1408 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 78
Não posso compreender como é possível que sejam descurados, relegados para um plano secundário, problemas, de tanta importância e gravidade, de tanto alcance social, como são os da saúde! Ora a verdade é que não pode haver saúde sem médicos.
Neste momento, por exemplo, para que a malha da cobertura médica da província pudesse apertar-se numa ocupação mais densa, seria necessário que houvesse em Moçambique, pelo menos, mais 300 médicos.
Este aumento no quadro do seu corpo clínico colocaria Moçambique de posse de um efectivo médico correspondente a um índice que a Organização Mundial de Saúde considera o mínimo desejável para territórios subdesenvolvidos 1 médico para 10 000 habitantes.
Ora a província contava em 1965 - e creio que a situação não melhorou entretanto - apenas com 1 médico para 17 235 habitante,
Conseguir que Moçambique venha a ter, pelo menos, 1 médico por 10 000 habitante é uma meta pela qual o Governo deve lutar com a maior energia, tomando as medidas, apropriadas, inscrevendo no Orçamento as verbas necessárias, prospectando nos liceus os alunos que mostrem aptidão para as carreiras médicas, facilitando aos Estudos Gerais Universitários os meios que permitam o alcance deste objectivo.
É evidente que é preciso criar ao exercício da medicina atractivos que levam os indivíduos a escolher a profissão. E até, no caso de Moçambique, que levem os médicos a escolher a província para nela exercerem a sua actividade. Penso, por isso, que a situação dos médicos do quadro dos Serviços de Saúde de Moçambique precisa de ser revista, nomeadamente a dos médicos que exercem as suas funções fora dos centros populacionais mais desenvolvidos, em pontos onde as condições de vida são mais duras. A estes médicos deveria ser pago, consoante as circunstâncias um subsídio de isolamento ou um prémio de permanência na localidade.
Enfermeiros -Se nos voltarmos para a cobertura efectuada pelo pessoal paramédico, a situação, embora um pouco melhor, não só mostra também brilhante. É aflitiva a falta de pessoal de enfermagem, cuja escassez, em situação de agravamento, cria frequentemente problemas que se revestem das consequências mais sérias.
O número de enfermeiros na província -designo por enfermeiros todas, as unidades de enfermagem- era, no referido ano de 1965, de 19.1 por 100 000 habitantes. O de enfermeiras-parteiras, em relação ao número de mulheres na idade sexual fecunda de 15,6. Há um distrito o da Zambézia- onde o número de enfermeiros era apenas do 9,2 e três outros distritos -outra vez o da Zambézia, o de Moçambique e o de Cabo Delgado - que apenas possuíam, respectivamente, 7,8, 7,5 e 8,7 parteiras-enfermeiras para cada 100 000 mulheres na idade sexual fecunda (dos 14 aos 44 anos). É fácil imaginar-se em que circunstâncias precárias nascem milhares de crianças em Moçambique. E os cuidados - ou melhor, a falta completa de cuidados- que essas crianças encontram ao sei em lançadas 1,0 Mundo
Verifica-se que em diminuindo o número de enfermeiros em Moçambique, o que, por si só, patenteia mais um dos aspectos graves do problema da saúde
Em 1963, existiam na província 1401 enfermeiros para 9314 camas, em 1964, 1303 para 11 153 camas, e, em 1965, 1360 enfermeiros para 11 470 camas
Vê-se assim que o número de enfermeiros tem diminuído, enquanto o número de camas hospitalares tem aumentado. Isto significa que cada enfermeiro tem hoje de dividir-se por um maior número de camas o que torna a sua profissão mais árdua e, com certeza, a assistência ao doente menos eficaz Assim, em 1961, cabiam a cada enfermeiro 4,4 camas, em 1962, 5,4, em 1963, 6,5 em 1964, 8, e, em l965, 8,4.
Embora tenha aumentado o número de camas hospitalares o mesmo continua a ser insuficiente em relação á população da província tendo-se em conta que seria satisfatório perto para 400 habitantes e não para 622 como registaram as nossas estatísticas em 1963. Assim para uma população estimada em 7 251 000 habitantes em 1960 a província precisaria de dispor para os seus doentes de 18 128 camas ou seja mais 6638 que as que existiam em 1963.
Esperemos que a constituição de novos estabelecimentos hospitalares apague esta deficiência da nossa cobertura sanitária tanto mais que ela nos coloca em situação de inferioridade perante outros países do continente Africano.
Pelos números expostos nota-se claramente que também no capítulo respeitante ao efectivo de enfermeiros o panorama se agrava de ano para ano numa rapidez que deve causar as maiores preocupações a quem tiver de dirigir serviços de saúde e não disponha de meios para debater situações angustiosas.
Perante o quadro que acabou de exibir-se impõe-se que se ataque o problema no seu centro. Julgo salvo melhor opinião que haveria duas maneiras pelo menos de o atacar facultando um mais largo ensino de enfermagem e remunerando melhor os enfermeiros. É preciso melhorar e facilitar o ensino e atrair candidatos com oferta de um vencimento compensador. Não é o que sucede presentemente.
O ensino do pessoal técnico auxiliar é feito na escola técnica dos Serviços de Saúde que funciona junto do Hospital Central de Miguel Bombarda, em Lourenço Marques. Ministram-se nesta escola com regularidade cursos de enfermagem normal e auxiliar, de enfermeiras-parteiras auxiliares de preparadores de laboratório e de farmácia. Funcionam também por vezes quando as necessidades o exigem cursos de ajudante técnico de radiologia ajudante de radioterapia enfermeiro de saúde pública auxiliar de enfermeiro de saúde microscopista ortopedista e ultimamente cursos complementares de enfermagem.
Penso que estas escolas técnicas dos serviços de saúde considerando o largo alcance que poderiam Ter na formação do pessoal técnico auxiliar de que a província carece deveriam ser mais numerosas. Assim seria dedicada a criação imediata de uma escola junto do hospital central da Bena e, logo que as circunstâncias o permitissem e de uma outra escola junto do hospital central de Nampula.
Não se pense porém que essas escolas terão frequência de alunos ou que a província conseguirá recrutar os 1240 enfermeiros mais que precisaria de Ter neste momento nos seus quadros da saúde - e isto apenas para voltar á proporção de 1961 de 4.4 camas por enfermeiro - bem como os restantes auxiliares técnicos também necessários se os vencimentos a pagar ao pessoal paramédico não tornarem atraente o exercício da profissão.
Recorro ao orçamento da província para respigar alguns números que esclarecem este aspecto da questão.
Vê-se nele que a média anual dos vencimentos pagos a este pessoal em 1965 não chegou a 38 contos por funcionário.
É pouco! É mesmo muito pouco! Não sei que nível técnico e que responsabilidade poderá pedir-se a um profissional - e o enfermeiro é um homem em cujas mãos está muitas vezes a vida do doente - a quem se paga