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I SÉRIE - NÚMERO 54

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Bertolt Brecht, que foi um dos autores alemães traduzidos por Paulo Quintela, escreveu:

Não preciso de pedra tumular, porém
Se vós precisais duma para mim
Desejaria que se lesse nela:
Este fez propostas.
Nós Aceitámo-las.
Com tal inscrição ficaríamos
Todos nós honrados.

O memorado Professor da Faculdade de Letras de Coimbra foi alguém que marcou o percurso da vida com o sinete da criatividade, da inventividade, dos impulsos renovadores. Fundador do TEUC, desempenhou, na época e no Portugal do marasmo oficialmente tutelado, um papel de actualização, de reformulação positiva e progressiva do nosso teatro, só comparável, como alguém já notou, àquele que a Almeida Garrett coubera nos alvores do século XIX e de que ficaram marcadas imperecíveis no nosso legado histórico-cultural.
Foi pelo engenho e pela pertinácia de Paulo Quintela que os palcos, onde os estudantes coimbrãos actuaram, trouxeram ao convívio do público Lorca, Bertolt Brecht, há pouco referido, Gil Vicente, José Régio, Miguel Torga e tantos outros que são sinais cimeiros de cultura, nacional e internacionalmente considerada.
Já aqui se aludiu à importância enorme da acção do Professor Quintela na Faculdade de Letras e no magistério da vida, no contacto com sucessivas gerações de estudantes.
Republicano, socialista, homem íntegro que nunca pactuou com o servilismo, para quem o espírito de cedência era, antes do mais, uma autoderrota, esteve em cada um dos momentos da luta estudantil e antifascista e, já com o Portugal da liberdade, em todos aqueles em que a esperança se alimentou de construções estimulantes a caminho da dignificação do homem.

Tradutor celebrado de nomes eternos da literatura universal (Reiner Rilke, Goethe, Hölderlin, Brecht, Georg Trake, Nietzsche, Nelly Sachs, entre muitos) deixou-nos, acima de tudo, a lição permanente dessa sua escola do rigor, da seriedade, da autenticidade, que fez com que poetas e leitores nela encontrassem uma referência a tantos níveis paradigmática.

O tempo é escasso. Gostaria, ainda assim, de lembrar que, desde os primórdios da carreira universitária, quando pretendeu defender uma tese sobre Gerhart Hauptmann e os problemas sociais da sua obra, Paulo Quintela se viu confrontado com os impedimentos que, na escola e nas áreas globais da sociedade portuguesa, o obscurantismo e o fascismo prodigalizavam. Dessa confrontação, que assumiu até ao fim, resulta a imagem de uma personalidade fraterna, solidária e exemplarmente livre nos diferentes actos da sua vida.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, nesta circunstância, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, com profundo apreço e com emoção, evoca a figura de Paulo Quintela, honrando-lhe, a memória, sabendo - como Rilke - «que os mortos estão sempre ocupados», que é o «coração mortal lagar dum vinho inesgotável para os homens» e, sobretudo, que a sua luz continuará nos nossos passos confiantes para o devir.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Gama tem a palavra.

O Sr. - José Gama (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: realizou-se há dias em Bragança um encontro de futebol entre a Académica e o Desportivo local. O resultado não fica, obviamente, para a história. O que fica para a história é a razão por que esse encontro se realizou.
Coimbra e Bragança, no amplexo fraterno, quiseram homenagear o ilustre português que dá pelo nome de Professor Paulo Quintela.
Coimbra, que era a sua segunda terra, essa Coimbra que, bem recentemente, o havia distinguido com a medalha de ouro da cidade; Bragança, a terra que o viu nascer, o ilustre filho de um pedreiro, como ele orgulhosamente se referia ao seu pai.
Paulo Quintela era um homem singular; era homem espontâneo, com aquela espontaneidade que habitualmente se lê nos autos vicentinos, de que ele era um grande apaixonado; era um homem agreste por vezes, agreste mas sincero; era um homem da geração dos homens de «antes quebrar que torcer», mas era também e acima de tudo um homem - como dizia o Sr. Deputado Raúl Rêgo - de coerência granítica, característica que normalmente se encontra nos homens que vêm das ladeiras do Nordeste transmontano. Esta coerência, que fez dele, sempre dele, o homem independente, o homem que estava no lugar certo, o homem que tinha a coragem de nunca permitir que a sua independência fosse leiloada, embora fosse e sempre foi um socialista convicto. Mas era também um mestre amigo em quem os alunos confiavam. E este confiar dos alunos, esta devoção aos seus alunos, custou-lhe alguns dissabores académicos e alguns prejuízos também.
Paulo Quintela era - e recordo-me aqui de Jacques Marithan - uma pessoa capaz de se dar. Ele dava-se à cultura e dava-se aos seus alunos. E, por isso, à cultura em Portugal ficou mais empobrecida, particularmente em Coimbra - onde ele foi mestre ilustre, germanista, humanista - e, de forma particular, o TEUC, que levou o teatro português às diferentes paradas, do mundo, perdeu o seu fundador e perdeu a sua alma mater de há dezenas de anos.
E os transmontanos, nós os transmontanos, perdemos uma das glórias de que nos podemos orgulhar.
Homem que era uma fraga inamovível, esse Professor Paulo Quintela; homem que quis ser enterrado na sua terra na resposta ao seu apelo final das raízes ou, como diria Eça de Queirós, na resposta ao chamamento dos penhascos.
O CDS associou-se ao voto de pesar do Professor Paulo Quintela e relembra aqui, com emoção e muito respeito, a sua memória.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A cultura é, manifestamente, um dos limites de fronteira das comunidades e dos homens que nelas se inserem.
Os homens de cultura perfilam-se em relação ao universo, ao mundo, ao devir; em relação às alternativas, numa perspectiva permanentemente aberta e criadora.