15 DE FEVEREIRO DE 1967 1215
Além do mais, num país como o nosso, de reduzidas possibilidades de caça, não só pela afectação da maior parte do território à agricultura, mas também pela indisciplina até agora reinante, em que se não caçava, mas se matava, com um, desenfreado desejo de extermínio, seria ridículo estar a pretender uma remodelação de fundo na lei da caça sem que, em primeiro lugar, se fomentasse o seu desenvolvimento, a sua protecção e o cuidado na sua conservação, tudo o que só através das reservas se poderá conseguir.
Pois é evidente que sem caça não há caçadores e sem proprietários de terra que a mantenham e preservem não haverá caça, o que só por si legitima um direito dos proprietários para que os estimule a guardarem-na como um valor em que também comparticipem e não lhes sugira, pelo contrário, um desejo do seu extermínio pelos danos que a caça e caçadores lhes causam.
A defesa da propriedade, elemento fundamental na que concerne à caca, e que no ordenamento enunciado deveria merecer as minhas primeiras reflexões, de igual modo se mostrou considerado em termos satisfatórios, não só na grande, mas sobretudo na pequena propriedade, a que a base XIII fornece uma larga possibilidade de defesa e que por isso merece o meu inteiro aplauso já que facilmente se reconhece ser realmente difícil na conciliação do exercício dos dois direitos, a mais além do que se foi. No entanto quanto às proibições de caçar numa área de 300 m nos terrenos que circundam as casas de habitação referida na alínea a) da base XIII, eu preconizaria que se definisse com mais precisão qual o centro do raio dos 300 metros que se proíbe a caça, pois todos nós sabemos que grande parte das caças de habitação, situadas dentro de quintas grandes ou pequenas, têm anexos logradouros que as completam, são um seu prolongamento e exigem que a sua função seja pacificamente gozada, sem poder suceder que qualquer, até por curiosidade e sem que realmente vá caçar entre na intimidade de cada um, ou, melhor na zona mais íntima de cada um. O tal direito do povo não pode a tão longe e isto para que não aconteça o que já me sucedeu de ter ido surpreender a cerca de 20 m da minha casa, dentro da minha quinta um pseudocaçador de arma aperrada à espera de que saísse um coelho que, dizia, se metera num buraco de determinado muro.
Julgo, por isso, que seria prudente dilatar talvez um pouco mais o raio dentro do qual se pode caçar junto das casas de habitação, não só para evitar os perigos possíveis como os incómodos daqueles que sobre o direito de caçar têm um indiscutível e mais que respeitável direito de exigirem o sossego e a tranquilidade dos seus lares. De resto, tão perto das casas de habitação não há caça. Há, às vezes, apenas um motivo de curiosidade e também, é verdade, alguns inocentes pombos ou frangos, tantas vezes caídos na nunca satisfeita fúria de dar o gosto ao dedo dos que, em vão, nas regiões muito povoadas procuram sacar o seu desejo do cheiro a pólvora.
Quanto a mim no que sobretudo está influindo no meu espirito ao tratar do problema da caça a base XIII, no pensamento que a informa constitui um ponto essencial no ordenamento de um sistema jurídico que para regular o exercício da caça e defende-la tinha de, necessariamente começar por defender a propriedade que a todos sustenta, inclusivamente aquela que nela se cria e vive.
A protecção da agricultura teria, assim de assumir primordial preocupação e decisivamente influir na legislação especial para que está contribuindo o nosso trabalho.
Os estrénuos defensores da caça como direito natural com todos os direitos de livre apropriação etc., haverão de concordar na insubsistência das razões em que pretendem fazer assentar aqueles seus direitos e em que o seu prazer de caçar a preservação desse objecto do seu brinquedo, não pode, nem deve, contender com o que é produto de suor, de esforços e canseiras. A preservação dos «pássaros» não poderá ir tão longe.
Ainda neste fim-de-semana no Alentejo, ouvi amarguradamente referir a proibição, que se não entende e agora se verifica no concelho de Beja, onde se impediu a caça aos pardais e calhardras, a prejudicarem, como eu próprio o vi e verifiquei, em escala incalculável, as sementeiras do trigo, ervilhas, etc, sem consideração pelos que semeiam e trabalham com outros fins, igualmente ouvindo preconizar, com o que não pude deixar de concordar, que os proprietários das reservas, como alguns o fazem, fossem obrigados a semear gramineas para sustento das espécies que, como muito bem sucede, vêm alimentar-se no que é dos outros e são fonte de receita dos proprietários dos coutos.
Mas dir-se-á e a defesa da caça?
Aos que assim me interrogarem eu responderei que a defesa daquela não cabe porque simultâneamente não proteger a agricultura, no tipo de propriedade que sobretudo tenho em vista. Ela se defenderá, e deve defender-se, através das reservas, através, consequentemente, de uma mais ampla protecção da propriedade contra a desenfreada invasão dos que de posse de uma simples licença fazem não só da caça propriedade sua, mas também dos terrenos onde julgam poder encontrá-la postando-se dos terrenos onde julgam poder encontrá-la postando-se mesmo junto das casas de habitação, onde, junto das próprias medas de lenha, esquadrinham em sua busca insultando tantas vezes os proprietários que os admoestam.
Vozes:- Muito bem!
O Orador:- E, já que falo da defesa da caça, tão considerada no projecto de lei em discussão, pergunto porque se não atentou nos prejuízos provocados pelos cães soltos nas vilas e aldeias cães vadios para quem não existe o defeso e que, viciados na caça, porque a maior parte dos seus donos os não sustenta sem qualquer licença, permanentemente caçam por conta própria e natural instinto de sobrevivência?
Igualmente porque se não estudam e se não combatem os perniciosos efeitos dos muito usados insecticidas nas hortas, pomares, batatais, etc., ao que ouço causa de muitos perdigotos mortos porque comem insectos e bebem aguas infestadas por aqueles?
Julgo serem inteiramente procedentes, quando estamos a pensar na defesa da caça as interrogações feitas pois do modo como se lhes der resposta depende a eficiência daquela. Porém, um dos grandes males da caça está no aturado profissionalismo que se pratica através de autênticos atiradores especializados, que, conhecedores dos pontos que hão-de bater, causam em todas as épocas danos irreparáveis, sem que nada façam para o reprovamento e defesa das espécies. Estou, por isso com o que tem mostrado ser pensamento unânime desta Câmara no sentido de limitar uma actividade que se não mostra merecedora do regime proteccionista que se preconiza da instituição de uma licença com fins lucrativos. O público não sairá prejudicado pois a caça lhe chegará sempre, e talvez mais barata com a ausência da especulação do intermediário profissional, que nada justifica possa fazer profissionalismo com prejuízo de tantos outros interesses.
Com vista a pretendida defesa da caça há que considerar todos estes aspectos, sem esquecer que para aquela também não contribui a projectada permissão de apenas