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332 I SÉRIE - NÚMERO 12

Relativamente ao Sr. Deputado Arnaut, queria dizer-lhe que as referências que faz, de existirem católicos ou até indivíduos destacados na hierarquia da Igreja que admitem o aborto, esses que o admitem e não é pôr em dúvida a sua palavra, mas não conheço texto nenhum que o defenda - só o podem fazer no caso que referi, da intervenção que visa salvar a mãe e que, como corolário ou consequência, vem provocar a morte prematura do filho. Só nesse caso e mais nenhum.

Vozes do PS e do PCP: - Olha! Está a beber água!

O Orador: - Com certeza, que é a água que me satisfaz mas aquela que não afogará VV. Ex.ªs Queira Deus que, no último momento, esta água -ainda que não Benta- os esclareça, para que consigam o que todos queremos.

Risos do PS, do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.

Podem rir-se. Eu, desassombradamente, sou o que sou, não me nego a mim próprio.

O Sr. António Arnaut (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado António Arnaut, mas concede-me o seu tempo, porque eu não tenho.

O Sr. António Arnaut (PS): - Naturalmente, Sr. Deputado.

O Orador: - Então, Sr. Deputado, usarei do seu tempo, a seguir.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Deputado João Pulido, não sei se a água nos esclarece, porque presumo que a água que V. Ex.ª bebeu não é Benta...

O Sr. João Pulido (CDS): - Eu disse-o!

O Sr. António Arnaut (PS): - ... em todo o caso perguntava-lhe - porque não entendi bem - se V. Ex.ª admite o aborto terapêutico.

O Sr. João Pulido (CDS): - Ora bem, repare que essa designação de aborto terapêutico - e este caso que referi é terapêutico- presta-se a uma latitude de tal ordem, que prefiro designá-lo por morte prematura do feto, em consequência da intervenção para salvar a mãe. De facto, é um aborto, mas não é aquele protótipo que se pode criar que, à sombra da designação e terapêutico, se presta a toda a espécie de casos.
Portanto, este tipo de aborto, que é consequência da intervenção que tem como finalidade salvar a mãe, é, incontestavelmente, uma morte prematura. Mas não foi violento, não foi a interrupção violenta e directa ao feto, é consequência do salvamento da mãe, o que é totalmente diferente. Era isto que queria dizer.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Ao propor a legalização da interrupção voluntária da gravidez, conjuntamente com medidas
relativas à protecção e defesa da maternidade, planeamento familiar e educação sexual, o PCP apresentou a única solução que dá uma resposta global à necessidade de eliminação do flagelo social que é o aborto clandestino.
Vale a pena situar a questão, mas situá-la objectivamente. E isso que esperam os milhares e milhares de mulheres atingidas pelo sistema punitivo vigente há cerca de 100 anos.
Também, como por todo o mundo, nesta evolução que naturalmente tem surgido na moldura penal do aborto, teremos que discutir os argumentos sérios e confrontá-los com o desespero dos obscurantistas.
E importa começar por saber, se há uma consciência colectiva de que o aborto é um crime. Importa é averiguar se a censura penal existente, se a penalização do aborto, tem alguma correspondência nessa consciência colectiva.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - É preciso saber se a proibição absoluta de todas as formas de aborto é um meio adequado ao seu combate. É preciso saber, a margem de liberdade que a Constituição dá ao legislador, para acabar com a censura penal absoluta existente. E ainda, Srs. Deputados, é preciso saber que outras medidas é que decorrem do quadro constitucional para acabar com o aborto clandestino.
O problema foi já tratado em parecer da Procuradoria-Geral da República, a solicitação do Sr. Ministro da Justiça. A doutrina tem-se debruçado sobre o assunto, atenta à interrupção voluntária da gravidez a que naturalmente se chegou por todo o mundo. A Comissão Governamental da Condição Feminina deu o seu parecer a solicitação do Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro. E não há dissonâncias Srs. Deputados. Quando as questões são vistas à luz de critérios objectivos, sem pendores retrógrados, como acabámos de ouvir, as respostas apontam para que também nós acompanhemos a evolução natural da quase totalidade dos países.
A primeira reacção dos sectores que pretendem manter, a todo o custo, a proibição do aborto aquando da entrega na Mesa da Assembleia da República dos 3 projectos de lei do PCP, foi exclamar que deles constariam soluções inconstitucionais não devendo sequer ser admitidos. Felizmente, na Assembleia da República, tal posição não encontrou o eco que era pretendido.
Foi com o mesmo objectivo, certamente, que o Sr. Ministro da Justiça requereu à Procuradoria-Geral da República a informação parecer sobre o projecto de lei do PCP que atrás referi. Mas se pretendia que a Procuradoria caucionasse supostas inconstitucionalidades do projecto, o que sucedeu foi precisamente o contrário. Na verdade, o artigo 24.º da Constituição da República estabelece no seu n.º 1 que a vida humana é inviolável. Questão difícil será a de saber quando começa a vida humana. Mas nesta matéria, o legislador e o intérprete não podem enredar-se, como se diz no parecer da Procuradoria-Geral da República, na discussão de «concepções pré ou metas jurídicas, do mais variado cariz, desde as biológicas às morais e religiosas sem esquecer as de ordem filosófica». Outro tem de ser o caminho do intérprete. Dos vários textos legislativos, há que tentar recolher qual a concepção jurídica de vida humana, neste caso para efeitos penais. A Procuradoria-