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14 DE FEVEREIRO DE 1968 2429

bro de 1640. Importa, sim, referir e bem acentuar que foi esse um movimento a favor de Portugal, na sequência de toda a acção que venceu séculos, e logo a partir da independência do Condado Portucalense, para sempre corresponder às imposições de uma individualização fundamentada nas características que apartavam, no concerto geral da Península, a comunidade radicada no Noroeste, de face voltada para o Atlântico.
Por força de carência de toda a ordem, e logo no que tocava a fortaleza de ânimo quanto no que dizia respeito ao mesmo sustento para os corpos, não estavam os Portugueses, em 1580, possuídos de uma capacidade de resistência que impedisse, até, a ambição de Filipe II de Espanha, ainda que só orientada no propósito de conseguir instalar, em toda a Península, uma monarquia dualista. E não resistiram mais do que breves dias e apenas escassos milhares, quando não sómente umas centenas, pois que mais não acorreram a pegar em armas e a dar apoio ao infortunado D. António I, Prior do Grato e rei de Portugal durante um curto e acidentado reinado. A reacção válida veio depois, quando recobrada a força de ânimo e a serenidade. E então nem sequer se admitia a possibilidade de ser mantida a monarquia dualista, com os tronos de Portugal e de Castela separados, porém reservados os dois para um só monarca.
Aquando do início da mesma reacção, intentaram os Castelhanos a unificação que de há muito lhes sorria, bem como ao seu monarca, mas que receavam concretizar. A toda a arremetida logo correspondeu, do nosso lado, um refervilhar de entusiasmo, afervorados muitos dos bons portugueses na pregação do nosso «Evangelho». Bastará referir o que sucedeu, a esse propósito, aquando da visita do duque de Bragança a Évora, em 1635 - visita essa que teve, inequivocamente, uma intenção política, reavivando esperanças e fomentando a congregação de todos os patriotas.
O duque entrou na cidade no dia 9 de Agosto e foi recebido com tais honras que mais parecia tratar-se da visita de um monarca do que de um nobre, embora da sua estirpe. Dessa visita e das festas celebradas em sua honra quero apenas relembrar aqui um episódio.
Pregou na Sé o jesuíta P.e Gaspar Correia. Acabado o sermão, todo ele um panegírico, o pregador voltou-se para o duque e dirigiu-se-lhe deste jeito:
- Espero ver-vos com uma coroa ...
Aqui, o pregador fez uma pausa. Após ela rematou:
- Coroa de graça, coroa de glória!
Mas a intenção da pausa foi bem compreendida pelo povo que se comprimia na Sé. E pouco faltou - diz o cronista do facto - para o duque ser ali mesmo aclamado como rei de Portugal.
Dois anos decorridos, a 21 de Agosto de 1637, a mesma cidade de Évora servia de teatro aos tumultos mais sérios de todos quantos se registaram durante o domínio filipino. Na tarde do dia 22 aparecia afixado um edital assinado por «Manuelinho» e no qual se invocava a Justiça de Deus para os traidores e perseguidores da Pátria. Estes acontecimentos passaram à história com a designação de «Alterações de Évora». Mas - ocorre perguntar -, como foi possível um tal movimento de carácter acentuadamente nacional? Quem o fomentou? Quem o dirigiu?
Causas as mais diversas concorreram para a sua eclosão. Foi importante, sobretudo, a acção desenvolvida pela Companhia de Jesus. Do alto do púlpito, os jesuítas chamavam o povo ao cumprimento dos seus deveres para com a nacionalidade. Por outro lado, procuravam despertar-lho o ardor patriótico, valendo-se da pena. O. que tornou possível, portanto, as alterações de. Évora foi o ambiente de há muito preparado.
Os tumultos de Évora tiveram repercussão em todo o Reino. Quem o afirma é o próprio Filipe IV. Segundo uma carta sua, ainda inédita, registaram-se também «alvoroços no Algarve, alguns arruídos no Porto e em Santarém e alguma coisa em Viana». A reacção, da parte de Castela, foi violenta. Todavia, importa registar que a nobreza sé houve com galhardia, batendo-se por esta concessão: que os negócios dos Portugueses fossem resolvidos pelos Portugueses.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Após as Alterações de Évora, foram chamados a Madrid, sob o pretexto de Filipe IV os querer ouvir acerca do estado do Reino, alguns religiosos agostinhos, dominicanos e jesuítas e os arcebispos de Braga, Évora o Lisboa, além dos representantes da nobreza. Em boa verdade, a causa da viagem era outra. Segundo Vivanco, cronista da época, o monarca pretendia mas ura repreendê-los:

Os nobres, por não se terem oposto totalmente à plebe, tomando contra ela as armas para reprimir a rebelião; e os religiosos, porque, em lugar de predicar o Evangelho, repreender os vícios e refrear os povos, os concitavam a maiores rumores e levantamentos. Eu mesmo [refere ainda, o cronista] ouvi ao primeiro-ministro queixar-se dos frades daquele Reino.
Entretanto, os clamores redobraram em todo o Reino. As violências de Castela, longe de intimidarem o povo, mais o animavam à revolta. Sucediam-se os papéis clandestinos. Um deles era ao jeito de petição dirigida a Jesus Cristo pela cidade de Lisboa, que se via em grave aperto, pois «estava reduzida a tão infeliz estado de miséria que lhe não faltava mais do que rebentar com desesperação». E que pedia Lisboa? Que Deus ressuscitasse o seu «marido», morto nos areais de Alcácer-Quibir. Pedia um rei natural!
Por seu lado, os conspiradores lançaram-se abertamente na preparação do movimento. No ano seguinte de 1638, chegou a Lisboa, em Novembro, D. Duarte de Bragança, irmão do duque. Procurou-o D. António de Mascarenhas e deu-lhe conta das calamidades que assolavam o Reino, lembrando-lhe de caminho que o seu «valor devia empenhar-se em conseguir a liberdade da Pátria e restituir ao duque, seu irmão, o ceptro, que por tantos títulos lhe era duvido». Acrescentou ainda que u fidalguia estava descontente e já disposta a sacudir, como havia deliberado, o jugo de Castela.
Não escondia o povo qual era o seu desejo - e bem o denotava de toda a vez que podia dizer do seu descontentamento. O clero, longe de se alhear, antes concorria, decisivamente, para que a onda de insubmissão alastrasse, vindo a dominar Portugal inteiro de aquém e de além-mar. Do ânimo da nobreza ficou testemunho insuspeito nos textos contemporâneos. Unidos, queriam os três braços tradicionais do Reino que fosse restituído o trono português ao seu rei legítimo. Para tanto, reconquistaram a nossa independência e souberam consolidá-la, mantendo aquela luta que durou vinte anos e que findou há três séculos.
Repito palavras de há pouco: não será preciso dizer que a Restauração foi um movimento dirigido contra Castela. Importa, sim, dizer que foi um movimento a favor de Portugal.
Há três séculos, porque soubemos colocar no mesmo plano, sem manobras de estranhos, os interesses de Castela e Portugal, lográmos conquistar a paz da Pe-