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29 DE JULHO DE 1971 2619

domínio; trata-se da única atitude inteligente e viável de governantes que, dentro da legalidade, querem alcançar para o meu povo estádios mais elevados de civilização e cultura, evitando o risco das miragens demagógicas e dos prometeísmos mais ou menos bem intencionados.
Atenhamo-nos agora, às razões que podem dimanar da consideração de um plano preponderantemente doutrinário. Em primeiro lugar, impõe-se-nos reconhecer a verdade cada vez mais nítida de uma verificação feita por diversos sociólogos e pensadores contemporâneos e que contradita tanto a doutrina liberal como a doutrina marxista:

Quanto mais o ritmo do desenvolvimento se acelera, mais se agravam os riscos de desintegração social devidos à inovação e mais, por conseguinte, o poder político se estende e se reforça; de cada revolução poder político sai mais poderoso na sua acção, mais complicado na sua organização. A expansão do poder político está estreitamente ligada à aceleração da história. (Cf. Jean-William Lapierre, Essai sur le Fondoment du Pouvoir Politique. Paris, 1968. p. 643.)

Nesta perspectiva, quando as sociedades hodiernas conhecem rapidíssimos processos de estruturação e de estruturação, como poderia o poder político, consubstanciado no Estado, alhear-se dessa poderosíssima força de coesão ou de dissolução social que constituem os meios de informação massificada dos nossos dias? Não é apenas por razões de ordem económica que, na maioria esmagadora dos países, a rádio e a televisão se encontram sob contrôle directo do Estado. Não discuto agora os perigos reais de desumanização do homem acarretados por este Estado funcional moderno, já designado por «Leviatão teleguiado»; mas não se esqueça de que a alternativa só poderia ser a anarquia.
Nos regimes liberais oitocentistas, a imprensa via na intervenção do Estado o pior inimigo da sua liberdade, e o Estado, por sua vez, deixava aos indivíduos e ao livre jogo da concorrência o estabelecimento e a difusão de uma informação verdadeira. No fundo, tratava-se de um utopismo em que confluíam crenças e anseios da «filosofia das luzes» e do individualismo naturalista e romântico.
A análise crítica, deste credo utopista haveria de conduzir, ainda no século XIX, muitos espíritos, já desiludidos das virtudes do liberalismo, a considerar que a imprensa era primacialmente um meio de divulgar o erro, os juízos ligeiros e a intolerância. Leia-se, por exemplo, na Correspondência de Fradique Mendes, de Eça de Queirós, esse irónico e cruel depoimento sobre os jornais, que é a carta a Bento de S. Quando a burguesia passou do regime de concorrência ao regime de oligopólio, quando os meios de fundação e de vida das empresas jornalísticas se alteraram radicalmente, quando as técnicas de informação e publicidade, apoiadas em modernas ciências humanas e em avançadíssima tecnologia, evoluíram tão profundamente, o que poderá restar daquela utópica concepção da liberdade de imprensa?
Uma empresa jornalística necessita, hoje, de vultosos capitais para poder satisfazer as exigências das modernas técnicas de recepção de notícias, de impressão e difusão das suas publicações. O público deseja e requer jornais com atraente apresentação, com bom nível informativo e recreativo, e de preço módico. Neste condicionalismo, onde a competição esmaga os financeiramente mais débeis, é hoje uma recordação de museu o jornalista franco-atirador que, com o seu idealismo e escasso dinheiro, fundava um periódico que se proclamava orgulhosamente uma tribuna da verdade... As empresas menos fortes cedem perante as mais poderosas e, por compra ou por fusão, vão-se formando assim, por esse mundo além, grupos oligopolistas que concentram variados e influentes meios de informação. Até que ponto é que estes grupos, sob a pressão dos seus interesses particulares, não desfiguram a informação objectiva e não prejudicam os interesses públicos?

Vozes: - Muito bem!

O .Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª dá-me licença para outro aparte?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Júlio Evangelista: - Continuo encantado a ouvi-lo, de maneira que peço desculpa de mais uma observação. É que, precisamente nos termos em que V. Ex.ª está a raciocinar, estava a lembrar-me de um capítulo de Alfredo Sauvy, em Mythologie de Notre Temps. dedicado, precisamente, à imprensa. E nesse ponto ele asseverava que há uma censura tirânica e irrecorrível, que é a censura do director do jornal, na terminologia francesa redacteur-en-chef. Dessa não há recurso.
Acontece que - asseverava ainda Sauvy -, como há uma pluralidade de jornais e, portanto, uma pluralidade de direcções e censuras daquele tipo, tal pluricensura chega, às vezes, a dar a aparência de liberdade.
Esta observação, que me impressionou - não obstante as reservas que merece -, creio que estava no pendor das observações de V. Ex.ª

O Orador: - Muito obrigado mais uma vez pela sua contribuição Sr. Deputado.
É sabido, por outro lado, que actualmente o baixo preço de um jornal não cobre as despesas do seu custo, sendo evidente que a totalidade desse diferencial unitário sobe à medida que aumenta a tiragem do periódico. As empresas proprietárias de jornais, cujo carácter comercial seria pueril não reconhecer, encontram nas receitas publicitárias o suplemento que lhes permite não só pagar aquele diferencial, mas ainda auferir lucros. Até que ponto é que este suporte publicitário não afecta a independência da imprensa, sabendo-se que, muitas vezes, essa publicidade é concedida por grandes organizações, que, retirando-a, podem pôr em risco a sobrevivência económica de um jornal?
Os jornais, por ricos que sejam e por bem apetrechados que se encontrem de meios humanos e técnicos, dependem essencialmente, quanto à recepção de notícias importantes, de quatro ou cinco grandes agências que monopolizam a informação internacional. Como garantir, nestas condições, a verdade e a objectividade das. notícias? Até que ponto é que a informação provinda de tais agências pode perturbar, perigosa e traiçoeiramente, a opinião pública de um país? À medida que se complicam e se tornam fabulosamente dispendiosos os meios de transmissão das informações, como quando se entra no domínio da chamada «tecnetrónica», mais se restringe a diversidade dos emissores e mais se agrava, portanto, este problema. Que interesses particulares e ilegítimos poderão estar amanhã a controlar grande parte da informação planetária?
Estes e outros problemas similares e correlativos põem, em toda a sua agudeza, a necessidade da intervenção do Estado, como poder político que sobreleva os interesses particulares e que regula soberanamente a sociedade global, a fim de preservar a necessária independência e diversi-