é o próprio sufrágio universal.
Creio que não se distinguiu entre um e outro destes dois conceitos, e a falta de distinção conduziu a uma conclusão inadmissível, porque sufrágio directo e sufrágio universal são ideias que se não podem confundir.
No sufrágio universal todo o eleitorado se pronuncia: ou directamente, tomando posição quanto ao problema de fundo, ou indirectamente, escolhendo um representante a quem passa mandato para votar em seu nome; destas duos modalidades a primeira constitui o sufrágio directo e a segunda o sufrágio indirecto, que se pode articular em dois ou vários graus.
Isto é: o sufrágio universal, que resulta do princípio básico da necessidade de audiência da Nação, realiza-se tecnicamente por vários processos, entre eles os do sufrágio directo e o do sufrágio indirecto. Assim, a supressão do sufrágio universal constitui alteração de princípio; a substituição de um processo por outro será apenas aperfeiçoamento técnico, com vista à realização do princípio.
Verifica-se que todas as críticas, quer as constantes do parecer corporativo, quer as que entendi dever aditar-lhe, se dirigem ao processo do voto directo, e apenas a ele; foi-se, portanto, para a condenação do género em nome de acusações que se dirigiam à espécie e postergou-se um princípio pelas dificuldades de um processo:
Não se levantam dúvidas sobre a inconveniência do sufrágio directo, mas não se verifica que essa inconveniência afecte igualmente o indirecto.
O que deve determinar o emprego de uma ou outra das modalidades do sufrágio universal é o carácter da consulta feita e a natureza e nível cultural da população consultada. A consulta directa deve ter lugar quando o eleitor pode, por si, cumprir o dever eleitoral com genuinidade, conhecimento do assunto e consciência da posição tomada. A consulta indirecta impõe-se quando essas condições se não verifiquem, tornando-se necessário eleger um corpo de escol, constituído por pessoas com qualidade bastante para emitir votos plenamente válidos e acreditado como intérprete do sentir comum por uma eleição directa, de carácter rigorosamente pessoal e cujo sentido não é, portanto, o da tomada de posição num pleito ideológico, mas o da outorga de confiança em procuração colectiva.
Pode dizer-se que para designar os eleitores de segundo grau tem de se recorrer ao sufrágio directo. Teve; mas em condições tais que esse voto já é plenamente relevante. Desde que a eleição se faça nas pequenas comunidades - no caso português seria naturalmente a freguesia - e desde que se exija que o eleito tenha ali a sua residência permanente, essas condições ficam asseguradas.
O eleitor de base não pode, honestamente, decidir qual de dois homens eminentes pode servir melhor os negócios públicos; não pode mesmo, na regra, distinguir, dentro de duas propagandas, qual é a mais fundada, objectiva, conforme ao interesse português. Mas pode sempre dizer, dentre dois moradores da sua freguesia, e portanto seus vizinhos, qual é o que lhe merece maior respeito ou maior confiança. Trata-se apenas então de escolher um homem bom, um procurador político.
O fundamento lógico desta exigência de um mandatário habilitado é evidente e pode filiar-se em princípio pacificamente aceite cela ordem jurídica de todos os povos: o de que a prática dos actos que supõem conhecimento especial obriga à intervenção de representante qualificado. E esse, por exemplo, o fundamento do ins-