4072 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 206
fez carreira, direi que julgo indispensável a existência de uma Administração voltada ao desenvolvimento.
Ora, ninguém ignora que razões por de mais conhecidas estão a ser a causa do generalizado desinteresse dos melhores no preenchimento, de cargos públicos, e que, salvo honrosas excepções, que felizmente são ainda em grande número, os mais qualificados deles se têm afastado.
Problema altamente preocupante, carece de solução urgente e eficaz; a Administração é, no fundo, aquilo que forem aqueles que a servem.
Por isso anoto, com grande agrado, a intenção do Governo de em 1973 "rever as condições do exercício da função pública, para que se consiga dotar a máquina administrativa do pessoal qualificado que o seu bom funcionamento cada vez mais exige".
E chego ao fim das minhas despretensiosas considerações.
Seria presunção da minha parte, que não tenho, pensar que trouxe alguma novidade a esta Câmara ou disse ao Governo algo que ele ignore. Dos claros e inequívocos propósitos do Governo, e quanto aos pontos que foquei, são prova concludente não só os passos, que fui assinalando, do relatório que precede a proposta da lei de meios para 1973, como as normas estabelecidas nos artigos 3.°, 9.°, 13.°, 18.°, n.° 2, e 21.° da mesma proposta.
Mas atrevo-me a acreditar que as minhas palavras, as palavras de um homem da rua que sente como seus os anseios do Pais, e que outro mérito não reivindica do que o de ser sincero, não serão completamente inúteis, já que lembrar certos princípios básicos, embora elementares, nesta época tão agitada, tem, pelo menos, o condão de os reafirmar e de permitir reflectir sobre eles, sobre verdades simples, na sua essência e nos seus efeitos. E isso, no meu modo de ver, é oportuno, mormente a respeito de um plano de actividade - que é o primeiro a ser formulado após o alargamento do Mercado Comum Europeu, e cuja execução se inicia com a do acordo negociado pelo Governo Português com os países que constituem aquela organização - em meu parecer o único caminho que se nos abria, mas que, por ser árduo, vai exigir de todos nós, Estado e particulares, novo esforço e mais canseiras, para que possamos continuar a viver honradamente e sem sobressaltos.
De resto, a minha confiança no Governo permanece intacta; no que particularmente respeita ao Dr. Cotta Dias, que com tanta distinção está exercendo o cargo de Ministro das Finanças e da Economia, a quem rendo as minhas homenagens da mais alta consideração e estima pessoal, as suas invulgares qualidades de há muito o impõem ao respeito geral. No documento a tantos títulos modelar que é o relatório de que com frequência me servi nesta minha já longa exposição ficam bem vincados os traços da sua inteligência privilegiada, do seu profundo saber, do seu senso político.
Ao aprovar na generalidade a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1973, permito-me formular um só voto: o de que a sua execução venha a corresponder ao pensamento de quem a concebeu e redigiu, pois seria lastimável que os princípios nela mencionados ficassem esquecidos nas páginas inertes do número do Diário do Governo que a publicar.
O Sr. Ávila de Azevedo: - Sr. Presidente: 1. A proposta da lei de meios está suficientemente debatida e esclarecida na generalidade. Os mais brilhantes economistas, que participam da nossa Assembleia, debruçaram-se sobre ela, analisando-a em todas as suas motivações, implicações e consequências. Todavia, e já a concluir o debate, não me parecem extemporâneas algumas observações que ainda não foram aduzidas.
A primeira é um aspecto positivo. A inclusão de atribuição essencial da Assembleia de apreciar "os princípios a que deve ser subordinado o orçamento" provém da Constituição de 1933. Representa uma nova era na nossa administração financeira: a da regularidade e a do equilíbrio das contas públicas. Sucedeu a um período calamitoso de um século em que vivemos sempre com orçamentos desequilibrados e numa inquietante desordem financeira.
Consultei, por curiosidade, a Carta-Lei do Orçamento de 1841-1842, aprovada pela Sr.ª D. Maria II. Todas os despesas da Nação orçavam então por 11 000 contos. Mas o deficit previsto nesse ano atingia 650 contos.. Estes deficits repetiram-se constantemente durante o Constitucionalismo, só com um intervalo salutar, depois da implantação da República, em 1913-1914, em que se apresentava um pequeno superavit. Mas desde 1928 que passámos a fruir de orçamentos em que as despesas eram consideradas em função das receitas. O do ano de 1973 é o quadragésimo quarto perfeitamente equilibrado.
2. Há um segundo ponto igualmente positivo. Apesar das nossas carências económicas, da nossa marcha lenta para o desenvolvimento, do ritmo ainda débil do crescimento do produto nacional bruto, do atraso dos nossos investimentos industriais, quer no ponto de vista da produtividade, quer no ponto de vista tecnológico, do desequilíbrio alarmante da nossa balança comercial e até dos desfalques demográficos de que estamos sofrendo - o orçamento das receitas e das despesas continua a sua marcha ascensional de ano para ano. Ainda que tenhamos em linha de conta a desvalorização da moeda, acentuada nos últimos anos, é certo que as receitas em 1939 mal excediam 2 milhões de contos; em 1941 atingiram os 3 milhões; em 1943 passavam dos 4 milhões; em 1947 já se aproximavam dos 6 milhões. Há então uma relativa estabilização até 1955.
De 1955 a 1959 ainda não conseguíramos exceder os 10 milhões de contos. Em 1960 acentua-se a progressão das receitas, que já ultrapassam os 18 milhões de contos em 1965. Em 1967 alcançávamos quase os 20 milhões. No triénio de 1967 a 1970 as receitas acusam um acréscimo espectacular, saltando bruscamente para 80 milhões de contos, ou seja de mais de um terço em relação a 1967. Situamo-nos agora nos 37 milhões. E sem dúvida um resultado inferior a outros orçamentos europeus, um décimo por exemplo do da Bélgica, como foi salientado pelo Sr. Deputado Roboredo e Silva. Mas significa um notável índice de progresso nas disponibilidades do Estado Português.
3. Mas há também na proposta de lei outros aspectos mais sombrios em face destas claridades meridianas, sem deixar de realçar o método persistente e a atenção escrupulosa que presidiu à sua elaboração. Pelo menos desde 1970, em que ela foi presente no primeiro ano de funcionamento da actual legislatura, inscreve-se um capítulo designado como "orientação geral da política económica e financeira". Ora desde aquela data, como aliás se reconhece no texto da proposta, as grandes directivas da política económica do Governo mantêm-se num sentido invariável, sem que sejamos amplamente informados dos resultados conseguidos.
Assim, a título exemplificativo, já em 1970 se preconizava que se incentivassem e apoiassem "as transformações das estruturas económicas e financeiras das empresas portuguesas"; em 1971 mudam-se apenas os termos quando se pretende "promover e estimular a aceleração do investimento em empreendimentos produtivos e em infra-estruturas económicas e sociais"; em 1972 repete-se a mesma intenção ao "promover e apoiar um ritmo elevado de inves-