5 DE DEZEMBRO DE 1964 4007
de interesse duvidoso e em três casos especiais se afigura descabido.
Comecemos por estes três. Na primeira epígrafe do quadro VIII do capítulo viu do projecto do Governo, lê-se: "Conhecimento científico do território e das populações ...", etc. E o relatório, no n.º 20 do mesmo capítulo VIII, esclarece que se afigura "de todo o interesse desenvolver e aprofundar os estudos da população nos seus múltiplos aspectos: antropologia, etnologia, antropologia cultural, etc.". Quer dizer: parte da dotação atribuída a esta rubrica parece destinar-se a estudos que nada têm que ver, nem de perto nem de longe, com os objectivos do Plano. A etnologia ou a antropologia poderão revestir-se de interesse cultural muito notável, mas será absurdo custear-se o seu estudo por conta de dinheiro que, em última análise, se destinam a melhorar o nível de vida das populações.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Para a realização de empreendimentos sócio-económicos não é o conhecimento antropológico ou etnológico das populações que interessa, é o seu conhecimento humano; e este adquire-se pela convivência, não por missões d.e estudo.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Ora a convivência luso-oceânica no Timor Português iniciou-se há séculos; não conheceremos nós os Timorenses? A menos que se tivesse inscrito idêntica rubrica no plano de empreendimentos do continente e das ilhas, a sua inclusão nos planos das províncias ultramarinas chega a ser mesmo chocante. É interessante notar que no seu parecer n.º 19/vm a Câmara Corporativa não faz qualquer menção daquele "Conhecimento científico das populações", muito embora produza comentários sobre a investigação científica e os estudos de base; anãs foi pena que tivesse mantido a fórmula no quadro n.º 35 do mesmo parecer. Cabe-me a mim propor que se suprima, reduzindo-se a rubrica I a "Conhecimento científico do território, investigação científica e estudos de base".
Surge logo adiante uma outra rubrica que me parece de interesse duvidoso: é a que se refere ao "Centro de Estudos". E que, no caso de Timor, parece-me problemática a simples organização de um centro destinado à investigação científica: em primeiro lugar por falta de cientistas; em segundo lugar porque as chefias dos vários serviços técnicos da província - economia, obras públicas, agricultura, etc. - dispõem já de um número de elementos que. embora poucos, poderiam encarregar-se do arranque da investigação dentro dos respectivos sectores. E pena que no relatório do Governo não se contenha qualquer esclarecimento sobre a ideia que teria presidido à inclusão desta rubrica, o que nos não permite fazer uma ideia quanto à organização que se pretende dar ao Centro de Estudos, mas uma coisa é certa: com Centro ou sem Centro, os investigadores não se arregimentam facilmente, e para se conduzir a investigação terá de se recorrer ao pessoal dos serviços técnicos já existentes na província e a cientistas destacados pela metrópole. O que viria a ser então organicamente o Centro de Estudos senão um gabinete burocrático para a gestão dos dinheiros consignados à investigação?
Mas há ainda outro aspecto a salientar: qual a missão a atribuir ao Centro de Estudos. Sucede que, dentro dos objectivos do Plano de Fomento, as investigações a realizar deverão integrar-se na missão geral de contribuir para
o aumento do rendimento económico do território. Ora o Plano já encara, em separado, o financiamento de estudos e pesquisas nos domínios cartográfico, hidrológico, meteorológico, estatístico, agrícola, silvícola, pecuário, piscatório, eléctrico, geológico, mineiro, industrial. Que estudos ou investigações irão recair então no campo de responsabilidades do futuro Centro? Parece que, por exclusão de partes, lhe caberá apenas a etnologia - missão que será de rejeitar in limino.
Diz o relatório, no n.º 20 do capítulo VIII, que o Centro seria "um ponto focal para a coordenação e centralização dos estudos em investigações de natureza científica". Ora os estudos previstos no Plano de Fomento, pela sua própria natureza, são tão especializados que não restam dúvidas de que a sua condução apenas requer fiscalização adequada por parte dos serviços centrais e provinciais, opinião esta que me parece ver defenda pela Câmara Corporativa no n.º 27 do parecer n.º 19/vm). Nesta ordem de ideias, parece-me acertado propor a exclusão da rubrica i, 2), a). A dotação de 6000 contos (veja-se bem, 2000 contos por ano, 166 contos por mês) poderá, muito utilmente, reforçar outras rubricas bem mais úteis à província.
O terceiro caso é o da alínea que se segue: "Bolsas de estudos". No relatório do projecto do Governo, é no capítulo dedicado a Cabo Verde que se indica o destino a dar a estes 1500 contos. E aqui nos surge de novo a fórmula: "E de todo o interesse desenvolver e continuar a aprofundar os estudos da população nos múltiplos aspectos: antropologia, etnologia, antropologia cultural, etc.". Parece-me, assim, que os 1500 contos se destinam a custear visitas de antropólogos e etnólogos. E eu volto a dizer que estes estudos têm muito interesse num domínio puramente cultural e que nada interessam para a melhoria do nível de vida da população de Timor. Está muito bem que se estudem os usos e costumes, o folclore, a herança- cultural, as tradições, a história dos povos de Timor, mas essas investigações deverão ser antes custeadas por organismos que parecem naturalmente indicados para as apoiar, nomeadamente o Instituto de Alta Cultura e a Junta de Investigações do Ultramar. Que se suprima então esta rubrica, destinando-se a dotação de 1500 contos a reforçar outras bem mais necessárias à província.
Mas, voltando ao ponto de partida, as quantias destinadas a custear os vários trabalhos de investigação e estudo parecem excessivas. Com efeito, segundo o projecto do Governo, destinam-se a esse fim:
Contos
Conhecimento científico do território, investigação científica e estudos de base .... 19 000
Investigação básica agrícola, silvícola e pecuária ................. 12 000
Investigação básica e assistência técnica, no capítulo "Pesca" ............ 6 000
Estudos no domínio das indústrias extractivas .................. 11 900
Estudos no domínio das indústrias transfor-
madoras ............... 600
Total ......... 49500
E há a notar ainda que, das dotações atribuídos a "Energia", a "Ampliação, renovação e criação de novas indústrias" e a "Turismo", num total de 19 500 contos, uma parte não especificada se destina igualmente a estudos. Mas, reportando-nos apenas àqueles 49 500 contos, não se vê bem como irá a província gastar 1375 contos por mês em estudos, não se vê bem como arregimentar um número de investigadores e técnicos capaz de absorver tanto dinheiro nos seus trabalhos de investigação, e, só-