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876 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 177

lismos simpáticos a que a prudência mandava aderir; tinha-se já, na verdade, perdido muito tempo, e da sementeira dos ventos começava a recear-se a colheita das tempestades.
O reconhecer que foi tarde não apaga em nós o júbilo de ver como, enfim, a flor do nosso exemplo se fez fruto que todos apetecem e como a semente do- génio português concentrava em «i ainda a força para desterrar do Mundo a concepção pagã do colonialismo, substituindo-lhe a ideia mais alta da solidariedade cristã entre os povos.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Do dever sagrado que no Mundo agora se proclama tivemos nós a evidente prioridade; e onde houver justiça não se recusará, a quem colheu as palmas de tantos martírios, o direito a cingir também os louros dessa alegria.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Só é para desejar que a ideia se mantenha *alta e pura, como é, e não venha a servir de ferramenta para a prática de insídias cobiçosas; e que nunca se degrade daquela veracidade abnegada e missionária que nós sempre lhe imprimimos, e à qual por nossa parte saberemos sempre continuar fiéis.
Parece uma visão profética essa página do cronista que descreve o príncipe velando na noite rodeado das gentes das nações. 500 anos volvidos, eis que a obra feita permanece como lição patente à reflexão dos homens responsáveis das nações do Mundo.
E se a experiência, que nós coroámos Madre de toda-las cousas, continua ainda a conferir alguma autoridade, hão-de os estranhos reconhecer aos Portugueses o foro não de discípulo, mas de mestria consumada e diuturna, coisa que sempre há-de valer mais que o ligeiro discorrer, com base só nos conceitos que o engenho descobre e por vezes o interesse passageiro inspira.
E, transmudado ao terreiro da sociologia histórica, o conflito revelado pelos sábios portugueses dos tempos das viagens sobre se há-de pertencer a primazia às «fábulas sonhadas» de que falou Camões, se às «puras verdades já por nós passadas» - o testemunho da observação vivida, do que foi claramente visto e longamente experimentado.
Os caminhos da encruzilhada que em nosso tempo se abrem são, de um lado, a ambição de edificar o futuro dos povos jovens na base de conceitos que, por nunca terem sido provados, só do futuro poderão esperar a confirmação da sua robustez; do outro, a convicção portuguesa de que a marcha para a civilização é um processo lento e natural, em que é arriscado impor fórmulas, em vez de aguardar que os povos as descubram.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Estão frente a frente o método, que consiste em propor como ponto de partida estatutos cuja única provisão de crédito é a de terem sido as metas de chegada na evolução de povos cuja raça, terra, cultura, economia, índole e história eram completamente diferentes das daqueles outros povos para os quais se pretende operar a transferência.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - E o processo de não antecipar o que nem sequer temos séria razão para crer que alguma vez seja verdadeiro e de não incorrer no risco de falsear o curso da história, quer pela adopção de programas que contrariam os próprios fundamentos da nossa acção civilizadora, quer pela imposição de soluções que não se provou ainda coadunarem-se com a vocação de povos de cujo futuro somos, por direito próprio, os únicos responsáveis.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - É esta uma encruzilhada sem precedentes em toda a história da civilização. A sedução inebriante das inovações e a busca interessada de um prestígio fácil podem a outros calar a repugnância que naturalmente inspira o jogar aos dados o destino dos povos; mas aos Portugueses, a quem só «a experiência ensina radicalmente a verdade», não fica aberto esse caminho de arriscar em aventuras a paz vindoura de comunidades de quem temos não formais títulos de mandato ou de tutela, mas obrigação grave de legítima primogenitura.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em suas aventuras seculares os homens da nossa raça souberam muita vez morrer para que outros se salvassem; mas o que nunca aceitaram foi expor os outros a azos de perdição para poderem salvar-se a si próprios.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Eis, pois, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em teor de nua conclusão, qual me parece, pois, ser o providencial significado deste jubileu lusíada e do nosso fervor ao celebrá-lo: na noite dos erros dos homens, na angústia das decisões sem regresso, o gesto do navegador continua, do alto da falésia mística, a apontar ao Mundo a certeza do caminho experimentado, aos Portugueses a responsabilidade e a glória desse destino.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Duas palavras para felicitar os oradores desta sessão pelo brilho que deram à homenagem prestada pela Assembleia Nacional à memória do infante D. Henrique. A evocação e a meditação sobre o espírito, vida e obra do grande príncipe da dinastia de Avis, porventura o mais eminente representante da ínclita geração de altos infantes, pode ser ainda hoje uma preciosa e nova inspiração para a geração do nosso tempo. Escolher um ideal superior de vida ao serviço da Pátria; consagrar-se à sua realização ao longo da existência, sem tergiversações nem desanimes; arriscar para essa realização aquilo que o homem tem de mais precioso - a própria existência; sacrificar-lhe ainda os prazeres mais legítimos, sem desviar, por um momento, os olhos da linha de acção que adoptara; que altíssima lição, meus senhores, que nobilíssima- lição, meus senhores ! Lição de ontem, lição de hoje, lição de sempre !
Já não há, meus senhores, a lenda dos mares tenebrosos a afrontar e a destecer. Já não há o gigante Adamastor debruçado no promontório do Cabo, a profetizar catástrofes para os que tentassem ultrapassá-lo. O planeta está desvendado de lês a lês. Mas há ainda outros mistérios mais perigosos, talvez a pesarem sobre o espírito do homem e a perturbarem o progresso e a paz do espírito dos povos.