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3 DE NOVEMBRO DE 1986 165

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amara! (PCP): - Pode-me dizer quais foram as outras entidades que foram consultadas e em que princípios baseia a postergação dos princípios gerais de direito administrativo e, nomeadamente, o regime do Decreto-Lei n.º 100/84?

Amaro (PCP): - Isso é difícil de o Sr. dizer!

O Orador: - Trata-se, realmente, de um parecer, e o indeferimento tácito não tem nada a ver com esse parecer.
Neste momento, a nossa proposta é precisamente a resultante de uma solução intermédia entre a iniciativa legislativa proposta pelo Sr. Deputado Silva Marques, do PSD, e a resolução e conclusão a que tínhamos chegado anteriormente na própria Comissão.

O Sr. João Amaral (PCP): - Não percebi nada!

O Orador: - Entendeu-se, pois, que era uma solução intermédia que, efectivamente, também acautelava todos os objectivos que em princípio pretendíamos salvaguardar e acautelar.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho de Sousa.

O Sr. Agostinho de Sousa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto, contrariamente àquilo que pode parecer, não é só o que os três artigos retratam, aliás, no nosso entendimento, de maneira menos feliz.
Surgido e concretizado sem grandes ondas, muito discreto e com pouca roupa, passaria quase despercebido na sua aparente singeleza, até pelo aparente toque de arejamento e de renovação que exibe - sublinho «aparente» - ao atribuir às câmaras municipais o poder decisivo de deferir ou indeferir a concessão ou a renovação do licenciamento. Felizmente que o projecto chega ao Plenário para sofrer as transformações ajustadas. Tomá-lo como nos aparece seria um grave equívoco, como procurarei evidenciar.
É essencial que se clarifique previamente uma situação de melindre. O que está em causa, em essência, não é a transferência para as câmaras de poderes decisórios, porque, se assim fosse, apoiaríamos o projecto com mais ou menos correcções.
Todavia, este bombom dado ao poder local, que, numa associação menos pura de ideias, até poderia ser visto como um jogo de perícia e de diversão, deve avaliar-se e valorizar-se num outro quadro. O problema tem uma natureza, limites e alcance que o projecto não revela e, muito menos, resolve.
O jogo está a tornar-se um dos imperadores deste País. Lentamente apodera-se dele, sobretudo de uma parte do país mais vulnerável, da juventude e das pessoas de economia débil. As máquinas de diversão integram já o sistema. Pelo uso indevido que delas se faz, pelo degrau que representam no acesso aos jogos de azar e pela atracção descontrolada que mobilizam,
constituem autenticamente, no quadro em que funcionam, uma praga nacional cuja projecção, em termos de danos, reclama medidas de simétrica importância e responsabilidade e não «medidazinhas».
Com as autorizações para as zonas de jogo das Pedras Salgadas e de Tróia, passámos a ter mais casinos do que dias de semana; o número de salas de bingo aproxima-se da meia centena; os casinos clandestinos não param; a lotaria continua, o totobola estabiliza; e o totoloto revoluciona. O jogo cresce na razão directa da crise como um seu apêndice parasita. As máquinas já conquistaram o seu lugar no carrossel.
Infelizmente, este projecto passa ao largo destas questões, carece da dimensão mínima adequada para operar correcções convincentes e enferma de uma perspectiva e de um alcance claramente redutores, com a agravante de alimentar a falsa ideia de um reforço de confiança no poder local. Não pode ser um aspecto favorável em aparência, aliás distorcido, que o pode tornar credível e viável. Calçou-se a luva limpa, mas não se lavou a mão.
Uma solução que se apoia numa simples vertente de transferência de poderes finais de uma para outra autoridade, mas que se alheia de toda uma realidade social e económica envolvente, ignora a leitura, as conclusões e a intervenção de psicólogos, educadores, pais, sociólogos, economistas, políticos e a influência dessas áreas, não fixa sequer critérios objectivos de decisão e não mede riscos políticos, não se destina seguramente a atenuar de facto e menos a eliminar os vícios de uma situação degradada e complexa.
Mais do que corresponder a uma conveniência de actuar sobre o momento, constituir um trabalho de fingimento e se alhear de realidades decisivas, é susceptível de pôr em causa o próprio crédito e prestígio desta Assembleia.
Há uma discordância e uma revolta mais ou menos veemente e generalizada da população contra o que acontece neste domínio. Ex.ª - pode dizer-se - uma questão nacional sensível. A opinião pública espera e exige de nós um remédio bastante e, sobretudo, com a eficácia e a dignidade intelectual, moral e institucional adequadas.
Se o nosso receio é especialmente o de enfrentarmos a nossa consciência, a responsabilidade política de uma opção não é ignorável. Os cidadãos e as próprias autoridades directa ou indirectamente envolvidas neste problema interrogar-se-ão legitimamente sobre o valor, a qualidade e a eficiência desta escolha. É mais um teste à nossa responsabilidade.
Inclusive, não se tomam em linha de conta os efeitos paralelos ou os que, por arrastamento, se geram em torno do fenómeno a nível familiar, escolar e social: a atracção pela marginalidade, os vícios na formação de adolescentes e jovens, a proliferação de negócios de droga e de prostituição, o contrabando e as fugas à tributação. Poupemo-nos, Srs. Deputados, aos protestos justificados lesivos do crédito institucional. Basta-os o que os nossos detractores manipulam.
Mas ainda há um outro risco: a proliferação indiscriminada de máquinas e a sua instalação anárquica têm uma autoria política bem definida. Quem provocou a doença deve assumir bem caro o seu tratamento e não querer arrastar terceiros inculpados para uma solidarização na permanência atenuada do vírus.