4070 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 206
por outro, a previsão de próximo e explosivo crescimento da oferta, pois os pomares actualmente em produção plena não atingem sequer metade dos que estão plantados.
Assim, dentro de três anos a situação será catastrófica se, entretanto, não for organizada uma rede de instalações de frio que permita recolher a produção que exceda as necessidades de consumo na ocasião da apanha dos frutos e possibilite, portanto, o escoamento a medida que essas necessidades vão surgindo, e isso sem quebra das boas condições sanitárias e de custos simultaneamente compensadores para o produtor e razoáveis para o público, o qual, como muitos exemplos o ilustram, em nada beneficiará com o aviltamento dos preços na origem e a ruína subsequente do empresário.
Por isso, volto a insistir, é imperioso impulsionar a instalação de frigoríficos, fazendo-o com o mesmo entusiasmo, o mesmo poder de persuasão, o mesmo dinamismo com que foi espalhada a ideia da plantação de pomares, esperando que o Estado intensifique a sua ajuda técnica e financeira para aquele efeito.
De outro modo, corremos o risco de desencadear uma crise de proporções incalculáveis, cujos reflexos impossível é também de prever.
Claro que, ao mesmo tempo, outras providências haverá de tomar, avultando entre elas a industrialização das diferentes frutas e a exportação, mormente para o ultramar e para o Brasil. Estas serão, contudo, medidas que, por si sós, não solucionam o problema, sem quebra do grande valor que possam ter, e efectivamente têm, na sua resolução.
Permitam-me VV. Ex.ª, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o assinale: se a situação não for enfrentada rapidamente e com energia, a fruticultura deixará, muito em breve, de ser esperança fagueira de tantos, para se transformar em autêntica calamidade para aqueles, e muitos foram, que, seguindo as sugestões dos serviços oficiais, enveredaram por caminho que se antevia promissor.
As afirmações que precedem faço-as em plena consciência e com conhecimento de causa, já que creio estar devidamente elucidado acerca da situação, dadas as especiais responsabilidades que no sector me cabem, quer como produtor, quer, sobretudo, como presidente da direcção da Cooperativa Agrícola dos Produtores de Fruta do Distrito da Guarda.
E se há região em que o assunto se revista de notória acuidade, essa é o meu distrito, onde a pobreza do solo se alia à dureza do clima, a carência de matérias-primas e a limitada industrialização.
Se se não extrair um rendimento, embora modesto, desses capitais - que vai ser da maioria dos empresários, quase todos gente sem meios de fortuna?
Foi pensando no futuro que a Cooperativa em causa se lançou decididamente na orientação que menciono, e que coincide com u do Governo, como resulta da simples leitura, entre mais, dos n.ºs 45 (parte final), 57 e 94 do relatório, que, já o frisei, precede a proposta de lei em discussão. Ponto é que se concretizem, os princípios ai definidos e que se não esqueça outro dos objectivos fundamentais a prosseguir, que é - expressamente o refere o n.° 44 do mesmo documento - "o da correcção progressiva dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento".
Assim, e em perfeita harmonia com esses princípios e com as normas estatutários que a regem, a referida Cooperativa tomou a iniciativa de se apetrechar com uma rede de instalações frigoríficas, colocadas estrategicamente, de modo a cobrir as necessidades da área em que actua, agora e no futuro mais próximo. O desenvolvimento e a efectivação desse plano, bem como do aproveitamento industrial das frutas, dependerá apenas do apoio material que receber do Governo, através da concessão de créditos e de subsídios adequados, aliás já requeridos, sendo certo que os sócios da Cooperativa assumirão a quota-parte das responsabilidades que lhes cabem.
Simultaneamente, procura-se a melhor comercialização, de forma a eliminar, no possível, os intermediários oportunistas e a fazer chegar os produtos ao consumidor nas condições ideais de conservação, bem como a preços acessíveis.
Questão vizinha desta, e com ela intimamente relacionada, é a da dimensão da empresa agrícola.
Mais do que os grandes latifúndios, a minipropriedade é altamente prejudicial, quer para a economia dos seus donos, quer para a da Nação.
Não é necessário ser perito na matéria para discernir que a pulverização da propriedade acarreta a ruína de quem se dedica à sua exploração, pois a torna economicamente inviável e, para além disso, impossibilita métodos modernos de cultivo, cujo uso somente se justifica em exploração em larga escala, racionalizada e com agricultura diversificada. E também apenas dessa maneira se conseguem preços competitivos e ao mesmo tempo remuneradores, que facultem ao lavrador um nível de vida aceitável.
Publicaram-se, há anos já, os instrumentos jurídicos que habilitam o Governo a promover o emparcelamento; existem também as normas legais que facilitam, através de isenções e de benefícios de vária ordem, a agricultura de grupo, em sociedades constituídas com esse objectivo; de uns e de outras se faz menção no relatório a que já aludi.
A realidade, porém, é esta: até agora, talvez pela inércia dos interessados, talvez por culpa da nossa formação extremamente individualista, nenhum dos institutos funcionou, pelo menos de forma eficiente. Alguns exemplos que possam existir, poucos, decerto, não invalidam a afirmação.
Entretanto, o abandono dos campos acentua-se; a mecanização não se faz, por carência de meios e por injustificada, perante os diminutas dimensões do agro; os oportunistas, aproveitando-se do desânimo dos lavradores, assenhoreiam-se das melhores terras, adquirindo-as por preços, irrisórios; aqueles que teimam na utilização de métodos primitivos, arruinam-se ingloriamente; os preços por que se obtêm os produtos são proibitivos - descontentam o lavrador, que se queixa de não obter a merecida recompensa do seu trabalho, e originam protestos do público, que reclama contra o custo elevado e a qualidade insatisfatória.
Enfim, ninguém ganha e todos perdem.
Julgo, portanto, chegada a hora do arranque, sem violências escusadas, mas com ânimo, como parece estar nos propósitos do Governo, se bem entendo o que se lê nos n.ºs 69, 71 e 72 do aludido relatório.
Os espíritos já se encontram, aliás, preparados, pois mesmo os mais renitentes compreenderam que se ultrapassou a época da pequena leira a fornecer, embora por preço exorbitante, o magro sustento da família, e que persistir em tal caminho é luta inglória que a sociedade de consumo em que, queiramos ou não, temos de viver torna antecipadamente perdida.
Têm a palavra os departamentos do Estado com competência para intervir e dar o impulso inicial, incutir ânimo aos mais timoratos e harmonizar os interesses porventura divergentes.
O que não pode continuar - refiro-me em especial à zona das Beiras - é aquilo que se passa actualmente com os pequenos lavradores, na posição mais aflitiva