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4044 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 206

Bem merece esta actividade, há tantos anos lamentada e chorada nesta Casa, que o Governo se debruce paternalmente sobre ela, iluminando o caminho dos empresários e donos da terra com a mesma luz que despontou alfim mas já aquece o lar dos seus obreiros!

Em matéria de política fiscal, podemos hoje mais afoitamente, dada a maior receptividade, falar da função social do capital, embora tenha havido sempre, honra lhes seja, quem não perdesse a oportunidade de para ela chamar a atenção dos governantes. E eu pergunto se, numa economia de tipo ocidental com base na livre iniciativa e propriedade privada, não terá fatalmente de ser no capital, seja qual for a forma sob a qual se apresente, que o Estado terá de fazer incidir a tributação?

É, evidente que sim, e de forma a não só poder satisfazer os seus compromissos como para redistribuir em função du política social adoptada.

Afigura-se-me, porém, que a tributação deve ser cada vez mais personalista, de maneira que a cada indivíduo corresponda apenas um tratamento tributário, ainda que os proventos a taxar sejam de origem muito diferente.
No que diz respeito à colecta sobre automóveis e barcos de recreio, modalidade inédita nu nossa política fiscal, acho-a bem, sobretudo se tivermos em conta o fim a que se destina. Em presença, porém, da controvérsia levantadas à sua volta e ponderadas a motivação e as razões de queixa, permito-me emitir a opinião favorável ao pagamento de uma taxa mínima e acessível por todos os veículos automóveis, que seria agravada em função dos características do veículo, preço, etc.

Parece-me que desta forma seria mais justa, equilibrada e aceitável a nova tributação e talvez para o Estado revertesse mais dinheiro.

Nesta digressão pela lei de meios e com o à-vontade do homem da rua e de quem se fia na bondade dos comentadores profissionais, seja-me permitido fazer ainda alguns reparos, de resto já levantados por mim nesta legislatura.
Este diploma, sem deixar de se integrar na moldura do Plano de Fomento em execução, como programa que é de curto prazo, deveria enunciar no seu texto ou em separatas anexas os propósitos de todos os Ministérios, a fim de a qualquer cidadão ser possível compulsar as actividades deste ou daquele sector da Administração projectadas para o ano em que aquele diz respeito.

A lei de meios, que nesta ordem de ideias deveria ser a pauta pela qual tudo se deveria reger tanto quanto possível matematicamente, salvo as providências impostas por causas imprevistas e inadiáveis resultantes da contingência da vida ou da evolução dos acontecimentos, fica, sem o enunciado a que atrás me refiro, omissa, vaga e misteriosa em face da objectividade dos programas que todos operamos da governação. Pergunto, por exemplo, o que se possa em matéria de intenções para 1973 nos Ministérios das Obras Públicas, Saúde e Assistência e Educação?

Bem sei que poderemos ir ver tudo isso ao Plano de Fomento, mas não é a mesma coisa, pois este é ainda menos acessível ao comum dos portugueses.

Quanto às providências sobre o funcionalismo a que se refere o último capítulo deste diploma e já há tempos anunciadas pelo Sr. Presidente do Conselho, merecem um comentário especial. Nota-se, não há dúvida, um espírito de compreensão e até, porque não dizê-lo, de afectividade a presidir às relações entre o Governo e governados, e deste novo estilo resulta a sadia e tranquila certeza de que o Chefe, cônscio das dificuldades que a vida a todos traz no dia a dia, as deseja resolver ou minorar a tempo e horas, evitando que a dilação deteriore o proveito intrínseco das soluções e o êxito psicológico das providências.

Devemos estar-lhe grato por isso e pelo calor humano que imprime às suas medidas e muito em especial pela gigantesca obra que, sentindo-se já, começa a projectar-se na sua verdadeira dimensão interna e externamente.

O Sr. Leal de Oliveira: - Muito bem!

O Orador: - Desta tribuna, prevalecendo-me do mandato que os Algarvios me outorgaram, cumprimento S. Ex.ª, em seu e meu nome, com o brado: "Prossiga, Sr. Presidente, por Portugal, e que Deus e os homens o ajudem!"

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Magalhães Mota: - Sr. Presidente: E certamente uma dás singularidades da vida portuguesa o facto de, dentro de uma assembleia política, várias pessoas não aceitarem a eficácia nem a bondade das actuações parlamentares e, mais ainda, apesar de exercerem a vida política, tentarem justificar que ... não são políticos.
Não será este o momento e o lugar de escalpelizar o fenómeno ou averiguar-lhe as causas.

Certo é - e por agora é o que queria referir - que só este contexto explica que um "político" tenha certo dia manifestado a sua crítica da ineficácia do "parlamentarismo", apontando o exemplo que mais nítido lhe parecia: a Assembleia Nacional todos os anos a discutir a lei de meios ...

Com alguma preocupação (devo confessá-lo), antes de subir a esta tribuna pensava eu se não haverá na observação maior agudeza crítica do que parece.

Não estaremos, efectivamente, todos os anos, a repisar os mesmas teclas, a dizer as mesmas coisas?
Por exemplo, o que eu mesmo disse há cerca de um ano (Diário das Sessões, n.º 145, de 15 de Dezembro de 1971.)

Tinha começado por falar nos dados de base e na sua importância e de como o próprio relatório da proposta lhe ia acusando as deficiências.

Este ano, o relatório da proposta volta a referir: "os indicadores disponíveis levam a admitir a possibilidade" (p. 15); "segundo as estimativas disponíveis" (p. 16); "Em relação ao ano em curso, os indicadores, disponíveis" (p. 16); "Conforme revelam as estimativas oficiais" (ainda a p. 16).

Isto é, nunca ou quase nunca se pôde dispor de uma informação completa e rigorosa.

O próprio relatório várias vezes refere isto mesmo: "Relativamente ao ano em curso, os indicadores disponíveis não permitem caracterizar, com segurança, a evolução que se tem processado. Conjugando, porém, as escassas informações quantitativas existentes" (p. 35). Ou, mais sintomaticamente ainda, por realçar dificuldades que nos afectam todos os dias e num sector que o Ministro responsável considerou prioritário: "Não constitui novidade o facto de a condução da política económica a curto prazo e, por outro lado, da política sectorial do comércio, ter de ser ainda baseada em fontes de informação que não satisfazem por inteiro, tanto por conterem lacunas de dimensão apreciável como pela própria qualidade de muitos dos dados disponíveis" (p. 99).

(As páginas indicadas são do volume editado pela, Imprensa Nacional-Casa da Moeda.)