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5 DE FEVEREIRO DE 1969 3087

saber português até ao heroísmo estóico de copiar, à pena, todo o encorpado volume do Curso Prático de José Portugal! ...

Não será preciso tanto. Mas faça-se alguma coisa. Aqui muita matéria se oferece às inspecções escolares, à Junta Nacional da Educação, no Gabinete de Estudos e Planeamento da Acção Educativa do Ministério da Educação Nacional.

Sobre o precioso adminículo que do intercâmbio cultural entre nós e o Brasil poderia advir para a defesa do idioma comum nada direi, confiado no saber e na experiência dos ilustres colegas que me precederam e dos que hão-de seguir-se na discussão deste aviso a que renovo a minha adesão.

E vou terminar, Sr. Presidente, recordando a atitude simbólica, mas eloquente, com que esta Assembleia quis, em Fevereiro de 1944, solenizar a sua aprovação à proposta de lei de ratificação da Convenção Ortográfica Luso-Brasileira, celebrada em 29 de Dezembro de 1943.

A atitude que pretendo recordar foi sugerida pelo Deputado Juvenal de Araújo nestes termos:

Sr. Presidente: Atenta a transcendente importância do diploma que acaba de discutir-se, e ainda numa especial homenagem à nação irmã, que estará certamente no ânimo de toda a Câmara, eu oferecia à ponderação de V. Ex.ª a sugestão de que se fizesse de pé a votação desta proposta de lei.

A sugestão ou o pedido foi deferido. E toda a assembleia legislativa da nação se pôs em pé em atitude de respeito pela madre língua lusitana, em afirmação inequívoca de fé na sua perenidade e de determinação na sua defesa.
Hoje, Sr. Presidente, não pedirei a V. Ex.ª para que esta Assembleia se ponha em pé. Hoje é à própria nação, a todo o povo lusíada que eu me dirijo, para lhe dizer do alto desta tribuna da lei: Arraial, Portugal! De pé! Arraial! Pela madre língua lusitana! ...

Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Peres Claro: - Sr. Presidente: Subo a esta tribuna, a tomar parte no debate suscitado pelo aviso prévio apresentado pêlos Srs. Deputados Elísio Pimenta e José Alberto de Carvalho, em perfeita coerência com a posição que nesta Câmara tomei, frente ao problema da defesa 3 expansão da língua portuguesa, em intervenções de 1961 e de 1967. Faço-o também em coerência ainda com a minha situação de professor de Português, farto mas não cansado de apregoar e de ouvir apregoar a necessidade de um ensino, sobretudo mais extenso, da matéria, para que possa assim a escola combater melhor os desregramentos da linguagem escrita e falada. Fá-lo-ia sem qualquer dessas razões e apenas pelo dever a que me julgo obrigado de dar a minha ajuda a solução de um problema de tanta importância como é este da salvaguarda do património nacional.

Sr. Presidente: Se há dons que o homem tenha adquirido por força da inteligência que Deus lhe deu, este de poder exprimir por sons ordenados aquilo que pensa ou aquilo que quer é dos mais maravilhosos. Sentir uma dor ou uma alegria e conseguir, não apenas pelo instintivo grito animal, mas por deliberada melopeia rítmica, transmiti-las aos outros, fazendo-os comungar na mesma sensação; sentir torcer-se o íntimo numa revolta ou dilatar-se na aceitação de um princípio e poder definir, sem a expressividade do gesto, o movimento da inteligência; sentir nascer em nós, nos recessos da alma, o ódio ou amor e conseguir com a aspereza ou a maviosidade dos sons fazer compreender a alguém que o- odiamos ou que o amamos; querer estar aqui no deleite da conversa e fazê-la brincando com as palavras, que são sons ordenados na preocupação de frases bonitas, que são conjuntos ritmados, como agora faço; que grande e maravilhosa coisa é, que maravilhoso e grande instrumento que o homem soube criar e sabe usar para mútuo entendimento eu geral desentendimento!

Sr. Presidente: Quando em 30 de Novembro de 1967 V. Ex.ª permitiu que uma vez mais a minha voz se ouvisse nesta Câmara, assim comecei o que então entendi dever dizer:

Sr. Presidente: Vou falar hoje da língua portuguesa, sobre a qual talvez devesse trazer aqui, para floreado início do meu discurso, quantos ditirambos lhe têm dedicado ao longo de séculos. Talvez pudesse acrescentar sem escândalo, de tal forma tais afirmações nos deleitam, que a língua portuguesa é a mais branda e suave do Mundo, a que melhor exprime os sentimentos recatados do homem, n mais capaz de ser segredada a ouvidos íntimos. Era- uma frase bonita, talvez ficasse em antologias, mas não tinha adiantado nada u defesa e salvaguarda desse património inestimável e imprescindível que é a língua de um povo.

O que eu então quis dizer, com o pudor das grandes frases, é que a língua portuguesa não é melhor nem pior do que as outras, nem precisa para valer que a ataviemos de adjectivos que às vezes, nem por sinestesia vocabular, se compreendem a ela aplicados. A língua portuguesa é apenas, como verdade "la palaciana", a língua que os Portugueses falam. Daqui parti, como hoje parto, para levantar o grave problema do desaportuguesamento da gente portuguesa em terras estranhas ou em terra própria, por esquecimento ou abastardamento do linguajar lusitano.

Quando se ouve um locutor da rádio ou da televisão cometer um lapso de linguagem (como em bom português apetece dizer: dar calinada!) muita gente se abespinha pelo dislate, dizendo que parece, impossível que homens contratados para falar em largo público induzam o público nos erros que cometem. O que verdadeira e inconscientemente existe por detrás da afirmação que refiro aqui apenas como exemplo, e não como crítica, porque erros semelhantes também eu cometo, é o sentido profundo da necessidade de manter sempre pura e de transmitir sempre escorreita a língua que se fala.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nem outra coisa se exige a um professor quando fala com os alunos, seja ele, embora, especialista em matéria não linguística. Nem outro atractivo tem quem expõe com facilidade, arrebatando não tanto pelas ideias como pela fluência. Fala muito bem, diz o povo, mesmo que não perceba o arrazoado, desde que o orador despregue as frases uma após outra e a linguagem brote como a água das fontes, farta e de contínuo. Em todos, seja a camada social qual for, menos a dos snobs, onde propositadamente se fala mal, reside a certeza, em muitos inconsciente embora, de que a língua é coisa que cumpre manter e defender. E mesmo os snobs, pretendendo marcar personalidade pela forma estranha de falar, corroboram o que afirmei, pois verdadeiramente as pessoas se diferenciam quando a língua que falam não é a mesma.