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4994 DIÁRIO DAS SESSÕES N.°248

Põe-se, assim, especificamente o problema da liberdade de expressão do pensamento - pedra de toque das liberdades - reconhecida, ou não, à generalidade dos Portugueses, nos últimos tempos.
Vejamos então.
O pensamento - todos o sabemos também - é um dom natural do homem, sinal e razão da sua própria existência - cogito, ergo sum, já se disse na antiguidade clássica - que não tem significado social, enquanto se move ou exercita no foro íntimo de cada um. Aí, o pensamento poderá, quando muito, ajudar-nos a moldar a nossa própria consciência, ou servir-nos de mero e discreto recreio espiritual.
É a sua "expressão" (na sociedade) que nos avisa das preocupações e nos dá conta das ideias (boas ou más) que germinam no cérebro humano. Só essa circunstância torna o pensamento válido.
E se todos os cidadãos, além de lhes ser lícito lutar individualmente pelos seus interesses privados, devem participar, como geralmente se entende, na realização do processo sócio-político do País, então, em boa lógica, ter-lhes-á de ser reconhecido também o direito de o fazer livremente, exprimindo ideias, formulando conceitos e propondo soluções, que, segundo o seu critério, melhor sirvam esse objectivo.
Mas se, como julgo ter demonstrado, a liberdade não pode ser exercida em termos absolutos, pelo condicionalismo da vida em sociedade, veremos de que modo, em meu entendimento, poderemos legitimamente usufruí-la, nas relações com a Nação, por ser este o aspecto que se deseja aqui tratar.
Seria absurdo admitir que determinada comunidade política surge ou renasce em cada geração. De modo diferente, partindo tantas vezes dos mais simples elementos geográficos e humanos, a Nação vai-se estruturando, erigindo e individualizando através dos tempos - quantos anos e séculos - por sacrifícios, renúncias, heroísmos e glórias, ditados também por ideais que transcendem os interesses individuais dos seus membros, porventura com vista à expansão universal de uma particular mensagem.
"O que nos une na mesma comunidade nacional", disse-o algures o Prof. Marcelo Caetano, "é a identidade de tradição, de fé religiosa, de língua, de manearas; a comunhão dos mesmos avós, da mesma história, da mesma literatura, das mesmas instituições; a veneração dos mesmos nomes, dos mesmos feitos e dos mesmos princípios morais; até o acatamento das mesmas estéticas e dos mesmos preconceitos consuctudinários."
Pois bem: nessa ingente tarefa de erguer e moldar uma pátria sempre algumas ideologias se banem, no seu longo processo genético, por inúteis ou nefastas, para que outros ideais, conceitos e valores se integrem e consubstanciem no corpo social.
Em vulgar imagem de que farei uso, as nações, como as catedrais, vão surgindo, pedra sobre pedra, dos alicerces à cúpula, exigindo bons materiais, segurança e até beleza. E também as catedrais nem por serem velhas perdem a sua permanente actualidade: os Jerónimos, a Batalha e Santa Maria de Alcobaça ainda hoje não são inferiores, mesmo na sua utilidade funcional, às modernas catedrais de cimento armado...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ora, no caso português, a vontade a acção, a experiência e a perseverança esclarecidas de muitas gerações, tantas vezes generosamente sacrificadas, quiseram fazer surgir e erguer a Nação à luz desses selectos princípios, valores e ideais, com o expresso repúdio de espúrias doutrinas, que sempre teriam rondado também a porta da casa lusitana, em difusas e estéreis comunicações ou mensagens dos Velhos do Restelo.
Foi então a gesta das conquistas, a epopeia dos mares, a dilatação da Fé e do Império, a nação multirracial e pluricontinental. Na ordem interna, foi ainda a Pátria de vocação messiânica, a família de moral cristã, a autoridade, a hierarquia e o homem criado à imagem e semelhança de Deus.
E foi por todos esses valores e em respeito deles que a Nação Portuguesa tomou a sua fisionomia própria, a sua unidade, a sua integral personalidade, imagem indelével que desejará manter, pela sua origem, pela sua história e pela sua presença humanista.
Assim quer permanecer e continuar no Mundo, embora sempre renovada com a seiva que vai no sangue da sua autêntica e generosa juventude, a par das conquistas da ciência e da técnica, que de valores morais e espirituais não estará ela carecida.
Não deveremos continuar apenas agarrados às tradições - dirão, no entanto, alguns; pois desse modo estagnaríamos, inertes, como as águas paradas de uma lagoa morta.
Esquecem estes que, para além dos interesses e valores referidos, havemos de contar sempre com a presença constante do "homem novo", revelado há 2000 anos, na sua imutável natureza, e ao qual as estruturas políticas, económicas e sociais se devem subordinar, sob pena de abreviarmos a queda ou a degradação do mesmo homem.
Esquecem ainda que o Estado Português, pela sua doutrina, e porque reconhece como seus limites a moral e o direito, se dirige à sua integral formação.
Por tudo isto, não podem os Portugueses de hoje consentir que, em nome de novas ou reeditadas ideologias, que para aí grassam, se vaze agora a Nação em moldes diferentes, com o abandono do património inestimável, que oito séculos de história acumularam, encaminhando-a - outro mérito não teriam - para um existencialismo materialista e, consequentemente, com os hábitos de vida meramente sensorial, a levem à degenerescência.
Aqui se deve, pois, redobrar de vigilância e o Estado não pode demitir-se dessa obrigação.
Se assim não fora, não faltariam ousados pluralistas e dialogantes, ainda que mergulhados na mais obscura mediocridade, ou defensores de anódinas doutrinas, para discutir, a cada passo e, porventura, condenar, destruindo, com as suas exóticas comunicações ou mensagens, os próprios alicerces dá Nação.
E retirar do edifício as primeiras pedras seria cavar a sua imediata ruína.
Serão, então, de repudiar todas as comunicações daqueles que vêem no respeito pelos valores tradicionais, informadores da nossa ordem social e política, a revelação de um mero "romantismo patrioteiro", pois, antes que românticas, me parecem profundamente realistas as instituições que nas últimas décadas puderam dotar o País de extraordinários bens e serviços, materiais e culturais, a que já não estava