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1490 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 82

Mas, salvo melhor opinião, as leis não se podem interpretar por um sistema de apostas mútuas.
Conforme resulta da discussão parlamentar inserta no Diário das Sessões de 4 de Fevereiro de 1966, o sentido da expressão «quanto possível» é apenas este «quando o número de vagas declaradas por cada concelho ou sede de concelho seja ímpar, proceder-se-á ao arredondamento»
Ora o principio geral da lei é o do provimento mediante concurso baseado na classificação profissional. Por seu turno, a Lei n º 2129 constitui disposição excepcional em relação àquele princípio genérico, pois que estabelece em favor de uma limitada classe de concorrentes um privilégio baseado no vínculo matrimonial
A interpretação extensiva parece-me condenada, já pelo elemento lógico, já pela indagação histórica da lei fornecida pela discussão parlamentar.
A expressão «quanto possível» empregada pelo legislada deverá portanto ser interpretada restritivamente, o que equivale dizer que o arredondamento deve operar-se por excesso e no sentido da «regra», que é o concurso e não no sentido da «excepção» que é a preferencia dos cônjuges.
6 - No Diário do Governa, 2º serie, do l de Fevereiro de 1967, vem publicado de novo o regulamento dos concursos para provimento das vagas constantes do respectivo anúncio.
Desta feita, porém, a lei dos cônjuges sofre novo abalo sísmico que a faz inclinar como a Torre de Pisa, visto que lhe mexe nos, próprios alicerces.

Diz o n.º 8 do citado «regulamento» do mês de Fevereiro que, por despachos ministeriais de 17 e 18 de Janeiro de 1967, os professores dos quadros de agregados do ensino primário podem beneficiar da preferência da base I da Lei n.º 2129, ainda que não estejam colocados e mesmo que não satisfaçam á exigência (base II da citada lei) de provar que do provimento resulta passar a ser menor a distância entre os locais onde os cônjuges exercem as suas funções».
Salvo melhor e sem dúvida, mais douta opinião, este preceito do regulamento e os despachos que nele se invocam ferem manifestamente não só espírito, mas a própria letra da lei.

Com efeito a Segunda parte da base II estabelece dois requisitos essenciais para que possa ser reconhecida a preferencia quanto ao cônjuge que a invoca para dela beneficiar.
O primeiro requisito é o do exercício das funções docentes claramente definido pela expressão «onde os cônjuges exerçam as suas funções» Portanto quer o que origina a preferencia como o que dela beneficia ambos terão de estar exercendo as respectivas funções á data do enceramento do concurso.
Ao cônjuge que origina a preferencia exige a lei alem do provimento definitivo que tenha mais de um ano de efectivo cívico quanto ao cônjuge preferente ou beneficiário o que beneficia da preferencia não há limite de tempo fixado na lei para a duração do exercício. Basta que tenha entrado em função á data em que requereu o lugar ao abrigo da preferencia.
O segundo requisito essencial é o da aproximação de modo que «resulte passar a ser menor a distancia entre os locais onde os cônjuges exerçam as suas funções».
Este requisito resulta de tal modo evidente numa lei cujo escopo é precisamente o beneficio da unidade do lar através da aproximação dos locais de trabalho onde os cônjuges desempenham funções que não conseguimos vislumbrar em que raciocinamos ínvios se possa basear a argumentação contraria. Se o cônjuge está em casa por não ter colocação a unidade do lar é um facto e a lei dos cônjuges torna-se inaplicável.
É claro que a admitir-se a exclusão destes dois requisitos fundamentais cairíamos no absurdo de situações como estas.
Uma professora agregada terminado o seu curso e devidamente casada com funcionário de provimento definitivo na localidade A pode requerer o lugar vago em A sem Ter de fazer provas de exercício de funções nem da menor distancia. E assim passará a excluir qualquer professor efectivo porventura com largos anos de exercício e que durante eles tenha procurado aproximar-se do cônjuge em sucessivos concursos.
Outro exemplo. Um professor requer um lugar de que não chega a tomar posse mediante apresentação de atestado medico.
Como não está em exercício não carece de prova a menor distancia para concorrer a outro lugar que lhe convém mais.
É evidente que a manter-se a doutrina que resulta dos despachos ministrais invocados no citado anuncio de 1 de Fevereiro ultimo está aberto o caminho a todas as deturpações da Lei n.º 2129 e ela acabará por ruir a próxima investida.
São estas algumas das achegas que entendi dever formular quanto ao modo - a meu modesto ver - menos próprio como está a ser aplicada a Lei n.º 2129.
E termino.
Esta lei é um simples pormenor na vastíssima e cada vez mais complexa maquina do nosso ensino primário oficial. E as duvidas que refer são meias questões de lana caprina que pouco pesam no saldo francamente positivo da «lei dos cônjuges».

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mesmo assim torna-se evidente o embaraço que causam á maquina da Administração e a tal ponto que ao que estou informado - os concursos foram superiormente mandados suspender por 90 dias a fim de se dar andamento ao expediente paralisado pelas tais dúvidas de interpretação.
O facto lança em nós - e, porque não dizê-lo no espirito do publico - uma sombra de dúvida. Quem não pode o menos conseguirá realizar o mais?
Estará o Ministério da Educação Nacional - em cujo sector de ensino primário não faltam funcionários devotados e distintíssimos - apetrechado convenientemente para dar efectiva realização á prometida escolaridade da 5.º e 6.º classes em breve tornada obrigatória nos termos do Decreto-lei n.º 45 810 de 9 de Julho de 1964.
Ou pelo contrario teremos de ficar como em tempos felizmente já remotos pouco além da fronteira das aspirações programáticas que desacompanhadas das realizações concretas constituem um má técnica de governo.
Sr. Presidente e Srs. Deputados. A confiança que depositamos no ilustre titular da pasta da Educação - a que pessoalmente acresço a estima e veneração de seu antigo discípulo alias nunca brilhante . leva-me a antecipar a afirmação convicta de que tal estado de coisas será em breve esclarecido e remediado em termos de não ensombrar mesmo ao de leve a obra de um grande governante.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.