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5 DE DEZEMBRO DE 1986 845

na CNP; à inscrição de 260 000 contos para a ANOP; a outras alterações nas áreas da cooperação, Inspecção-Geral do Trabalho; à eliminação de múltiplas normas que inconstitucionalmente procuravam dar ao Governo cheques em branco para novas benesses aos grupos económicos.
É sabido, entretanto, que quer o Governo quer meios de comunicação social que lhe são afectos têm procurado minimizar o significado político das alterações introduzidas no Orçamento. Compreende-se porquê. Mas, para que não subsistam dúvidas, salientarei cinco outras alterações: a introdução de um artigo que proíbe o recurso a publicidade paga para autopropaganda do Governo; a proibição de venda indiscriminada das participações do Estado; a norma que obriga o Governo a transferir por duodécimos as dotações para as empresas públicas de comunicação social; o corte de verbas na rubrica «aquisição de serviços»; a imposição de prestação de informações em numerosas áreas.
Qualquer destas cinco normas tem um claro significado: a maioria da Assembleia exprime, através delas, a sua desconfiança na prática política e orçamental do Governo, quer impondo-lhe certas obrigações quer proibindo-lhe certos actos.
Pode evidentemente afirmar-se que certas alterações necessárias não foram introduzidas. Da nossa parte, lamentamos profundamente que não tenham sido reforçadas as verbas para as empresas públicas, que não tenha sido desagravada em termos reais a carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho decorrentes dos impostos profissional e complementar, que não tenham sido eliminadas benesses aos grandes grupos económicos.
São factos negativos, mas cuja maior relevância é a de sublinharem esta contradição fundamental: alguns dos partidos que aqui, e nos termos que já referi, rejeitaram as opções de política económica e social do Governo, alteraram em múltiplos aspectos o Orçamento e aprovaram normas que exprimem a sua real desconfiança no Governo hesitam em assumir simultaneamente todas as consequências dessas posições, permitindo, por vezes por inércia, por vezes por cedência, que o Governo possa prosseguir uma política que não se quer e que não serve o País.
Reconhece-se que a conjuntura é extremamente favorável para o relançamento da economia e que o Governo está a desaproveitá-la; reconhece-se que o Orçamento está construído (particularmente no PIDDAC e noutros aspectos) como um orçamento de campanha eleitoral e que o Governo tem recorrido, até ao extremo, à manipulação da comunicação social com fins de escandalosa propaganda; reconhece-se a errada política social, traduzida, por exemplo, nos cortes de verbas para a educação e para a saúde, na recusa da aplicação em 1986 da lei dos salários em atraso, no corte de projectos para a habitação social; conhece-se a prática governamental de asfixiamento e mesmo liquidação das empresas públicas, bem como as acções de liquidação da Reforma Agrária, através de um processo eivado de grosseiras ilegalidades e de torpe imoralidade; salienta-se, em toda a parte, que em sectores fundamentais o Governo demonstra profunda incompetência e ausência de perspectivas (e recordo, por exemplo, neste campo, sectores como o da defesa nacional e da política externa); por sobre tudo isto denuncia-se a postura de confronto assumida pelo Governo contra a Assembleia, contra os partidos da oposição, contra as leis que aqui se aprovam, e denuncia-se a acção de permanente serviço do partido do Governo e da sua instalação nos postos chave da Administração Pública, procurando dessa forma a perpetuação antidemocrática no poder.
Perante este quadro - reconhecido, denunciado e criticado por todos os partidos da oposição democrática - o que pode tolher a iniciativa política, que se impõe, de construir uma alternativa de governo que o País espera?
Sublinho: que o País espera. Porque não são falsas sondagens que dão o sentir dos Portugueses. Ele está, sim, na forma como vêem e se opõem às políticas concretas do Governo. Está, por exemplo, na lutas dos trabalhadores - pelo direito ao trabalho, pelo direito ao salário, contra o desemprego, contra as tentativas de aprovação de uma legislação anti-laboral. Está, por exemplo, nos protestos dos agricultores, vítimas de uma política agrícola incompetente e incapaz de dar resposta a gravíssimos problemas, resultantes, designadamente, da adesão à CEE. E esta, fundamentalmente, no sentimento generalizado de que hoje, nesta conjuntura, se impõe dinamizar a economia, lançar o desenvolvimento, melhorar as condições de vida, e que o Governo compromete esses objectivos e opta pelo eleitoralismo, pela instabilidade, pela ruptura dos alicerces do regime democrático de Abril.
Ao fim e ao cabo é isto mesmo que o Governo pretende: prosseguir a sua política, que sabe condenada por esta Assembleia, e, conhecendo as dificuldades crescentes da sua posição política como governo minoritário, procurar, a todo o custo, evitar a clarificação da situação.
É, aliás, este o sentido mais relevante da intervenção do Sr. Primeiro-Ministro hoje de manhã.
A questão seria, para um governo na situação do governo Cavaco Silva, a de, com clareza, questionar a Assembleia da República sobre a falta de confiança que ela lhe vem manifestando e que lhe manifestou em concreto na rejeição das GOPs. Que o Governo apresente a moção de confiança.
O que é inadmissível é que o Sr. Primeiro-Ministro venha aqui fazer, e não há outra palavra, uma provocação, ameaçando não cumprir o Orçamento, se ele for aprovado, na parte das alterações que a Assembleia lhe introduzir, em vez de fazer o que lhe cumpre fazer - e isso é dito, nomeadamente, no parecer do Prof. Teixeira Ribeiro, que o Sr. Primeiro-Ministro aqui não leu-, que é, não se conformando com as alterações no Orçamento, apresentar a demissão.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A pergunta, feita com clareza, foi a de saber se o Orçamento ia ser executado. A resposta também está dada com clareza quando o Primeiro-Ministro afirma no seu discurso: «Não há lei que possa obrigar um governo a fazer despesas que ele considere um desperdício.» Está feito o comentário do Primeiro-Ministro: reforçar as verbas para os salários em atraso, para a educação, para as empresas públicas de comunicação social, são «desperdícios» para o Governo. Aliás, sabia-se isso. Ficou-se a saber que o Governo estica a corda tanto quando pode e prepara-se, se o Orçamento for aprovado, para não atribuir essas verbas orçamentadas pela Assembleia da República! É um escândalo, Srs. Deputados. Repito-o, é uma provocação. Por isso mesmo é inadmissível!