2876 DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 143
e tantos outros, sejam objecto de estudo atento, rápido e oportuno e sejam lançadas bases certas para uma resolução.
Vozes: — Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Serras Pereira: — Sr. Presidente: No domínio artístico e cultural, um dos acontecimentos mais relevantes levados a efeito entre nós, nos últimos tempos, é sem dúvida a Exposição de Pintura dos Mestres do Sardoal e de Abrantes. Mereceu a honra de ser inaugurada pelo primeiro magistrado da Nação, com a presença do Sr. Presidente da Assembleia Nacional, membros do Governo, presidente da Fundação Gulbenkian e outras altas individualidades. Mais tarde, particularmente visitada demoradamente pelo Sr. Presidente do Conselho.
Contam-se por muitos milhares as pessoas de todos os níveis sociais que a percorreram, no convento de S. Domingos, em Abrantes.
Por se tratar do mais numeroso conjunto de pinturas do século XVI, atribuída ao Mestre do Sardoal e a Gregório Lopes, só ultrapassada pela Exposição dos Primitivos Portugueses em 1940, nas Comemorações Nacionais dos Duplos Centenários da Independência e da Restauração, julgo ser devida referência a facto tão digno como significativo.
Com efeito, a pintura que figura naquela Exposição traduz, em perfeita harmonia, o grau cultural e artístico do Portugal de Quinhentos, representa uma axialogia, contém uma concepção da vida, é soberba e magnífica como técnica pictural.
Terá naturalmente recebido influência flamenga, bizantina ou italiana, o que nada afectou a personalidade de um povo e de uma época, em que a par de se dar cumprimento à mais sistemática, grandiosa e duradoura tarefa que o homem realizou à superfície da terra, invadíamos a Europa com novas formas do saber, com exotismos, novos usos e costumes, com uma nova dimensão do universo, do que naturalmente resultou novos conceitos científicos, especulações, filosóficas diferentes.
O intercâmbio entre Portugal e a Europa, entre Portugal e o Oriente, entre Portugal e a África e a América, cria novos valores, reformula concepções, dá origem a novos sentimentos, modos de vida, confiança no esforço, valorização humana. Somos, simultâneamente, admirados e temidos na Europa e no Oriente, -e motivo de espantação em terras do Brasil e da África equatorial.
O que é culto, aqueles que definem a Europa de Quinhentos, são Erasmo, Lutero, Dürer, todos amigos de Damião de Góis; André de Gouveia é mestre de Montaigne; como o reitor do colégio de Santa Bárbara, Diogo de Gouveia, o é de Rabelais e Aires Barbosa do futuro Papa Leão X; D. João II é amigo de Lourenço de Médicis; D. Manuel encomenda desenhos a Leonardo da Vinci; Miguel Ângelo, no Juízo Final, pinta a evangelização do Brasil; a dinastia de Avis atrai dos maiores mestres da pintura — Ticiano, Moro, Sanches Coelho, etc. Goa transforma-se na Roma da Ásia e Francisco Xavier leva a boa nova ao Extremo Oriente. O português torna-se a língua universal desde Ormuz ao Japão e permanece como tal durante três séculos. Cento e quinze portugueses são lentes das Universidades europeias, ao mesmo tempo que se reforma a Universidade de Coimbra com mestres insignes.
O primeiro teatro moderno é vicentino e a epopeia atinge a mais universal expressão com Luís de Camões.
E não há perante a Europa uma atitude de subserviência, de submissão, de inferioridade.
Somos respeitados pela força do nosso domínio marítimo e comercial e pela capacidade demonstrada no campo da ciência, da arte e da cultura.
Sr. Presidente: A exposição de pintura dos mestres do Sardoal e de Abrantes, hoje presente ao público na Fundação Calouste Gulbenkian, transformada em exposição nacional por vontade expressa do Sr. Presidente da República, quando da sua inauguração, em Abrantes, retrata, em grande parte, o nosso século XVI. Ela aí está, em ambiente único, para alimento da sensibilidade, recreio do espírito, matéria inesgotável de estudo e de crítica graças à alta compreensão, espírito de ajuda, receptividade aos problemas da cultura e da arte, do ilustríssimo presidente daquela Fundação que a tornou possível em Abrantes e igualmente em Lisboa. Do mesmo modo, são devidos reconhecidos agradecimentos ao Prof. Abreu Faro, digníssimo Subsecretário de Estado da Administração Escolar, que, como presidente do. Instituto de Alta Cultura, contribuiu decisivamente para a sua efectivação e publicação do catálogo.
Esta iniciativa da cidade de Abrantes, terra bem pequena para ousadia tão grande, pretendeu alcançar alguns objectivos. O primeiro foi, sem dúvida, proporcionar à população da cidade, do concelho e do País uma galeria de pintura de valor invulgar que, na expressão do Dr. Azeredo Perdigão, «atingiu nível internacional».
Como sementeira que soube fazer, quis chamar a atenção para alguns problemas que lhe são vitais e que mereceram de quem de direito um maior empenho na sua resolução.
Pretendeu-se ainda recordar na publicação do catálogo os nomes de José de Figueiredo, João Couto, Reinaldo dos Santos, Myrom Jirmounsky, Reis Santos, Vieira Santos, que tanto contribuíram para a salvação, inventariação e catalogação deste património artístico. Entendeu-se, por último, apresentando certos exemplares em mau estado, que valores tão belos, testemunhos da história, são peças únicas, deverão de futuro ser mais carinhosamente conservados, restaurados e defendidos.
Na sala de exposições temporárias da Fundação Gulbenkian está presente ao público até princípios de Janeiro, devido a numerosíssima afluência de público, um conjunto de quadros que não será fácil voltar a reunir. Pelo seu significado grau de interesse, escala de beleza, brio nacional, merece a visita de toda a gente.
Aqui se faz apelo para que os reitores de liceu e directores de colégios levem os seus alunos, em visitas, se possível guiadas, ver o que de melhor, e é excelente, neste capítulo Portugal foi capaz de criar.
Vozes: — Muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Correia das Neves: — Sr. Presidente: É-me grato apresentar a V. Ex.a, no limiar desta nova sessão legislativa, os meus respeitosos cumprimentos e a expressão renovada do nosso muito apreço pela pessoa do digno Presidente da Assembleia Nacional.
Como é do conhecimento público, o Governo projectou e iniciou já a execução dos trabalhos do chamado «Plano de Desenvolvimento da Área de Sines».
Pelo que se observa em pormenor, ele mostra poder vir a ser o maior empreendimento do seu género levado a cabo até hoje no País. Por agora, frisar-se-á apenas que a previsão do investimento global programado para o presente decénio é de 40 970 milhões de contos, cabendo 31 milhões ao sector privado e os restantes 9970 milhões ao sector público (estes últimos para instalações portuárias, transportes e urbanização, estando prevista, dentro desta