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1 DE FEVEREIRO DE 1973 4473

canos permanecia ao mesmo nível ou em nível inferior ainda ao que auferiam em 1911.
Estas considerações tornam-se ainda mais alarmantes se entrarmos em linha de conta com o receável e receado surto inflacionário da República da África do Sul e o conjugarmos com a tendência imobilista dos acordos internacionais.
Para alguém que nunca esteve nas profundezas de uma mina poder fazer ideia de como este emprego pode ser considerado sobre-humano para uma pessoa normal, sugere o Dr. Wilson que nos lembremos de um trabalhador esburacando o passeio com uma broca pneumática. Agora imaginemos - diz ele - o que não será um homem a fazer esse trabalho a centenas de metros debaixo do solo, sob calor infernal (a temperatura da rocha atinge de 40°C a 50°C), onde nem sequer pode ficar de pé, onde a broca não funciona com o auxílio da gravidade sobre o chão, antes é segurada em posição horizontal e guiada para a parede em frente. Acrescente-se a este quadro o barulho da broca, ampliado várias vezes pelo espaço limitado, o pó que, apesar dos enormes esforços para o seu contrôle com água, necessariamente invade os pulmões, a possibilidade de o tecto da mina ceder de repente sob pressão, ou de uma explosão provocada por uma faísca da broca ou por um cigarro descuidado que pode inflamar uma bolsa de gás metano, e teremos uma ideia do trabalho de um rapaz-máquina (machine boy).
A ideia de um verdadeiro inferno, dizemos nós.
Revela ele ainda que o mineiro africano não tem direito a pensões, que quando contrai a tuberculose, depois de três ou quatro semanas de cama, é pura e simplesmente recambiado, armado de um lote de antibióticos e do endereço de uma clínica onde poderá obter mais; que no caso de sofrer de pneumoconiose combinada com tuberculose é despachado para a sua terra com uma compensação única de 20 000$; que vive aformigado em compounds, em lotes de 2400 a 7000 e em quartos com 12, 20, 60 e 90 homens, só homens.
Que vergonha! Que lástima! Que terrível acusação a quem os explora, a quem os deixa explorar, a todos nós!
Trabalhando para empresas poderosas que alcançam lucros fabulosos, o mineiro africano ganha em média, em dinheiro, a "esmola" de 650$ mensais.
Confessemos todos que é um preço ironicamente baixo para pagar a saúde e o trabalho, para suportar o calor e o isolamento, para enfrentar tantos perigos, para abandonar a mulher e os filhos e para trocar o ar livre e a liberdade do seu torrão natal pela clausura social de um ambiente forçosamente pernicioso e pela poeira muitas vezes letal dos subterrâneos.
Seria um salário razoável para uma toupeira. Não para um homem.
Numa canção que fez êxito em Moçambique, a evidenciar a solidariedade da sua população com a sorte desses desgraçados, diz-se:

É lá fora que correm gazelas
É lá fora que há luz e estrelas

Diz, Magaíça, diz
Diz adeuz à raiz
Diz adeus ao carvão
Que é morte viver
Debaixo do chão

E é!!!
De acordo com estatísticas reveladas no Parlamento da República da África do Sul pelo Ministro de Minas, as minas empregaram 724 000 pessoas em 1971, das quais 630 000 (87 por cento) africanos, sendo uma boa parte destes cidadãos portugueses. No entanto, de uma folha global monstra de salários, de 21 360 000 contos, ao trabalhador africano (não incluindo cama e mesa e assistência médica), impedido por lei do desempenho de lugares especializados, apenas couberam 6 200 000 contos. Isto é: 13 por cento do número total de trabalhadores receberam 71 por cento da folha, e os restantes 87 por cento, apenas 29 por cento do total. O que significa que, considerando todas as minas em conjunto, o africano recebeu 820$ mensais em média, ou seja menos do que o salário mínimo hoje em vigor em Moçambique para tarefas bem menos degradantes.
Nas minas da gigantesca Anglo-American Corporation, que, aliás, é uma das empresas que melhor pagam, a média dos salários é de 16 000$ para o branco e 1000$ para o africano.

O Sr. Ribeiro Veloso: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Ribeiro Veloso: - Tenho estado a seguir com muito interesse o discurso de V. Exa., e não deixo de concordar com algumas das considerações de V. Exa.
V. Exa. tem estado a transmitir-nos o que diz um livro escrito por um sul-africano.
Convinha, no entanto, que se soubesse que entre os portugueses mais pobres de Moçambique consta, há largos anos, que um homem para ser homem tem que trabalhar na África do Sul, no "John".
Eu não sei como é que surgiu, entre esses portugueses pobres, aquela ideia, e é difícil, V. Exa. sabe-o tão bem como eu, convencê-los de que assim não é.
Assim, apesar de ganharem menos na África do Sul do que em Moçambique, como V. Exa. acaba de referir e que eu registo com muito interesse, ainda gostam de ir trabalhar na África do Sul.
É curioso também, e deve dizer-se, que esse interesse não é tanto já por eles, homens, mas é mais pelas raparigas, que continuam a pensar que eles só têm o conhecimento do mundo que lhes pode proporcionar um marido capaz se tiverem estado na África do Sul.
Quando V. Exa. inicialmente afirmou que o nosso Governo nada tem feito para impedir que eles vão para a África do Sul, eu permito-me declarar aqui, a V. Exa. e a todos, que isso não corresponde exactamente à verdade. Muito se tem feito no sentido de evitar que eles vão para lá trabalhar; tem-se procurado evitar que lá gastem todo o dinheiro que lá auferem e muito se tem feito para corrigir o pensamento errado de que só se é homem se se tiver ido trabalhar na África do Sul.
Apesar de tudo, e V. Exa. sabe-o, é muito difícil corrigir e eliminar determinados pensamentos que aquela população tem.
Peço-lhe desculpa de o ter interrompido, mas não podia deixar passar em claro algumas das observações que V. Exa. fez sem frisar que o Governo e todos nós temos procurado fazer com que os portugueses de Moçambique não vão trabalhar para a África do Sul,