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2044 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 81

A toda a hora os centros provincianos são cortados a 60 km e mais à hora por grandes camiões de carga, buzinando furiosamente. Mesmo de madrugada, de uma ponta à outra de uma vila, aquelas grandes máquinas com alarmes potentes afirmam a sua passagem sem respeito.
E a polícia de segurança?
No turbilhão da investida a Polícia não acode pronta ou não pode agir eficientemente, ou então testemunha apenas o absurdo da vida hodierna.
E a Guarda Republicana?
A Guarda republicana, uma força eficiente e modelar, que produzia reais esforços para que as leis não fossem letra morta, foi reduzida às condições mais que modestas de polícia rural, tendo de assistir sem prever e menos ainda remediar.
As autoridades locais?
Parece não disporem de força jurídica para contrabater as violações da lei e os desregramentos.
Há a falsa sensação de que os grandes veículos dominam as estradas.
Uma das razões da estatística dos acidentes é o exclusivismo a que são levados os condutores de pesados.
Durante anos e anos, nos concelhos de Trancoso e Celorico viajava um grande Packard, que pertencera à artilharia pesada, que o general Pershing trouxera para o front, em França, por 1917.
Toda a estrada era sua.
Ele não tinha que se desviar, dizia o seu proprietário. Os outros é que deviam abrir-lhe passagem.
Alcandorado lá no alto, nada o podia atingir nessa quadra longínqua.
Este estado de espírito não parece excepção, podendo dizer-se que é frequente.
Mas há mais.
O veículo de carga, movido a velocidade frenética, toma conta das curvas, bloqueia o movimento, obriga os que o cruzam a manobras marginais ou extremas, tolhe o movimento do lado e pela frente.
Sucede que, apertando com o movimento, dificultando o trânsito, eliminando as perspectivas, deixando aos vizinhos apenas uma faixa estreita nos lances da conjuntura, o camião pesado é ainda responsável por acidentes e sinistros que parecerão proceder de imperícias, travagens ou comando defeituoso.
Portanto, além do que só vê há ainda o que se não vê.
Este estado de coisas carece de ser realmente enfrentado, não obstante algumas alegações correntes.
Apela-se para o estado das estradas, para a sua deficiente consistência e asfaltagem, para a estreiteza das faixas de rolagem, para as covas e sub-rodas.
Mas estas circunstâncias obrigam por si a uma condução cautelosa e moderada.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Muito bem!

O Orador: - Apela-se para as exigências empresariais, que levam a relegar horários, a ganhar tempo e atam o que conduz muitas horas seguidas.
Um abuso nunca desculpará outro.
Numa época de organização e disciplina corporativa e de respeito pelo homem que trabalha, de intervenção constante das autoridades, não se compreende que assim possa ser e que, se assim é, tal estado persista e continue.
Alega-se a necessidade de praticar velocidades superiores para não perder embalagem e galgar as rampas.
Parece que, dotados os carros de aperfeiçoamentos de toda a ordem, estes percalços não obrigam a práticas perigosas.
Outras alegações ainda sobre a falta de domínio, marcha irresistível, travagens difíceis, etc., são pormenores que à justiça incumbe verificar.
Deram-se há dois anos nada menos de 160 acidentes mortais motivados na camionagem de carga.
A estatística dos transportes terrestres confirma as observações gerais e a indignação geral.
Havia em 1961 rolando nas estradas:

Automóveis ligeiros de passageiros .......164 146
Automóveis ligeiros de carga ..............27 924
Automóveis pesados de carga ...............20 826

Os automóveis pesados eram quase um décimo do número dos automóveis ligeiros. Pois a estatística dos acidentes revelava estes números:

[Ver quadro na imagem]

Apesar do seu número relativo, apesar de os veículos automóveis de carga representarem um décimo do parque automóvel ligeiro, o número de acidentes mortais era de metade - 160 para 386, provocados por um décimo de viaturas.
Estes números julgo-os tão evidentes e trágicos que me recuso a comentá-los.
Também os lesionados, em geral, se comportavam na proporção de um para oito, bastante mais que um décimo.
Não quero desviar-me do meu assunto e lamento que os que estudaram, discutiram e comentaram o problema o não tivessem referido com o destaque que merece.
Os escritores, técnicos e especialistas preconizam várias medidas, aliás, muito conhecidas e discutidas.
Os camiões de carga circulariam de noite e não descarregariam nas grandes cidades senão de noite também.
Seriam sujeitos a estranguladores que lhes não permitissem passar dos limites de velocidade previstos nas leis
Os veículos de carga teriam um limite único, 40, 45 ou mesmo 50 km à hora.
E os seus condutores precisariam de dar provas mais completas de idoneidade profissional e de atenção para com os outros.
Seguro obrigatório?
Talvez. Mas depois de a lei vir aqui, para ser debatida, na plena pormenorização de todos os interesses e explicado por que sendo ruim o negócio tantos o querem.
Mais polícia?
518 agentes com 152 automóveis e motociclos poderiam à vontade eliminar os malefícios mais que visíveis dos camiões em delírio de velocidade.
Uma política humanista que combine a base social com os direitos e garantias fundamentais da pessoa deve assegurar o grande dom de Deus que é a vida e a integridade, que consubstancia todos os demais direitos.
Uma política humanista e de solidariedade social tem de ser humanitária - piedade com os fracos e com os descuidados, defesa dos que cruzam as estradas, sejam eles quem sejam, pois a sua vida e integridade física é um bem sem estimativa nem preço. Os que têm sofrido e os que não escaparam à sanha dos volantes ou à pura infelicidade merecem respeito, e atenção, e deve-se corresponder-lhes de forma resolutiva.