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23 DE JUNHO DE 1971 2143

Tenho dedicado a este problema uma reflexão atenta e uma meditação séria. E de cada vez que me debruço sobre as suas coordenadas mais prisioneiro me sinto dos argumentos expendidos nesta Sala, há doze anos, pelo Dr. José Hermano Saraiva, de uma forma insuperável e numa oração que manteve esta Câmara suspensa durante cercai de duas horas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para não alargar esta exposição, permito-me remeter quem esteja interessado neste tema para essa peça notável que consta do Diário das Sessões da época e está publicada em opúsculo.
Reli, agora, essa primorosa análise crítica ao sufrágio directo, e comungo da conclusão do seu ilustre autor: a eleição do Chefe do Estado deve ser feita por sufrágio universal, mas na forma de sufrágio indirecto.
As razões de teoria política alinhadas contra o sistema acrescem os inconvenientes de ordem prática que o sufrágio directo para a eleição do Chefe do Estado tem desencadeado entre nós.
A experiência de 1938 foi bem elucidativa, já que tudo se processou em termos de competição, que, como é próprio da nossa psicologia, geraram uma carga emocional que espalhou por toda a parte um sopro de agitação, de sobressalto e um clima de paixão perfeitamente incompatíveis com a formação de um voto sereno e esclarecido.

O Sr. Pinho Brandão: - Muito bem!

O Orador: - Ora, sendo o Chefe do Estado o símbolo da unidade nacional por excelência, não pode o processo de eleição transformar-se, mercê de excessos sentimentais, numa fonte de divisões, sobrecarregada, ainda, com o risco da sua perigosa projecção nos territórios ultramarinos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nesta fase da vida portuguesa - de guerra nas fronteiras e de batalha em todos os sectores- a oportunidade, como já foi salientado nesta Câmara, é, também, um valor político a atender e cujas leis se não podem ignorar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Deste modo, não concordo com o sistema de eleição constante do artigo 72.º da Constituição e não considero oportuno, no momento actual, .o regresso ao sufrágio directo para a eleição do Presidente da República.
Sr. Presidente: Se eu não fosse adepto da liberdade dos Deputados na apresentação de projectos, aproveitaria a ocasião para aplaudir o preâmbulo proposto no projecto do Sr. Deputado Duarte Amaral e de outros Srs. Deputados.
Realmente, no oceano de dificuldades que cerca o munido português faltava ainda a questão religiosa.
Profundamente crente, embora afastado da organização da Igreja, já em 1959 mie pronunciei contra um projecto de conteúdo semelhante, da autoria do então ilustre Deputado Dr. Carlos Moreira.
Por esse motivo, sofri alguns dissabores e só não fui «cristãmente» torturado e remetido ao chamado Tribunal do Santo Ofício por certos padres pré-conciliares (risos) porque os tempos são outros e

O Sr. Pinho Brandão: - Muito bem!

O Orador: - Mas não é uma razão puramente pessoal que me leva, agora, a confirmar a atitude que adoptei em 1959. São mais fartes os motivos que a inspiram.
Entendo que o estatuto constitucional se dirige a toda a Nação e tem de abraçar, nos princípios e directrizes que consagra, populações de diferentes credos religiosos e até (pessoas que item e direito de não acreditar em qualquer religião. Os que não têm crenças religiosas também fazem parte da Nação.
De resto, certamente por ignorar a teologia e as suas subtilezas, ainda não consegui compreender a que religião pertence o Deus que o preâmbulo pretende invocar. A todas?
A uma, para se criar por esse ultramar fora, uma espécie de colonialismo religioso?
Confesso ser-me difícil vencer as objecções que se levantam aio meu espírito.
A propósito do preâmbulo, recebi uma carta da ilustre senhora que é a viúva do Dr. Leonardo Coimbra.
Quis o destino que fosse companheiro de hotel, aqui em Lisboa, daquele nosso malogrado colega. Pude, assim, em estreito convívio, medir-lhe a personalidade e apreciar a sua maneira de ser. Os contrastes que nos separavam faziam-me admirá-lo tanto que, por vezes, durante as nossas conversas, não me era possível ocultar um sorriso: de um lado, o frágil pecador que eu sou; do outro, uma alma de apóstolo, a roçar as estrelas e a tocar a santidade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - No decurso dos .nossos encontros abordámos o tema deste projecto e nunca lhe escondi o meu pensamento, que, aliás, o Dr. Leonardo Coimbra, delicadamente, respeitou e nunca pretendeu contraditar.
A melhor homenagem que posso render à sua memória é, pois, votar com sinceridade, coerente com o meu raciocínio, e não descair, por mera piedade, num voto infectado de hipocrisia.
Direi, ainda, com referencia aos artigos 45.º e 46.º da Constituição, que adiro ao projecto do Sr. Deputado Sá Carneiro, perfilhando uma liberdade religiosa autêntica, com respeito e igualdade de direitos e posições para todos, absolutamente todos, os credos religiosos.
Resta, finalmente, referir o alargamento da competência reservada a esta Assembleia e o estabelecimento da base para o regime de equiparação entre Brasileiros e Portugueses que a proposta do Governo submete a nossa atenção e decisão.
O primeiro aspecto não suscita reparos e o segundo desperta um aplauso geral que dispensa quaisquer palavras, tão encharcado de retórica está o tema e a própria comunidade luso-brasileira.
Sr. Presidente: Vivendo, mercê da profissão, em contacto diário com as leis, conheço bem o valor relativo das fórmulas abstractas se TI ao forem vivificadas por um verdadeiro espírito de lealdade e um desejo sério de as cumprir por parte de quem as utiliza e tem o dever de as impor.
Os comandos normativos costumam, precisamente, morrer por falta de execução.
Nunca neste país deixou de se encarar qualquer problema ou anseio por falta de leis, e muito ficou por fazer e decidir apesar da abundância da legislação.