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1 DE FEVEREIRO DE 1973 4481

teria que, creio, poderá ter algum interesse e actualidade, sobretudo quando a TV não tardará talvez muito tempo a aparecer em alguns dos nossos territórios africanos.
3. Torna-se bem evidente quanto os problemas ligados aos meios de comunicação social interessam, e preocupam mesmo, o homem comum e qual é, portanto, a sua relevância política.
Ora a política não pode nem deve ser uma actividade esotérica, a cargo apenas de uns tantos, da qual se alheiam indiferentes ou receosos os demais: o bem comum diz-nos respeito a todos e, por consequência, a sua busca e a sua preservação também a todos nos deverá interessar.
Tem sido nos últimos anos bem claros e bem visíveis, embora nem sempre bem sucedidos, os esforços para que se estabeleça neste País um mais aberto e mais franco clima de diálogo e de convívio de ideias. Tal diálogo ou tal convívio não depende, todavia, somente de bons desejos e de bons propósitos: pressupõe hábitos de tolerância e de respeito, requer, como regra, elevados padrões de cultura; mas depende também - e em grande parte - da própria medida em que sejam conhecidos os problemas a debater. Portanto, tornar melhor conhecidos os problemas, será, já de si, um passo muito importante para que se consigam criar as condições do tão desejado diálogo, da tão desejada participação de todos na vida política do País - será mesmo uma condição necessária, ainda que não suficiente, no processo de educação de um povo na liberdade.
4. Ao abordar o assunto por este prisma, sabendo como é poderosa a acção dos modernos meios de comunicação social, ser-se-á imediatamente conduzido ao ponto fulcral deste e de outros graves problemas, que Bertrand Russel resumiu magistralmente nestes termos:

Toda a teoria pedagógica séria deve estar constituída por duas partes: um conceito dos fins da vida e uma ciência da dinâmica psicológica, isto é, das leis que regem os mecanismos mentais.
Duas pessoas que discordem quanto aos fins da vida não podem chegar a um acordo quanto à educação.

Não me alongarei sobre estes aspectos. Refiro-os apenas para acentuar que, também nestes domínios, há as mais fundas opções de natureza política e que só aparentemente poderá haver posições neutras por parte do Estado.
É certo que muitos espíritos parecem tentados a crer que a coexistência entre civilizações ou entre mundos políticos diversos, entre, por exemplo, uma sociedade cristã e uma sociedade marxista, é apenas questão de mais ou menos espírito de tolerância ou de transigência dos homens e que o Estado moderno deverá, por isso, preocupar-se cada vez menos em pensar nos grandes princípios, nas grandes opções no plano espiritual e buscar sobretudo soluções pragmáticas de compromisso, num habilidoso equilíbrio.
A este propósito será oportuno recordar palavras recentes de Jacques Monod, em livro já célebre, acerca da funda crise da nossa civilização, da sua falta de unidade e de verdade.
Não perfilho naturalmente as opções filosóficas em que pretende basear o seu humanismo socialista, mas considero bem certeiras as suas observações e as suas críticas, quando diz que "as sociedades liberais do Ocidente ministram ainda com perfeito à-vontade - como base da sua moral - uma repulsiva mistura de religiosidade judeu-cristã, de progressismo cientista, de crença nos direitos naturais e de pragmatismo utilitarista... O divórcio é tão grande, o embuste tão flagrante, que obsessiona e dilacera a consciência de qualquer pessoa provida de um pouco de cultura, dotada de alguma inteligência e possuída por esta ansiedade moral, que é a origem de toda a criação...
O mal de alma moderno é precisamente essa mentira na raiz do ser moral e social".
De facto, na nossa sociedade ocidental o progresso material e a ânsia de bem-estar económico fazem frequentemente esquecer que o ser humano se não satisfaz apenas com isso e que "um dos problemas capitais da nossa época e, precisamente, o da manutenção do homem e da sua dignidade entre as suas próprias invenções".
5. Ora entre estas invenções no domínio dos meios de comunicação social, a televisão, embora a mais jovem, é já aquela que provoca um maior impacte sobre as massas e que suscita, por isso, as mais sérias preocupações.
Ao princípio, supôs-se que ela seria essencialmente uma forma engenhosa de levar ao espectador comodamente instalado em sua casa um espectáculo de cinema ou uma espécie de rádio mais aperfeiçoada, que, além do som, transmitia juntamente umas imagens. Depresa se compreendeu, porém, que a televisão, com o seu fascínio sobre as massas, com a sua extraordinária influência sobre as crianças, as quais através dela recebem grande parte das primeiras imagens com que ficarão acerca do mundo, não significava apenas o aparecimento de um novo meio de diversão para ocupar os lazeres ou de um novo e mais poderoso processo de propagar ideias ou transmitir notícias, mas que o homem passava a ter ao seu alcance um instrumento de extraordinária rapidez e potência - como um explosivo comparado às velhas armas de guerra -, que poderia servir-lhe quer para estabilizar e fortalecer a estrutura da sociedade em que vive, quer para romper e minar rapidamente o seu sistema de valores - tudo dependendo somente da forma como quisesse usar a televisão e aperceber-se dos seus próprios interesses.
É certo, como se acentua num notável relatório preparado para um governo estrangeiro sobre estes problemas, que se uma sociedade fizer funcionar a televisão fora do seu sistema de valores exporá a sua fibra moral e os seus costumes a forças sobre as quais não tem contrôle, mas isto - frisava-se também - só sucederá provavelmente se esses valores estiverem já em declínio. A TV não seria portanto a causa, mas o reflexo desta situação, e nada mais haveria feito afinal do que acelerar um processo já começado de autodestruição.
Esta advertência não deve, como é óbvio, ser entendida como querendo de algum modo dizer que o interesse colectivo seja porventura a manutenção a todo o custo de velhas estruturas sociais, anquilosadas ou gastas, pois todo o progresso humano é naturalmente evolução, mas apenas que o homem perante estes novos meios deve tomar plena consciência do risco que cada vez mais corre de estar a ser conduzido sem se dar sequer conta disso e sem saber mesmo bem para onde.