14 DE DEZEMBRO DE 1966 833
Sendo assim, também não se poderá julgar actualizada, e de harmonia com as necessidades presentes e crescentes dos motoristas, a retribuição semanal líquida de 293$30, que corresponde a menos de 40$ diários e 1200$ mensais, por um trabalho de dez horas que, na prática, corresponde a pouco menos de doze.
Mas como há que estabelecer a justa harmonia entre as necessidades do trabalhador e as possibilidades do empresário, considerados como mútuos colaboradores, cabe perguntar se o rendimento da exploração dos automóveis com taxímetro é suficiente para a satisfação de novos encargos resultantes de um aumento de salários.
Creio que se pode responder imediatamente através do que se sabe sobre a exploração exercida, até há pouco tempo, com o chamado negócio dos alvarás, que é do domínio público.
Dizia-se que a venda de um automóvel com taxímetro andava, em Lisboa, por 500 contos. Não se vendia o veículo, vendia-se a licença para circular, vendia-se o alvará. Não há muito tempo, depois de o Ministério das Comunicações haver denunciado o propósito de pôr termo a esse rendoso negócio, um jornalista do Diário Popular averiguava que um carro anunciado nos jornais, que andara 350 000 km, o que imo é muito, se considerarmos que muitos deles já passaram o milhão de quilómetros, se vendia, com direito à praça, é claro, por 580 contos, e o vendedor, segundo confessava, já tinha uma oferta de 565 contos.
Ninguém acredita que quem se dispunha a dar 565 contos pelo direito de explorar uma indústria cujos preços de venda estão fixados e garantidos por um mecanismo devidamente aferido ignore os resultados económicos dessa mesma indústria.
Calcula-se que um táxi faz em média 50 serviços, ou mais, por período de 24 horas, percorrendo 300 km, a que corresponde um apuro de 500$ a 700$.
Calcula-se, também, que as despesas, abrangendo as reparações e consumo de combustível, com motores Diesel robustos e económicos, contribuições e taxas, hoje bastante elevadas, seguros e salários, e a própria amortização do veículo, atinjam pouco mais de metade desse lucro. Se o táxi pertencer ao próprio motorista, e não a um comerciante de mercearia, empreiteiro, funcionário público ou advogado, por exemplo, não terá de contar com o salário ou conta apenas com o salário do motorista do outro turno, caso tenha laboração contínua.
Isto quer dizer que o negócio, que foi muito bom, ainda é bom, sem que haja necessidade de modificar as tarifas. E, se com o aumento de salários o negócio passar a ser menos bom, como se trata de um serviço que não pode deixar de se considerar público, então que os novos encargos sejam suportados pelo empresário, e não por aqueles que se utilizam do serviço.
Atente-se, ainda, que a circunstância de as licenças haverem sido consideradas bens fora do comércio, portanto intransmissíveis, a título gratuito ou oneroso, lhes tirou o valor de transacção e que, sendo as mesmas, no presente e no futuro, atribuídas exclusivamente aos próprios motoristas, ou a cooperativas por eles constituídas, as despesas com os investimentos absorverão uma quota-parte muito menor dos rendimentos.
Ao contrário do que ouvi recentemente em defesa do critério oposto ao adoptado, de aumentar os contingentes, estou certo de que o aumento não provocará a diminuição nos apuros dos veículos actualmente licenciados, pois usou-se de prudência no número das novas licenças, 400, quando havia quem sustentasse que o mercado comportaria um milhar delas. Esse critério de prudência tem ainda a vantagem de permitir novos aumentos, conforme as necessidades da procura, evitando-se, assim, o desequilíbrio da economia dessa espécie de transportes e modificações nas tarifas.
Um artigo publicado há pouco no jornal do Grémio dos Industriais dos Transportes em Automóveis faz surgir novas perspectivas, no que toca às remunerações dos motoristas. Sustenta-se no mesmo artigo, e repare-se que o boletim é o porta-voz da entidade patronal, e não dos trabalhadores, que, a exemplo do que se passa numa grande cidade do espaço português e em outras da Europa e das Américas, os motoristas devem participar dos lucros da exploração.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Essa ideia merece estímulo e oxalá venha a ser considerada no contrato colectivo. Largo passo se daria no sentido da valorização da empresa e do trabalhador e caminho resoluto para a obtenção de uma maior produtividade e realização da paz social.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - As disposições do Decreto n.º 47 328 e do referido despacho normativo de 22 de Novembro, quando bem interpretadas - e os sindicatos passam a dispor de um excelente instrumento de valorização própria e dos seus filiados, se souberem e quiserem dele usar -, conduzem à promoção económica e social dos motoristas.
Na verdade, conceder a quem trabalha a possibilidade de adquirir o instrumento de trabalho, individualmente ou agrupado cooperativamente, por forma a tornar a exploração mais racional e económica, é medida de extraordinário alcance social e integra-se nos princípios doutrinários do Regime que mandam atender à realização do bem comum e à protecção das classe mais desfavorecidas.
Mas há que ir mais longe, isto é, que não sòmente as vagas resultantes dos novos contigentes, mas também todas as existentes dos contingentes anteriores e as que vierem a dar-se no futuro, sejam atribuídas exclusivamente a motoristas profissionais que reunam as qualificações do aludido despacho, e só no caso de o seu número exceder o dos concorrentes é que deverão ser atribuídas a industriais. Não o fazer será caminhar demasiado devagar no sentido mais justo. Não se vê, na verdade, razão para qualquer restrição do direito de obter uma licença no futuro àqueles que se consideram como os titulares mais qualificados para as receberem no presente, tanto mais que a Administração, como sujeito passivo de um direito subjectivamente público, tem na mão a possibilidade de em qualquer altura cancelar as licenças por comportamento (negativo dos titulares.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Uma das inovações introduzidas no regime de licenças de táxi respeita à sua intransmissibilidade. O direito à licença não é negociável, nem se transmite mortis causa, em relação a todas as que forem concedidas posteriormente à entrada em vigor do Decreto n.º 47 329, de 22 de Novembro, do contingente agora fixado, e passados dois anos, às do anterior contingente.
O legislador considera as licenças como títulos pessoais conferidos àqueles que, tendo determinadas qualificações, exercem uma actividade considerada serviço público, e a sua concessão, um tacto gracioso da Administração, sem contrapartida económica por parte dos beneficiários.