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I SÉRIE -NÚMERO 94

As sociedades contemporâneas são muito complexas. Exigem uma formação especial não só para se compreender a sua organização, a sua estrutura e funcionamento, mas também para se adquirir as competências e os conhecimentos necessários a uma cidadania activa e responsável.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem !

O Orador: - Daí a obrigação que as escolas têm de oferecer aos seus alunos uma sólida educação cívico-política e elevar os seus conhecimentos, neste domínio, ao mesmo nível que os restantes conhecimentos humanistas ou científicos.
Sempre que se fazem esforços para introduzir a educação cívica nas escolas, verifica-se que este tema, regra geral, é visto como um assunto de importância secundária. Tal atitude deve-se ao facto de, na prática, ser difícil fixar os objectivos afectivos e ligados ao comportamento, e ainda mais difícil, encontrar os meios adequados para atingir e avaliar os mesmos.
As escolas, tradicionalmente habituadas a ocupar-se de temas académicos e intelectuais, sentem-se um pouco embaraçadas ao abordar outros aspectos do desenvolvimento da personalidade do jovem.
A educação cívica é assim considerada, em todos os países em que foi introduzida, como uma disciplina inferior e até contendo um certo risco, uma fonte de conflitos potenciais, enfim, uma matéria difícil de ensinar.
Sem menosprezar tais riscos, a verdade é que tudo melhora desde que os professores encarregados de tal disciplina obtenham previamente uma boa formação nos assuntos a tratar, desde que se confira à Educação Cívica o mesmo estatuto científico e educativo dado a outras disciplinas, e ainda, desde que a disciplina seja autónoma, com tempos próprios, os seus objectivos e conteúdos bem definidos, e apresente uma metodologia rigorosa, sem esquecer o clima democrático que deve existir na escola.
É igualmente muito importante apresentar a Educação Cívica de modo que os jovens a considerem atraente e interessante. O aluno não aprende, facilmente, aquilo que o não motiva. No caso da Educação Cívica, isto é ainda mais verdadeiro, na medida em que são ensinados temas que visam modificar as atitudes do aluno, podendo o desinteresse provocado numa turma não motivada, ser transferido para a disciplina em causa.
Para evitar tal perigo, importa tratar os problemas da vida real, apropriados a cada grupo de idades, e que sejam familiares aos alunos.
A Educação Cívica deve compreender o conhecimento e valorização dos elementos estruturais e culturais da comunidade - história, geografia, economia, organização política e social, etc. -, a formação de uma consciência cívica, feita de princípios, sentimentos e atitudes, que vão desde a solidariedade ao respeito das pessoas e valores, à defesa e luta dos direitos e liberdade de todos, e ainda, o exercício da vida cívica no desempenho das funções que competem a cada um.
A Educação Cívica deve cultivar nos jovens as virtudes que fundamentam uma sociedade civilizada e democrática, desde a busca da verdade e a confiança nas potencialidades humanas, ao respeito de si próprio e dos outros, passando pelo espírito de solidariedade e de cooperação, e recusa firme do racismo, o reconhe-

cimento do sentido universal de todas as culturas, o amor da Pátria.

Os programas da Educação Cívica, divididos em várias fases, devem cobrir um vasto leque de temas, desde o ensino primário até aos últimos anos do ensino secundário.
Numa primeira fase, deve consistir na aprendizagem das regras fundamentais da vida em sociedade, sem esquecer os símbolos da República Portuguesa, as noções de pessoa, propriedade e contrato, a unidade e identidade nacional, o direito de voto e o sufrágio universal, e ainda os problemas sociais e ecológicos.

Numa segunda fase, poderiam estudar-se a Declaração Universal dos Direitos do Homem, as liberdades e os direitos, as instituições portuguesas e internacionais, a nossa Constituição, a organização administrativa da República, as práticas sociais, o papel de Portugal na Europa e no Mundo, sem esquecer as forças armadas e a defesa nacional, enfim, a solidariedade entre os povos, os grandes problemas do nosso mundo contemporâneo, etc.

Na maior parte dos países ocidentais existem cursos de educação cívica nos primeiros anos do programa secundário (11 anos aos 14 anos), idade considerada como a mais receptiva para começar a tratar estes assuntos.
Em Portugal, deixando de lado algumas experiências bem interessantes dos finais do século XIX e do tempo da I República, após a revolução de 25 de Abril, no ano escolar de 1975-1976, procedeu-se à introdução experimental de um curso de Educação Cívica.

O governo de então, teoricamente preocupado com a preparação dos jovens para a democracia, introduziu as ciências sociais nos programas do 7.º ano de escolaridade, o último ano de escolaridade obrigatória.

Esta disciplina procurava sensibilizar os alunos para os problemas da colectividade - visitas a fábricas, contactos com os trabalhadores, estudo do património cultural, etc. - e levar os alunos a pensar em soluções possíveis para tais problemas, utilizando, para tal, os conhecimentos adquiridos no programa escolar, com vista a uma integração multidisciplinar dinâmica e criativa.

Ao mesmo tempo, os cursos complementares da chamada «Introdução à Política» com a duração de 2 anos, apresentavam como objecto de estudo as principais ideologias políticas e a Constituição Portuguesa.
As duas disciplinas visavam à formação democrática dos jovens, uma tratando-a a partir de dados concretos da realidade, a outra através de um estudo de cultura política.

A planificação, teoricamente inovadora, não impediu que, passados 3 anos, estas cadeiras fossem abandonadas.

As causas de tal fracasso foram numerosas e complexas, desde as dificuldades que sempre se encontram quando se inova a prática, até à falta de textos de apoio e de recursos escolares para estes programas, assim como uma inadequada formação dos educadores, aliada a uma forte vontade de proselitismo político manifestada por certos professores, o que veio a provocar, naturalmente, as reacções hostis dos pais dos alunos e dos próprios alunos.

Assim, não é de surpreender que tal projecto tenha fracassado, numa sociedade então profundamente marcada e agitada pelos anos de ditadura e da sua queda.