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1968 I SÉRIE - NÚMERO 50

É óbvio que a dignidade que a Constituição confere a esta matéria resulta do seu especial melindre e de se considerar que a legislação eleitoral é um elemento estruturante do próprio regime democrático, por isso ela também se acha abrangida pelo elenco de matérias que integram o direito constitucionalmente reconhecido de as oposições serem informadas, regular e directamente, pelo Governo sobre os principais assuntos de interesse público. Aliás, está expressamente prevista no artigo 6.º do Estatuto do Direito de Oposição que a refere como um direito de colaboração legislativa.
Ora, Sr. Ministro, o Governo tornou pública a nomeação de uma comissão para a revisão da legislação eleitoral, não tendo previamente consultado os partidos da oposição nem tendo convidado esses partidos para participar nos respectivos trabalhos, ou sequer deles tendo dado qualquer tipo de conhecimento. É sabido que essa comissão terminou a sua função, e o Governo também não deu a conhecer aos partidos da oposição os resultados do seu trabalho, como não declarou ainda de que forma e quando pretende concretizar os intentos que estão, obviamente, implícitos na nomeação da referida comissão, isto é, rever a legislação eleitoral.
Sr. Ministro, isto é uma situação inaceitável, mas, mais, é uma situação altamente inconveniente e porventura frustrante de um correcto procedimento que vise reflectir sobre a legislação eleitoral portuguesa e, eventualmente, revê-la. O carácter secretista do trabalho já desenvolvido, a ausência de diálogo e algumas intenções que perpassam em declarações de certos dirigentes do seu partido, que não podem por certo desconhecer nem os objectivos nem os métodos nem as conclusões dessa comissão, são de molde a causar-nos sérias preocupações. E, também, levam-nos a prover que este processo incorrectamente iniciado e deficientemente conduzido pode vir a acabar mal, isto é, pode vir a constituir não um instrumento de consolidação e aperfeiçoamento do sistema democrático, como desejamos, mas um factor de discordância sobre um dos seus aspectos nucleares, o que pode pôr em causa a própria essência do regime democrático.
Antes de terminar, queria referir que para nós o consenso não é um objectivo e que nem sequer partilhamos aquela tese de que as leis são tanto mais perfeitas quanto consensuais, mas acreditamos que esta é uma matéria em que é importante procurar obter uma ampla convergência democrática e não estou certo de que isso seja um objectivo impossível, a menos que se pretenda confundir a revisão da legislação eleitoral com qualquer manobra eleitoralista ou com uma base de partilha artificial do poder. Não fazemos esse juízo prévio - aliás, ele já foi feito aqui ontem -, mas reconhecemos que o silêncio do Governo nessa matéria não é de molde a assegurar a transparência do processo e incentiva e propicia essas especulações e suspeitas. É por isso que consideramos que as oposições devem ser informadas e que o País tem o direito de conhecer as intenções do Governo. É de resto por isso que formulamos perguntas concretas que esperamos ver cabalmente respondidas por V. Ex.ª.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado Gomes de Pinho, obviamente que o Governo tem muito gosto em informá-lo, compreendendo as razões de natureza preventiva ou profiláctica da pergunta endereçada ao Governo pelo seu partido. Também não ignoramos a posição do seu partido em termos de sistema eleitoral, quanto ao que está em vigor e àquilo que pode ser o objecto de revisão.
Em relação à referência que fez a afirmações de dirigentes partidários do partido que suporta o Governo, julgo que eles não serão dissonantes entre o que diziam antes do Código Eleitoral ter sido encomendado por uma comissão e o que dizem depois.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Posso mesmo assegurar a V. Ex.ª que, tanto quanto eu sei - e julgo que sei o bastante -, não há nenhum dirigente do partido que suporta o Governo que tenha conhecimento do trabalho produzido pela comissão encarregada pelo Ministro da Administração Interna de preparar um código eleitoral à excepção das pessoas que exercem funções governativas, como é evidente, pois o próprio Ministro que encomendou o estudo é também dirigente do partido. Portanto, o que posso acrescentar a V. Ex.ª é que o estudo que foi apresentado ao Governo tão-pouco ainda foi discutido no seu seio. Posso também acrescentar que, por enquanto, esse estudo não é do conhecimento de todos os ministros do Governo, porque está em análise sectorial dentro do espaço governamental próprio. Não há, portanto, opções tomadas e não se pode sequer falar do sentido das opções que venham a ser tomadas. Mais: a comissão que foi constituída é uma comissão que não tem, longe disso, pelo contrário, qualquer cariz de natureza partidária; como V. Ex.ª sabe estão lá personalidades que são tidas por afectas a três, ou até a quatro, partidos. Não veja V. Ex.ª fantasmas numa acção que foi desencadeada pelo Governo com o único propósito de procurar encontrar um estudo que habilite o sistema jurídico português, naturalmente através da Assembleia da República se chegarmos a levar por diante os propósitos subjacentes à encomenda do estudo, com a compilação de diplomas que estão avulsos, a uniformização de normas sobre legislação eleitoral, que não é comum porque, como sabe, os diplomas legais aplicáveis às diferentes eleições para os diferentes órgãos de soberania ou não, que estão dispersos, não tem uma unidade sistemática, o que seria desejável.
Posso também informar V. Ex.ª para seu descanso, que no relatório final apresentado pelo presidente da comissão se afirma categoriamente que não foram recebidas instruções do Governo no sentido de procurar alterar ou não o sistema eleitoral. O que foi pedido foi apenas e estritamente a análise da eventual possibilidade de se compilar num único texto toda a legislação avulsa que existe. Mas isto não significa, obviamente, que o Governo tenha de lhe dizer, aqui e neste momento, que prescinde do seu direito potestativo de tomar iniciativas legislativas nesta matéria e apresentá-las à Assembleia da República. Portanto, não espere o Sr. Deputado que lhe venha aqui garantir e jurar que o Governo nunca irá apresentar na Assembleia da República uma proposta legislativa tendo em vista a alteração da legislação eleitoral. Mas de momento não é isso que está em causa.