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1530 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 83

de se conseguir por força de nova regulamentação adaptada às circunstâncias e de efectiva fiscalização.
Sr. Presidente: Tomemos um desses bairros, talvez o mais característico em todos os sentidos, desde o histórico ao social, pois suponho até que sobre ele incidirá a experiência-piloto já em execução e cujos estudos não excederão alguns meses.
O Barredo, conforme dizia há pouco um dos padres da Obra da Bua, é um caso parado na consciência social. Esse imobilismo resulta essencialmente do próprio meio, no qual a vida não encontra o mínimo de condições para se desenvolver no sentido de uma autêntica promoção moral e material dos seus habitantes. Se houver a dinâmica suficiente para transformar esse habitat, começando-se pelo descongestionamento populacional, tudo o mais virá por acréscimo. Com o lar condigno a que se referiu o venerando Chefe do Estado virão a saúde, a educação, o trabalho.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Foi o padre Américo - o querido pai Américo! - quem descobriu o Barredo, há mais de vinte anos. Local das suas peregrinações dolorosas junto dos pobres, dos miseráveis, dos doentes, dos abandonados, os seus testemunhos perturbaram muitas consciências e fizeram muito bem!
Colhem-se agora os frutos, e parece que muitos mais se irão colher ao executar-se a obra que a, Câmara do Porto vai empreender.
O Centro Social do Barredo, instituição erguida há poucos anos pela Associação de Cultura e Serviço Social e pelo Secretariado de Acção Social das Conferências de S. Vicente de Paulo, é uma réstea de luz que, alimentada pela dedicação de uns tantos e pela ajuda valiosa dos Ministérios da Saúde e Assistência e das Comunicações, tenta rasgar novos horizontes à sua população, dando-lhe o sentido de uma vida que não conhecia ou de que se considerava afastada.
Acção junto da família, da criança, do jovem, da mãe, na educação, na instrução, no desporto, nos lazeres, na doença, segundo técnicas de serviço social, sem as quais tudo quanto se faça não passa de improvisações, ainda que aquecidas pela chama da caridade, é tarefa constante do grupo de trabalhadores sociais entregues à promoção moral e cívica da população e à denúncia de situações que não estão ao seu alcance remediar.
Obra semelhante está em curso em alguns dos bairros municipais para onde transitaram os habitantes das «ilhas» demolidas, obra criada pelo prelado da Diocese, com a cooperação da Câmara. Houve a compreensão de que não basta construir, erguer novas habitações para quem não saiba nelas viver. Se não se educar, em breve os novos bairros ficarão transformados em «ilhas» verticais e para pouco valerá terem-nos erguido.
E natural que quem não conheça o Barredo não o possa sentir. Mas quem alguma vez nele entrou e pôde descobrir e viver p mistério das boas almas que o habitam, resignadas e confiantes, há-de sentir também a necessidade imperiosa de ver resolvidos os seus problemas e a consciência a doer-lhe se ficar calado.
A verdade só pode ferir os que não queiram conhecer. Ora aqueles que no Governo ou no Município enfrentaram os problemas das famílias que viviam nas «ilhas» e os resolveram e se propõem, da mesma forma, enfrentar e resolver os problemas semelhantes que afligem a população dos velhos bairros insalubres, nunca o poderiam ter feito se não conhecessem a verdade e tão-pouco o mérito da sua obra seria suficientemente exaltado se a houvessem escondido.
O Barredo não é produto do afluxo migratório provocado pelo desenvolvimento industrial, mas antes, juntamente com os aglomerados contínuos das encostas da Sé e de Miragaia, o que resta da velha, cidade muralhada com a fisionomia dos tempos medievais.
Poderia ser um bairro-museu, com aproveitamento turístico, se porventura se houvessem conservado os tipos arquitectónicos característicos das épocas da sua vida secular, pois do seu traçado exterior raros são os edifícios dignos de permanecerem erguidos e só fica o emaranhado de ruas estreitas, vielas e escadas, as quais mal entra o sol e se não diferencia dos velhos aglomerados de qualquer cidade marítima da Europa meridional.
Segundo um inquérito feito na zona propriamente dita do velho bairro, isto é, a uma área de pouco mais de dois hectares, abrangendo quatorze ruas, verificou-se nele a existência de 564 famílias, compostas por 2209 pessoas, o que corresponde a cerca de 1000 habitantes por hectare.
Se atendermos, por exemplo, a que a densidade populacional de Alfama quase atinge o dobro, temos de concluir que a concentração da população no Barredo, muito embora excessiva em relação aos padrões mínimos considerados como satisfatórios - e deve acrescentar-se que a área considerada excede as manchas residenciais, compreendendo todo o espaço do bairro com as suas ruas e edifícios destinados a actividades públicas e comerciais -, não será a única causa do baixo nível sanitário, económico e social dos que nele vivem.
A origem desse baixo nível está, é certo e principalmente, na densidade de ocupação da maior parte dos edifícios destinados a habitação, mas há outras circunstâncias que nele influem e que vão das condições climáticas da orla ribeirinha da cidade, excessivamente húmida, à natureza do trabalho dos seus moradores - predominam os trabalhadores do rio, os carregadores de terra e os de profissões ocasionais, como os vendedores ambulantes -, às ruas estreitas, mal pavimentadas e sujas, aos edifícios sem sol por demasiado altos, sem higiene por lhes faltar a água e as instalações sanitárias, multidivididos para total aproveitamento dos espaços interiores em quartos, corredores, escadas e vãos, até aos regimes legais e jurídicos da habitação.
E sobre estes regimes que quero debruçar-me, pois considero a sua revisão como o primeiro passo para a solução do problema dos velhos bairros da cidade, de características diferentes do das «ilhas», que se resumia, na generalidade, à demolição de casas e à reinstalação dos seus moradores, com a modificação do respectivo habitat através da protecção à saúde física e mental e ao acesso a bens que até então não possuíam.
Ora as características específicas dos aglomerados de milhares de prédios antigos em espaço limitado não comporta, por razões várias, entre as quais avulta a dimensão financeira do empreendimento, uma solução dessa ordem.
Há que encontrar uma outra e entrar nela decididamente.
A cooperação das entidades públicas com competência para intervir nos regimes legais de habitação dominantes rias zonas em questão, apoiada na afectação de um número determinado de novas condições de salubridade e cujo realojamento se torne, por isso, indispensável, está na essência de qualquer solução viável.
Sem essa cooperação e a vontade de enfrentar o problema com o ânimo de o resolver, muito embora as soluções não sejam de momento espectaculares, o Barredo