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17 DE JUNHO DE 1971 2051

O Orador: - Indissociàvelmeute ligado o Estado liberal às fórmulas económicas do capitalismo, as grandes crises deste suo as primeiras a chamar a intervenção do Estado na sociedade, cujos problemas começa a tomar a seu cargo. Desenvolve-se, simultaneamente, a necessidade de uma maior justiça social e é já ao Estado interventor que se exige também a segurança social e o acesso aos bens da cultura, para progressiva realização da igualdade que a sociedade civil .fora, por si, incapaz de proporcionar.
Dilui-se a separação entre a sociedade e o Estado, galga este a distância que o liberalismo prudentemente entre eles mantinha, e o político abeira-se da sociedade civil, toma nas mãos os seus problemas, cuida solícito da sua organização, torna-se sen mentor e dispenseiro dos bens indispensáveis à vida moderna.
Eis o Estado social, fruto das novas relações entre a sociedade e o poder político, em que aquela se entrega a este. e ele Qualquer estado moderno é inevitàvelmente um Estado social, pois a nenhum poder politicamente organizado é hoje possível deixar de conformar-se com as realidades sociais e tomar a seu cargo a satisfação das necessidades colectivas.
Mas na integração da sociedade e do poder político gera-se uma inevitável tendência de domínio e de absorção.
Quando ele domina todos os campos do humano, sempre em nome de uma classe, de uma raça, de um desígnio nacional, pois o totalitarismo é de nobres ideais, temos a absorção da sociedade pelo Estado. O Estado totalitário é um Estado social que absorve toda a sociedade.
Mas o domínio inverso também é possível, e está difundindo-se em nossos dias.
O desenvolvimento do económico e a aplicação crescente da técnica a todos os ramos geram a obsessão da eficiência.
A sociedade tende a impor as suas técnicas privadas ao próprio poder político e o Estado é encarado como uma, grande empresa confiada aos tecnocratas em ordem à obtenção da maior eficiência possível.
O poder despolitiza-se, a sua legitimidade é aferida pela eficácia da sua acção, e as próprias leis não são mais do que grandes ordens de serviço: é o reino dos tecnocratas. em que a sociedade domina o Estado.
Numa ou noutra das hipóteses assim esquematicamente esboçadas, o homem, que no Estado liberal estava abandonado à sua própria liberdade, está agora absorvido no sistema que dela nada lhe deixa.
Formado, orientado, determinado até ao seu íntimo pelo Estado totalitário, não lhe resta senão colaborar no grandioso projecto que lhe é imposto como seu supremo bem; nada há fora do Estado, a pessoa desapareceu, resta o colaborador.
Menos violento, menos desagradável, mas não menos pesado é o domínio da sociedade tecnocrática, que toma a seu cargo o homem e lhe dá conforto, bem-estar e segurança; que tanto empenho põe na satisfação das suas necessidades, que constantemente lhas multiplica para mais generosa ser para mais farto o ter.
Os técnicos solícitos organizam a vida do trabalho, planificam a família, fornecem segurança, aplicam os tempos livres, libertam da liberdade.
Com a condição de que o homem lhes não estrague a eficiência sumo bem de uma sociedade da abundância; a pessoa aniquilou-se, resta o consumidor. Mas é indispensável que ele não ponha em causa as estruturas, não se aperceba sequer de que é uma peça necessária ao aumento do lucro, através do incremento da produção.
A diferença está na ideologia, mas não só nela. O Estado totalitário domina o homem, priva-o de liberdade, e como contrapartida oferece-lhe à inteligência a grandeza de um futuro, de um domínio rácico, de um mito histórico. Pode ser grandioso, mas é magro.
A compensação da sociedade tecnocrática é bastante mais palpável, pois vai ao encontro do instinto de bem-estar e de prazer. Mas, numa ou noutra hipótese, a pessoa ficou liberta da sua própria liberdade.
Em si mesma, a relação Estado-sociedade, traduzida na expressão Estado social, é vazia de conteúdo ético: a muito se presta e pela dinâmica das forças em presença tenderá para uma das formas apontadas de domínio do político ou do social.
Por isso hoje reaparece como essencial o núcleo das liberdades fundamentais e o relevo do papel da Constituição como principal garantia do Estado de direito.
A liberdade de todos não é já o limite da liberdade de cada, um, pois a questão se não põe entre os indivíduos; e os próprios direitos fundamentais ganharam conteúdo.
A liberdade de cada um aparece agora como limite intransponível ao poder do Estado social ou da sociedade tecnocrática, como sinal último de humanidade inalienada.
O Estado será um Estado de direito não apenas se agir dentro da legalidade, o que pouco interessa, pois é ele que a cria, mais dentro da legitimidade resultante do respeito dos direitos da pessoa, ser que o homem a si próprio se dá no seu viver inteligente e livre.
Estado de direito é Estado de legitimidade e de justiça, de conformidade com os direitos naturais da pessoa, e não de legalidade apenas.
A sua forma e realização pode ser diferente, consoante a concepção liberal ou social do exercício do poder político, mas sempre o Estado se haverá de conformar com os direitas fundamentais, se quer manter-se na esfera do lícito.
O Estado está ao serviço da pessoa, ou seja das liberdades em relação; não do indivíduo desincarnado e arvorado em valor absoluto, mas do ser que o homem a si próprio se vai dando no viver em relação com os outros.
Supondo vida humana e relações sociais entre pessoas, o Estado não existe sem liberdade, embora eventualmente actuando contra ela. A sua função é transformar a liberdade metafísica em liberdade jurídica e em liberdade política. Mas essa transformação não esgota a liberdade da pessoa, que existe antes do Estado e para além dele, e que exige sempre a limitação do poder político, constituindo ela mesma o essencial e decisivo limite.
E o bem comum? O bem comum é aquele que respeita ao conjunto das pessoas em relação, ou seja aquilo que a todas é indispensável assegurar para que dada pessoa possa realizar-se na liberdade.
Não há, pois, um bem comum que possa, legitimar a supressão da liberdade da pessoa: o bem de todos está em que cada um, sem excepção, possa realizar-se na liberdade do ser, sem o qual não há homem.
E o nosso destino passado e futuro?
Não há Portugal sem portugueses: toda a nossa história é de homens e não de pedras, sejam elas de catedrais ou de palácios. Todo o sentido da nossa marcha histórica, desde a Reconquista aos Descobrimentos, desde a Restauração à República, é a busca de uma melhor realização para os Portugueses. São eles, os do passado e os do