O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

12 DE NOVEMBRO DE 1982 329

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, penso que é inútil estarmos a perder tempo com essa questão. O Sr. Deputado ficará na sua. a minha impressão não é essa. A Mesa. pela voz do Sr. Presidente, disse expressamente que não tendo havido nenhuma deliberação do Governo, não havia razão nenhuma para interromper a reunião. Nesse momento, o PCP pediu meia hora de intervalo, regressaram os Srs. Deputados, estamos em condições de reiniciar a reunião.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pulido.

O Sr. João Pulido (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O tema e a matéria versada no projecto de lei 309/II, apresentado pelo PCP a este Plenário e ora em discussão, é extraordinariamente grave. Merece profunda reflexão e amplo debate, para que ressaltem, a plena luz, os propósitos que lhe estão subjacentes e as devastações morais que para as famílias adviriam da sua aprovação. O partido político proponente deste projecto de lei, sem o devido respeito pela moral e pelas convicções do povo português, tenta vibrar um rude golpe na instituição familiar, procurando desse modo destruir a principal célula da sociedade portuguesa e abalar o baluarte de uma civilização milenária.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Nos nossos dias, isso já não se ouve!

O Orador: - Tenta-se, com este projecto de lei sobre o aborto provocado, verdadeiramente instituir uma monstruosidade social que por arrastamento, conduziria à degradante derrocada da sensibilidade da mulher e ao consequente sentimento afectivo da mãe.
Ninguém pode esquecer que o aborto contende com o direito natural que se lhe opõe, com a moral cristã que o repudia, com a alma colectiva do povo português cujas tradições o contestam e reprovam. O direito à vida é inviolável.
E, se os progenitores dão origem ao corpo do embrião, contudo, não o dão ao espírito que o informa, o qual é dádiva exclusiva da Providência.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Não estamos na missa! Isto é uma Assembleia pública!

O Orador: - E, se a nossa legislação, em que nos destacamos como pioneiros, rejeita a pena de morte, em todos os casos, mesmo aplicável a criminosos, com maior força de razão a deve profligar no respeitante a seres indefesos e inocentes que, afinal, são as vítimas em que o aborto crava as suas impiedosas e sanguinárias garras.
Daí a moral cristã impugnar o acto com frontalidade inabalável, com energia sem tréguas, com uma constância doutrinal que não admite tergiversações. E, por isso também, o nosso direito positivo sempre o tem sancionado com pesadas penas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As razões que a mãe, neste caso mãe degenerada, costuma invocar para justificar a eliminação do fruto que traz no seu ventre - mais precisamente, para matar o seu filho - não oferecem qualquer consistência, nem à luz de um entendimento imparcial, nem perante os ditames das consciências medianamente formadas e esclarecidas.
O argumento de que a mulher é livre para dispor do seu corpo, é falacioso, ilusório e inadequado ao caso vertente.

Protestos do PCP

Se pudesse dispor livremente do corpo, também seria lícito automutilar-se e tal é reprovável pela sociedade, pela Moral e até pelo Direito.
Mas, dado e não concedido que a mulher pudesse livremente dispor do seu corpo, a verdade é que nunca lhe assistiria o direito de dispor do corpo alheio, e o embrião ou feto que traz nas suas entranhas - o corpo do seu filho - é um todo biológico e anímico, diferenciado do seu e com individualidade própria. Individualidade que é diferente da de sua mãe, quer no aspecto físico, quer até no aspecto legal, uma vez que, no ordenamento jurídico-positivo, os nascituros já podem ser sujeitos de direitos independentes dos de sua mãe.
Também não se argumente que a mãe pode dispor do embrião ou feto, uma vez que foi ela que lhe transmitiu a vida e foi através dela que aquele se desenvolve. Nada menos exacto!, pois a geração é resultante da conjugação bilateral de dois seres, a mãe e o pai. E isto é verdade incontroversa em face de qualquer concepção que se tenha da vida e do homem, seja ela meramente hedonista ou até materialista.
Hoje, todos os cientistas aceitam como certo que a vida humana se inicia no momento da concepção. Ora o embrião e o feto do homem, é portador de uma vida que, em intercâmbio permanente e desde logo, se incorpora no todo social e enriquece o seu património com o nascimento. Mas, mais do que isso e muito para além da vida biológica, para quem tem fé, esse ser vivo e autónomo é escrínio de uma alma espiritual, de que só Deus pode dispor e que em caso nenhum a destruirá. Já se vê que os descrentes, os agnósticos, os que mergulham no materialismo, se riem deste argumento.
Mas, meus senhores, a maioria do povo português radica-se numa educação cristã e formação humanista e muito para além das fronteiras da matéria, vislumbra horizontes mais largos e mais límpidos.
Nesta época tão incerta e conturbada, haja ao menos o bom senso de não tentar roubar ao povo português mais esta crença sublime e este respeito profundo pela vida, não apenas do seu semelhante, mas dos seus próprios filhos. Eu até diria, com Junqueiro: - não se queira roubar ao pobre uma acha que ele possui para acender o lume...

Protesto do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: E, nem se venha argumentar ainda, que a mãe, porque é autora do embrião e ou do feto, o poderá reduzir a nada, sobretudo se nisso o pai consentir. Há coisas que depois de criadas ultrapassam a esfera da disponibilidade dos seus autores. Seja o caso de um monumento que, depois de erecto, pertence à sociedade, e nem os seus autores, arquitectos ou engenheiros, têm o direito de o destruir, tal como um filho que, a partir da gestação, constitui parte integrante da sociedade.
E, como as leis são feitas para os homens, e não os homens para as leis, daí deflui a estrita obrigação para o legislador, na feitura das normas reguladoras da conduta social, de respeitar a concepção da maioria dos cidadãos, não lesando o modo de ser colectivo que. muitas vezes, mergulha raízes na grandeza da sua história e nos recônditos mais sagrados das suas crenças e tradições.GG
Só não é assim, naqueles Estados em que o direito se identifica com a vontade ditatorial dos chefes ou com a desumana tirania dos grupos de vanguarda, para quem o