30 DE JUNHO DE 1971 2279
jogo, impondo compromissos que se traduzem em abdicações, .e o terrorismo interno passou a ser instrumento que se utiliza, comandado de fora e algumas vezes tolerado por dentro. Os grupos afastados do poder rejubilam por facciosismo com os insucessos dos que governam e para eles contribuem activamente. As objurgatórias das oposições em nome das aspirações comuns são apenas expressão farisaica da luta.
Este quadro é a lamentável realidade presente de alguns países (o respeito pelas dificuldades alheias impede-me de apontar-lhes os nomes) e fico a pensar qual o significado que, afinal, tem ali a independência e a liberdade individuais -independência e liberdade de todos - e, sobretudo, como pode ali servir-se politicamente a nação e a sociedade.
Servir foi sempre construir, e ainda mais nos dias de hoje, em que as exigências e as necessidades se multiplicam ao ritmo de conquistas técnicas que rapidamente tornam obsoleto o que ainda há pouco era expressão avançada da criação humana. E construir é sobretudo realizar, e são as gerações que sabem fazê-lo as que deixam na História marca positiva da sua passagem. A dedicação apaixonada pela tarefa aliciante de fazermos do todo português uma grande nação é entre nós o imenso desafio que está no coração de todos. E por isso que se espera nos campos e nos sertões, nas aldeias e nas cidades de todo o nosso território. E nessa expectativa que reside a tremenda responsabilidade que recai sobre a nossa geração e é nela que poderemos encontrar a realização de todos os impulsos generosos. Haverá neste plano muito a exigir e pouco tempo a perder. Todos quantos puderem deixar iluminar-se por este ideal que é o verdadeiro anseio das populações portuguesas serão poucos para realizá-lo.
Sr. Presidente: Vamos brevemente votar as alterações constitucionais. Sob as preocupações que procurei aqui reproduzir, votarei segundo a lista da proposta do Governo, ponderando as doutas sugestões da comissão eventual da Assembleia.
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hesitei muito em subir a esta tribuna para intervir neste debate.
Não tendo acompanhado os trabalhos da comissão eventual, para que também fora designado, para além do artigo 101.º, não se me tendo nunca oferecido dúvidas sobre a inteira justeza, perfeito equilíbrio e plena oportunidade da proposta do Governo, sem prejuízo de pequenas alterações de forma ou de expressão, não tendo intervindo também, senão episodicamente, na discussão da revisão constitucional de 1959, tudo me aconselhava a dispensar a Câmara, certamente já cansada desta maratona constitucional, de ter de ouvir mais um discurso e a remeter-me ao prazer de ouvir gritos de ansiedade, estados de alma de intranquilidade, expressões de sabedoria política, apelos «à compreensão das realidades sociais e ultramarinas, exposições de teoria e doutrina políticas ...
Não havia dúvidas para ninguém sobre o meu modo de ver nem sequer sobre a minha atitude ou a orientação que sempre preconizei.
Tudo isto era bastante para que me silenciasse, continuando a preocupar-me com os problemas de que me tenho ocupado - a grave conjuntura agrícola e a trágica situação das regiões interiores -, até porque tenho boas razões para supor, sem prejuízo de alta importância adiantarei até da histórica importância dos debates constitucionais em decurso, me a generalidade dos Portugueses mais preocupada continuará com as questões concretas e específicas de que depende o seu viver diário e concretizam os grandes problemas nacionais - a defesa do ultramar, o desenvolvimento económico-social de todas as parcelas e regiões, a emigração, a persistência da ordem e tranquilidade públicas ...
Se em dado momento assim não acontecer ou pareça não acontecer, a virtude ou o defeito dessa sensibilidade nacional será mais o reflexo e a consequência dos debates desta Assembleia do que motivo de preocupação surgida nas inteligências ou nas consciências do comum dos portugueses ...
Tudo me aconselhava, pois, a permanecer como elemento da maioria silenciosa: interessada, participante, mias silenciosa ...
Todavia, decidi-me a subir a esta tribuna para que o País não julgasse ou interpretasse mal o silêncio de quem não será tido por conformista nem cómodo, já que o rodar dos anos lhe não quebrou a irreverência e o fluir da vida lhe não limitou a independência.
Mas não só por isso, também porque se me afigurou conveniente tentar reduzir pontos de crise, procurar encontros nas divergências, extrair algumas lições e formular um apelo. Lamento apenas que me tenha faltado o tempo para ser
breve ...
Srs. Deputados: Nesta minha posição de ouvinte atento e interessado parece-me surpreender que depois de duas semanas de debates, que verdadeiramente foram três de sessões, para além da grande maioria da Câmara, aqui como em toda a parte, sedimentando a sua opinião por considerações de senso comum, sabedoria política e realismo social, há duas correntes de preocupações: uma de verdadeira ansiedade, que chega a roçar a angústia, no sentido do reforço dos direitos, garantias e liberdades dos cidadãos, outra de profundo receio, que chega a tocar as raias da emoção, por mor das inovações .propostas relativamente ao ultramar.
No meio de tudo isto, o centro de atenção que tem constituído a querela doutrinária sobre o sistema de eleição do Chefe do Estado mais pareceria uma manobra de diversão da maioria silenciosa se não tivesse sido suscitada, e sucessivamente renovada, por iniciativa dos que mais se preocupam com a definição constitucional da defesa dos direitos, garantias e liberdades dos cidadãos.
Por sobre tudo isto, ou talvez por detrás de tudo isto, parece-me surpreender também uma outra questão ou querela, a que opõe quantos pretendem a evolução com sacrifícios ou negação mesmo dais exigências da continuidade aqueles que decididamente optam pela continuidade com desconfiança ou repúdio, até por tudo que possa ter sinal de evolução ou de renovação. Entre os extremos haverá, certamente, cambiantes nas expressões e atitudes, que, todavia, serão sempre - menores no estado dei espírito com que se encaram a estiai luz os (problemas, as decisões, as orientações.
É precisamente sobre estas questões que pretendo deixar alguns comentários, fazer determinadas apreciações.
Antes, acentuarei que, como já disse - e cuido - que sem causar surpresa ... -, nunca tive duvidas sobre o equilíbrio, justeza - e oportunidade da (proposta do Governo,, o que me levava, desde logo, a afastar, na sua maioria, as soluções (propostas pelos projecteis de lei n.ºs 6/X e 7/X por inviáveis ou inconvenientes anuais, por desnecessárias ou sem relevância suficiente outras.
Não obstante, porque trato detenho, como aliás ninguém, o monopólio da verdade e da sabedoria, e talvez tombem porque não sou liberal ... defendi desde o primeiro mi-