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17 DE JANEIRO DE 1969 2955

Tem a palavra a Sr.ª Deputada D. Custódia Lopes.

A Sr.ª D. Custódia Lopes: - Sr. Presidente: No desempenho do honroso mandato que me foi conferido, tenho-me ocupado, particularmente, dos problemas de educação, que considero dos mais importantes e prementes de entre os que contribuem para o progresso e desenvolvimento da Nação.

Não raras vezes me tenho referido ao aspecto do ensino que constitui o tema, que o ilustre Deputado Manuel Nazaré entendeu, e bem, dada a sua incontestável importância, trazer à consideração da Câmara em aviso prévio intitulado "Expansão da língua portuguesa em Moçambique".

É, pois, com grande interesse que nele participo, já por dever da própria função que desempenho de professora de Português num dos liceus da província de Moçambique, e que me dá alguma experiência, já pelo anseio que tenho de que ele possa resolver-se amplamente, não só para o progresso comum dos seus povos, mas também para a perenidade da cultura portuguesa nessa província.

Tenho seguido de perto e atentamente a evolução do problema, e estou perfeitamente de acordo com o ilustre Deputado avisante "na necessidade que há de se incrementar a difusão da língua portuguesa em Moçambique". O que a língua portuguesa representa como elo de união para esta província tão diversificada em raças, línguas e culturas está na consciência de todos os bons portugueses e até mesmo na dos nossos inimigos, que procuram aprende-la e ensiná-la para assim poderem, mais facilmente, unir africanos portugueses do diferentes origens na política adversa ao nosso país. Importa, sim, que se ensine a língua portuguesa, mas, sobretudo, que se faça de cada nativo, por via dela, um bom português.

Tal como o ilustre Deputado avisante, também tenho como princípio que sejamos nós a expor e a discutir os nossos problemas para que possamos resolvê-los. Assim, tenho procurado dar o meu modesto contributo, nas intervenções que tenho feito nesta Câmara, trazendo ao seu conhecimento os problemas que se me afiguram de real importância para a província que nela represento, apontando o que se tem feito e o que se não tem feito, para, com objectividade e espírito de justiça, aplaudir ou criticar construtivamente, e até, por vezes, apontar soluções que me parecem pertinentes.

É o que vou fazer, mais uma vez, nas descoloridas considerações sobre o tema em debate.

Quanto "a críticas, por vezes, deturpadas, feitas pelos organismos internacionais sobre os nossos assuntos, e que procuramos rebater com argumentos que nunca os chegam a satisfazer", como diz o ilustre Deputado avisante na sua intervenção, julgo, no entanto, pela experiência que me vem da minha missão na O. N. U., que importa sempre esclarecer, mesmo que a verdade não seja aceite por aqueles a quem ela não convém, por intuitos políticos.

Penso até que algumas vezes temos pecado por não termos trazido ao conhecimento público nacional e internacional, de uma maneira mais extensa e esclarecedora, as realizações empreendidas nas diversas actividades do ultramar, sujeitando-nos a críticas, que resultam, quantas vezes, da ignorância dos factos.

É, porém, incontestável que tem havido sempre relações humanitárias e fraternas entre os povos de diversas raças e línguas que habitam o nosso ultramar, com respeito pelas várias culturas e religiões.

O contacto humano, ou seja, a convivência, foi desde o passado, e continua a ser no presente, o primeiro passo a vencer a barreira das línguas. A língua portuguesa, franca, estruturada, portadora de uma cultura ocidental, vai assim, a pouco e pouco, difundindo-se, unindo povos de pluralidade linguística, ao mesmo tempo que, por sua vez, se enriquece ao contacto com outros falares e culturas diversas.

Uma das razões da pouca difusão da língua portuguesa entre os nativos de Moçambique foi, durante largo tempo, o escasso contacto com o português europeu, nas terras do interior desta província, contrariamente ao que sucedeu cm Angola, onde a penetração e a fixação deste, nas zonas rurais, se fez muito mais intensamente.

O esforço que fui preciso realizar cm escolas c missões católicas, através de toda a província de Moçambique, foi, sem dúvida, ingente, sobretudo numa época em que as vias e meios de comunicação eram, nesta província, escassíssimos.

A difusão da língua portuguesa limitou-se, durante muito tempo, ao ensino nas escolas primárias das cidades e, no meio rural, às missões católicas, que estavam longe de poder satisfazer a grande massa de crianças por educar.

Pode dizer-se que foi. verdadeiramente, no último decénio que na província se deu o surto de desenvolvimento educacional que culminou, no seu mais alto grau, com a criação da Universidade de Lourenço Marques, hoje com uma frequência de cerca de mil alunos.

Perdoar-me-ão VV. Ex.ªs que, no decorrer das minhas considerações, me reporte a algumas das afirmações aqui já proferidas por mim em intervenções anteriores.

Quando em Março de 1962 me ocupei, nesta Câmara, do ensino primário em Moçambique, referi-me à necessidade de se intensificar o seu desenvolvimento com o aumento de escolas que acudissem ao número crescente de crianças em idade escolar e também à necessidade de um vasto plano de educação popular que abrangesse a quantidade enorme de habitantes analfabetos e desconhecedores da nossa língua que se estendem por toda a vasta província.

A esse respeito disse então, entre outras coisas:

O ensino adquire um papel primordial no desenvolvimento e progresso das massas populacionais do ultramar. Não serão de mais quantas escolas se criem através da extensa província de Moçambique, com o fim de levar às populações de variadas etnias que aí habitam o conhecimento da língua nacional, não só veículo indispensável para a aquisição e transmissão de conhecimentos, mas também meio útil para que os diferentes grupos se entendam entre si e melhor se compreendam.

O ensino será, sobretudo, a base em que há-de assentar todo o plano de desenvolvimento económico-social da população da província. Na verdade, o desenvolvimento económico e social nas regiões rurais, pela introdução de novas técnicas, educação sanitária e aquisição de hábitos de civilização pelas populações menos evoluídas, far-se-á com dificuldade e muito lentamente se não lhes dermos os conhecimentos elementares, através da língua pátria, quer falada, quer escrita. Este será o recurso pelo qual essas populações se hão-de valorizar, adquirindo os conhecimentos universais e espirituais que dignificam o homem.

E acrescentei:

Parece-me, por isso, que se deve pensar seriamente no problema da educação das massas populacionais de Moçambique, numa larga campanha de difusão da, língua portuguesa e de alfabetização das massas populares, sejam elas crianças ou adultos.