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16 DE JANEIRO DE 1964 2885

Mas não, desejaria mesmo colocar o problema neste desdobrar da burocracia sobre si própria no processo sociológico da sua estrutura ou motivações.
Afigura-se-me que no plano imediato da formação e selecção dos servidores públicos deveríamos avançar um pouco mais.
A formação directa do pessoal, através de escolas especiais de administração, constitui meio indispensável a uma valorização da eficácia administrativa.
Exemplifique-se com a vizinha Espanha, onde os cursos selectivos, de especialização e de aperfeiçoamento relativamente à administração local constituem matérias a cuidado de um centro de estudos especializado.
Já há anos que Sauvy afirmava ser extremamente oneroso o sistema, que tende a transformar a função pública num vasto serviço social de recuperação.
Encontrava-me em Luanda, há meses, quando aí se realizou o Congresso dos Municípios. Pois uma das questões que mais me pareceu preocupar os presentes foi ainda a da selecção e aperfeiçoamento dos funcionários administrativos.
Creio que tudo se congrega para justificar, entre nós, a criação de um instituto de estudos da administração local.
Tal como o seu congénere espanhol, competir-lhe-ia a investigação, o estudo, a informação, o ensino e a propaganda dos temas da vida local nas suas implicações de carácter jurídico, administrativo, social, económico e técnico, além da formação e aperfeiçoamento de administradores e de funcionários.
Referirei ainda aqui dois problemas: o do predomínio do recrutamento local para os lugares inferiores nos quadros dos serviços de secretaria e o da situação de alguns serviços especiais.
Os concursos para as vagas dos quadros privativos dos corpos administrativos são abertos por deliberação destes e realizam-se nas respectivas sedes, sendo o júri constituído nas câmaras municipais.
Tem-se argumentado que o facto de os concursos serem apenas válidos para as vagas existentes à data da abertura impõe uma sucessiva realização dos mesmos, com inconvenientes para um provimento mais rápido dos lugares. Melhor seria, acrescentam os que raciocinam assim, abrir concursos válidos para as vagas que viessem a ocorrer dentro de determinado período. Convirá, contudo, ter presente que à sucessão de concursos quebra um certo imobilismo, na medida em que facilita a revelação de valores.
Afirma-se ainda que a constituição do júri se harmoniza com o favoritismo local.
A questão tem os seus melindres. Convirá, no entanto, salientar que o regime vigente possibilita a vantagem da relativa fixação dos indivíduos à terra onde nasceram.
Quanto ao pessoal dos serviços especiais, permito-me, de novo, chamar a atenção para os partidos médicos, para os partidos veterinários e para a situação dos engenheiros municipais.
A experiência das últimas décadas, quanto aos médicos municipais, revelou a insuficiência do sistema. Uma má cobertura das zonas rurais aliou-se à modesta remuneração dos facultativos, mormente nas regiões pobres do interior, onde, de resto, são restritas as possibilidades de pulso livre. Haverá a acrescentar a isto os inúmeros atritos fundados em irregularidades nos concursos de provimento e na obrigatoriedade, tantas vezes iludida, de os médicos municipais residirem na área do respectivo partido.
Continuo convencido de que a assistência médica às populações rurais deve constituir um serviço nacional harmonizado, de resto, com a extensão da segurança social a essas mesmas populações.
Quanto aos veterinários municipais, também se me afigura oportuna a sua integração nos quadros do Estado.
A actual rede de partidos é insuficiente.
Anotam-se ainda melindres quanto à subordinação hierárquica, e a cobrança de emolumentos por parte dos veterinários municipais tem algumas vezes sido objecto de censura.
Creio, de resto, que este problema dos veterinários é apenas um aspecto de uma questão mais importante: a conveniente cobertura do País por técnicos que apoiem o desenvolvimento económico.
Ainda recentemente ao sugerir desta tribuna uma revolução na vida local, enalteci o interesse do sector terciário nesse movimento.
No que respeita aos engenheiros municipais (e técnicos afins), reconheço a oportunidade de um quadro geral, tal como o quadro geral administrativo dos serviços de secretaria. Convém definir as categorias, os direitos e as obrigações destes servidores, libertando-os da impossibilidade de acesso ou transferência para outros lugares.
E passo às relações entre a divisão regional do País e as autarquias.
A qualidade e a extensão das autarquias comanda naturalmente as suas atribuições e competência, projectando-se ainda nas possibilidades financeiras.
Poderíamos, mais concretamente, reflectir sobre o planeamento regional e suas exigências orgânicas; o papel das autarquias de extensão mais lata do que o município; o ajustamento territorial das instituições; os condicionalismos especiais dos centros urbanos.
Fixemo-nos na bacia hidrográfica de um rio. Seja mesmo ainda o caso do Mondego. Um estudo do aproveitamento das potencialidades económicas deste rio, ou dos problemas ligados às mesmas, não deixará de ter em conta o repovoamento florestal, o domínio, dos caudais sólidos, a regularização das cheias, a rega dos campos da Cova da Beira, de Celorico, de Coimbra, de Cantanhede ao Vouga, a produção de energia eléctrica, o abastecimento de água às populações dos concelhos marginais, a navegação fluvial e outras comunicações, o porto da Figueira da Foz, a instalação de indústrias, o turismo, etc. (cf. os meus trabalhos: O Desenvolvimento Regional c as Realidades Portuguesas (Coimbra, 1962) e O Aproveitamento do Mondego e o Desenvolvimento Regional (Coimbra. 1962).
Existe assim um elemento comum de ligação: a valorização económico-social de uma vasta área a partir de um rio; concorrem hoje, nesta região, várias instituições autónomas territoriais ou não territoriais que beneficiam de uma devolução de poderes.
Ora, de futuro, poderá tornar-se indispensável algo mais do que uma simples coordenação de esforços; é natural que os planos de desenvolvimento regional imponham a criação de instituições autónomas dotadas de amplos poderes, não só durante o período da execução dos trabalhos, mas até aquando da fase de exploração (cf. ainda o meu estudo publicado na Revista de Direito Administrativo, tomo IV, pp. 173 e segs., «A intervenção dos municípios em matéria económica»).
Creio não se tratar de uma simples sugestão académica.
Quem não recorda, a propósito do Tenessi, nos Estados Unidos, a criação da T. V. A. (Tennessee Valley Authority) e toda a sua brilhante experiência?
Tive há anos oportunidade de fazer parte da delegação portuguesa ao Congresso Internacional de Ciências Administrativas, em Wiesbaden (Alemanha Ocidental). Pois já nessa altura me foi dado constatar como o problema da possível devolução de poderes a novas instituições