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7 DE DEZEMBRO DE 1984 919

Recentemente, houve aqui uma outra discussão em que, creio, não intervim, embora tenha estado um pouco na génese dessa medida que foi a correcção (justíssima) do vencimento do Sr. Presidente da República, que nessa altura já ganhava menos do que alguns dos seus colaboradores mais directos da sua Casa Civil e da sua Casa Militar.
Era um desprestígio para as instituições democráticas que um Presidente da República ganhasse qualquer coisa como 60 000$. Apesar disso, essa solução foi apodrecendo, também em nome de uma certa demagogia que acha que a classe política deve ser penalizada porque estar no poder já é, em si, uma remuneração suficiente. Não obstante, exige-se esforço, exige-se zelo, exige-se dignidade, exige-se independência, exige-se seriedade, mas sujeitam-se os agentes políticos a situações de verdadeira carência familiar.
De qualquer modo, penso que, quase por unanimidade, fez-se a correcção justíssima do vencimento do Sr. Presidente da República.
A partir daí, tínhamos o vértice da pirâmide e voltámos a tomar consciência de que faltava uma unidade sistémica na remuneração dos membros dos órgãos de soberania ou da classe política, como se queira chamar, embora eu não goste muito desta designação. Tratámos, então, de conceber um sistema em que, a partir desse vértice, se construísse a pirâmide com critérios de justiça.
O Governo entendeu que devia ser ele a tomar uma iniciativa neste domínio porque, embora a competência para aprovar os aumentos e as correcções dos vencimentos dos membros dos órgãos de soberania caiba (e muito bem!) à Assembleia da República e a decisão tenha que ser, por força da Constituição, uma decisão, de algum modo, em causa própria e também, de algum modo, em causa alheia -, achou que ela não deveria partir daqueles que se teriam de pronunciar também sobre o seu próprio vencimento.
Assim, entendeu o Governo que devia ser ele a construir uma hipótese de pirâmide e, perfeitamente à vontade, mandou para aqui uma proposta que pode ter defeitos, pode ter vantagens - a última palavra cabe aos Srs. Deputados - mas em que o Governo está tão à vontade que, por exemplo, se essa proposta for aprovada, eu, na qualidade de Ministro de Estado, ganharei mais 3800$, o que é o preço de um dos bons charutos que fuma, todos os dias, o Fidel Castro em Cuba.

Aplausos do PS, do PSD, e da ASDI.

Portanto, também não se pode dizer que o Governo tenha feito uma proposta em causa própria. Essa mesma correcção dos 3800$, não nasceu tanto da necessidade de corrigir para mais o vencimento dos ministros mas da necessidade de encontrar uma percentagem em relação ao vencimento do Presidente da República. O Governo resolveu construir a pirâmide por escalões a partir do vencimento do Presidente da República. Assim, em relação a esse vencimento 0 Presidente da República ganhará 80 %, o primeiro-ministro 75 %, os ministros 65 %, os secretários de Estado 60 % e os subsecretários de Estado 55 %. Os deputados, segundo a proposta do Governo e contra a proposta que aqui foi aprovada e que foi vetada - mas, certamente, não por essa razão -, ganharão menos do que ganhariam nessa altura, porque agora nem sequer ficam equiparados a um subsecretário de Estado quanto mais a um secretário de Estado. E continuo a dizer - como, aliás, disse na altura em que estava na oposição - que não vejo sérias razões para que um deputado, eleito directamente pelo povo português, e sendo assim o seu mais legítimo representante, ganhe menos do que um subsecretário de Estado ou mesmo do que um secretário de Estado. Continuo a não ver razões para isso mas, enfim, é um ponto de vista pessoal que é contestável.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pensou-se também que a classe política, assim denominada - embora eu continue a não gostar da designação; prefiro mais a expressão «carreira política» porque penso que devemos definir uma carreira e não tanto uma classe -, não deve continuar a ser uma expressão de amadorismo, como até aqui tem sido um Portugal, em que as pessoa interrompem a sua profissão sem nenhuma garantia quanto ao futuro, desequilibram a sua vida profissional e, por vezes, familiar, deixam de poder prestar assistência de espécie alguma à sua família, enfim, sacrificam tudo e mais alguma coisa para depois a sociedade lhes dizer: tem paciência, já te chega a glória de seres ministro, ou secretário de Estado, ou deputado, passa a tua fomezinha porque também há por aí fome neste país. E já sei que, com certeza, há quem, demagogicamente, venha dizer: mas como, nesta oportunidade em que há salários em atraso, em que há miséria, em que há carências fundamentais no domínio da habitação e da saúde...

Vozes do PCP: - Muito bem.

O Orador: - Estou de acordo que essas carências existem e que há algum fundamento para nos preocuparmos com isso. Também sei que normalmente se diz «os ricos que paguem a crise», embora me pareça que não seja bem o caso da classe política, que não está, com certeza, integrada na classe dos ricos.
O que eu entendo é que se estamos à procura de uma oportunidade para dignificar a classe política, para também fazer justiça à classe política, para termos uma classe política ao nível das outras democracias, às quais queremos pertencer e emparelhar no âmbito da CEE, se assim é, se queremos ultrapassar a fase do amadorismo, a fase do biscate, a fase de estarmos aqui um bocadinho e irmos fazer uma minuta ou acabarmos de assinar um projecto, se é essa a nossa concepção de classe política nunca mais teremos democracia em Portugal.
Eu podia dizer, como disse Jesus Cristo - mas não o farei -, «pobres sempre os haverá». Mas um socialista não pode dizer isto porque já se demonstrou que é possível não haver pobreza. E há, de facto, países onde não há pobreza no sentido em que o bom Jesus Cristo encarou o problema.
Mas o que eu penso é que um socialista tem de combater a pobreza e deve fazê-lo.
O meu ponto de vista é que aquilo que se gasta a mais com a dignificação da classe política, é menos do que metade, um terço, um quarto, e até um quinto do que se paga em qualquer das democracias europeias. 15to porque continuaremos a ser os políticos europeus, de longe, mais mal pagos. Basta dizer, por exemplo, que em Espanha a relação entre o