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1158 I SÉRIE - NÚMERO 31

O Orador: - E é aqui que o Partido Socialista assume uma imensa responsabilidade, deixando-se enredar nessa estratégia, aceitando em nome de uma estabilidade, que é cada vez mais sinónimo de adiamento, cedências e compromissos que, quando não são paralisantes, se traduzem no desenvolvimento - à sua própria custa - das opções políticas do seu parceiro, que desse modo vai podendo fazer (permita-se-me a expressão) "o mal e a caramunha".
Ele próprio ou, como é o caso, neste momento, por interposto partido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: A nossa posição em face do Governo é conhecida. Como conhecidas são as reservas que sempre manifestámos em relação à coligação. Recusámos essa fórmula desde o início, não porque para nós fosse essa a questão essencial, mas porque a experiência concreta de três anos de governos liderados pelo PSD nada deixavam augurar de bom quanto a um executivo que de novo o integrasse. Os factos vieram dar-nos razão.
Ao cabo de ano e meio de governo as questões fundamentais permanecem em aberto, os grandes problemas continuam não diria sem solução, porque só por estultícia se poderia admitir serem solucionáveis nesse espaço de tempo, mas sem que para eles se vislumbre um começo de resposta.
Dissemos, ao longo destes meses, que as medidas de emergência e que as acções conjunturais careciam de sentido quando desenquadradas de um plano de transformação económica, que não havia dois tempos: um para a conjuntura, outro para a estrutura; que as acções a um e outro nível exigem uma coerência global e têm de avançar de par.
Pregámos no deserto. Os resultados estão à vista. Ter-se-á porventura atalhado alguns dos sintomas da crise, atenuando-se certos desequilíbrios financeiros; não se atacou a doença, e o mal foi-se agravando.
E estamos hoje condenados - ao que parece - a vermos repetir-se a mesma terapêutica dos sintomas, envolvida pelas mesmas solenes declarações de propósitos e acompanhada pelos sempre úteis discursos - quando minguam os argumentos - sobre o peso esmagador do sector público, o espartilho da Constituição, a crise internacional ou a herança recebida, cujo valor atenuante dir-se-ia que vai aumentando à medida que aumentam os testadores e que já não é só a herança gonçalvista mas também a da AD.
O que aliás, no caso do PSD (permitam-me o parêntesis), revela um curioso desdobramento de personalidade: como testador, vai-nos dizendo que, se nos não deixou o melhor dos mundos, deixou-nos um mundo que para lá caminhava; como herdeiro, proclama que se não recebeu o caos recebeu um mundo à sua beira.
Estamos condenados, ao que parece, a ver repetirem-se os discursos sobre o rigor, que se traduzem na prática num défice orçamental agravado em muitas dezenas de milhões de contos; os discursos sobre o combate à corrupção cujo proliferar todos os dias se vê denunciado - mesmo que não provado - mas se não vê nem desmentido nem reprimido; sobre as reformas estruturais cujos contornos e conteúdo não são definidos nem aprofundados; condenados afinal às medidas avulsas que o PSD vai impondo e cujo custo o Partido Socialista vai pagando, ao mesmo tempo que o Governo, e indirectamente o País, vai sendo submetido ao "duche escocês" dos conselhos nacionais do PSD.
Por quanto tempo?
Atrever-me-ia a dizer que, se não se arrepiar caminho, pelo tempo necessário para que se complete o desgaste do Partido Socialista e com ele da própria ideia de socialismo democrático.
E em nome de quê?
Da estabilidade, da ausência de alternativas, do pragmatismo político.
Mas se a estabilidade é um valor, não é um valor absoluto. Não se confunde com a imobilidade, não pode ter esse custo; menos ainda se pode traduzir no adiar sistemático de opções fundamentais e ter como preço a ausência de qualquer outro projecto que não o da manutenção dessa estabilidade sem perspectivas nem futuro.
Do mesmo modo que nenhum governo, nenhuma política, se pode justificar em democracia com o argumento de que para ela não existiria alternativa no quadro institucional. Não fomos nós que dissemos e repetimos, por muitas vezes, que, em democracia, há sempre uma alternativa!
E se o pragmatismo pode ser saudável, na exacta medida em que corresponda à capacidade de adaptação à conjuntura, quando se pretende fazer do pragmatismo o deus ex-machina de toda a acção política vão-se, pouco a pouco, perdendo todos os referenciais ideológicos que mais não são que os valores e princípios que dão uma dimensão ética a essa acção política sem a qual não haverá nunca um projecto mobilizador da vontade colectiva.
Disse aqui mesmo - perdõem-me a petulância da autocitação -, em Junho de 1983, guando da discussão do Programa do Governo, que a crise só seria vencida consolidando-se do mesmo passo o regime democrático, se para tanto o Governo fosse capaz de mobilizar a vontade colectiva, empenhando-a num projecto que não podia - nem pode - ter como horizonte a conjuntura, mas capaz de dar às acções, que a conjuntura impõe, um sentido que a ultrapasse. Acrescentava que, nesse aspecto, o Programa do Governo era, aos nossos olhos, pobre.
Direi agora que a sua prática ainda lhe ficou aquém.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, se a nossa atitude foi - como, pelo menos, alguns de vós se recordarão - de reserva e expectativa, hoje, porque não se alicerça já na valoração de propósitos e de promessas, mas nos elementos objectivos que ano e meio de governo foram carreando, essa atitude não pode deixar de ser de frontal desacordo.
Daí que lhe tenhamos recusado a nossa confiança quando nos foi solicitada nesta Câmara.
Mas se hoje, como nessa data, a nossa posição é de frontal desacordo, nem por isso daremos o nosso voto favorável à moção de censura do CDS.
Não porque consideremos que este Governo esteja ao abrigo de qualquer censura, mas porque esta censura não é exactamente uma censura qualquer. É uma censura que se justifica em nome de opções ideológicas e políticas que recusamos - mas isso seria talvez o menos importante - e se justifica em nome de uma estratégia a que nos opomos com a mesma frontalidade com que nos opomos ao Governo.
Estratégia que não comporta em si própria o derrube imediato desse Governo para cuja política o CDS não tem alternativa, mas cujo desenvolvimento assenta