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392 I SÉRIE-NÚMERO 12

Sr. Presidente. Srs. Deputados: O reconhecimento efectivo do valor social da maternidade, mesmo entendida como um direito que deve ser livre e conscientemente assumido e como componente importante da emancipação da mulher, nem fica assegurado e é mesmo incompatível com medidas legislativas que fossem no sentido da liberalização do aborto. A prática do aborto é mesmo, a todas as luzes, a negação do valor social da maternidade: representa a submissão da mulher a valores negativos: sujeita-a, mais do que a liberta. Sugerir como se faz e reivindica a legitimação do aborto como forma de evitar os «profundos traumas que afectam milhares de mulheres que. no desconhecimento da sua fisiologia e dos métodos de controle da sua fertilidade, se vêem sujeitas a gravidezes sucessivas», significa, à partida, descrer dos métodos modernos de planeamento familiar: desligitima. de todo em todo, o aborto praticado por mulheres sem filhos e não valora os consabidos traumas, quer físicos, quer psíquicos, quer sociais e morais que em geral se seguem a uma gravidez voluntariamente interrompida.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O cortejo das consequências advenientes das práticas abortivas, mesmo em clínicas especializadas, não podem ser escamoteadas. Apesar de legalizado e bem assistido em alguns países, a verdade é que é a própria ciência médica a afirmar que o aborto é duas vezes mais provável de causar a morte à mulher do que um parto normal.

Protestos do PCP.

Por outro lado, médicos das mais diversas nacionalidades assinalam as inúmeras complicações a que os abortos podem e dão origem, em percentagens não desprezíveis: infecções, hemorragias, rasgões do colo do útero, perfurações da matriz, perturbações psíquicas e angústias de todo o género, propensão para abortos espontâneos futuros, maior risco de gravidezes extra-uterinas e de partos prematuros, enfim, de um modo geral, degradação da saúde.
Dir-se-á ficar de pé o argumento dos abortos clandestinos, feitos em piores condições e circunstâncias e, assim, multiplicadores de riscos para a saúde física e mental da mulher. Seria, sobretudo ou também em vista deles e do seu elevado número, que a liberalização do aborto se imporia. Mas ainda aqui se esquece a lição alheia. E essa é a de que. acto seguido à liberalização do aborto, o número destes tem-se multiplicado nos mais diversos países. É que a mulher vê-se tentada a recorrer ao aborto, em vez de utilizar métodos de controle de nascimentos. E se isso é factor de multiplicação dos abortos, nem por isso os clandestinos diminuem, por razões que vão desde a insuficiência dos estabelecimentos de saúde apropriados ou de deficiente cobertura territorial, até à voluntária retracção de muitas mulheres temerosas do processo legal de aborto, dado que a consciência e moral de muitas delas continua a reprovar o que em geral praticam como acto excepcional da sua vida.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não é, assim, pela via da legalização do aborto que os clandestinos se eliminam, com a contrapartida de os legais aumentarem.
Embora desconfiemos dos números que para aí se adiantam quanto aos abortos clandestinos supostamente praticados no nosso país - visto que tanto ouvimos falar em 100000 como em 300000. Que estatística é esta que vai de l para 3 - não seremos nós a negar a triste realidade social que eles traduzem. Também não nos parece que a legislação penal em perspectiva venha resolver, por si só. o problema, embora a esse respeito nos reservemos para discutir as suas implicações, significado e alcance, aquando do debate do pedido de ratificação pendente nesta Assembleia do decreto-lei que aprovou o novo Código Penal. A nossa convicção é porém a de que com adequadas, prontas e alargadas medidas a tomar de ordem económica e social nos campos da saúde, habitação, promoção cultural e económica; com medidas atinentes a uma eficaz protecção da paternidade e da maternidade e com o funcionamento generalizado e eficiente de um serviço nacional de planeamento familiar, se reduzirão ao mínimo as sequelas dessa chaga social que é, de facto, o aborto clandestino.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Referindo-nos agora de uma forma mais directa ao projecto de lei n.º 309/II, do PCP, teremos de {dizer que ele assenta, do nosso ponto de vista, numa base de filosofia errada e inaceitável, na generalidade, na medida em que acolhe a ideia da liberdade da mulher para só assumir a maternidade desejada e na medida em que põe em causa - embora por forma relativamente mitigada como decorre do articulado - o primado da vida, como alfa e ómega que é de todos os valores humanos.
Numa apreciação breve dos casos em que a interrupção da gravidez poderia ser legalmente praticada, segundo a economia do projecto, diríamos da nossa sensibilidade face aos crimes de violação de que resulte gravidez. Estamos, a este propósito, a lembrar-nos da violação que teve lugar, no ex-Congo Belga, de um número considerável de mulheres pertencentes a uma ordem religiosa, acerca de cujo caso moralistas de autoridade, como Bernard Haering. preconizavam a possibilidade do aborto provocado, se por ele pessoalmente se responsabilizassem aquelas vítimas de um crime hediondo, o que aliás não veio a acontecer, suportando o Estado Belga todos os encargos de assistência futura às crianças nascidas nas referidas ciscunstâncias. De igual modo nos sensibilizam os casos previstos na alínea a) do artigo 5.º, ou sejam aqueles em que se procura remover um perigo de morte ou de grave lesão da saúde da mulher grávida. Aqui se configuram, naturalmente, casos de cancro evasivo do útero, que atingem sempre o feto pelo desenvolvimento acelerado das células cancerígenas e os de gravidez ectópica, extra-uterina, numa das trompas. Só que, em qualquer destes casos, se não tratará de aborto, mas de intervenções cirúrgicas ou tratamentos na mulher, em ordem a libertá-la de um mal de que pode ser salva, quando até se sabe que o feto já nenhuma hipótese teria de sobrevivência. E o que costuma denominar-se «salvar o salvável».
Pondo de lado os casos também previstos de interrupção da gravidez por razões de carência económica ou em razão de situação familiar - os mais flagrantemente violadores dos princípios que vimos destacando e defendendo - já exigem um outro aprofundamento os casos que respeitam à remoção de perigo de lesão da saúde física ou psíquica da mulher, os de risco de que o nas-