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1582 - I SERIE - NUMERO 45

governo com um mandato de quatro anos, ainda que maioritário, não pode arrogar-se o direito de determinar sozinho o futuro de Portugal e da adesão às Comunidades.
Há em tudo isto, Srs. Deputados, e a cerimónia de hoje não o disfarça, enormes défices que se manifestam gritantemente nas políticas comunitárias do Governo.
Há, em primeiro lugar, um défice de visão da dinâmica estruturante da construção europeia. A única dimensão da construção europeia que o Governo parece considerar é a dimensão económica. As dimensões social, cultural e política não estão certamente no cerne da Europa que o Governo pensa ou visa nem no cerne de perguntas que se façam. Questão âmago do debate nacional, que é preciso ter em seu redor.

Aplausos do PS.

Repare-se, por exemplo, que para este agendamento parlamentar o Governo invocou essencialmente o Mercado Interno. Ora, para nós, portugueses, será quase um suicídio cortar o cordão umbilical que desejavelmente deve ligar a Europa do Mercado Interno, a Europa Social, a Europa Cultural Política. Então porquê reduzir o essencial da questão à Europa do Mercado Interno? Não será isto uma indesejável redução? Por que é que ficamos apenas pelas perguntas? Por que é que não é diariamente que este debate se faz continuadamente na interface necessária entre a cooperação dos parlamentos nacional e europeu? Por que é que só agora, depois da entrada em vigor de uma lei da Assembleia da República, que esteve jazente, se traz este debate promovido pelo Governo quando é no quotidiano do trabalho parlamentar que todas estas questões têm de ser vistas, toda esta problemática tem de ser analisada e as opções têm de ser confrontadas naquilo que é a pluralidade da representação nacional?
Para o PS, o projecto europeu não pode estabelecer uma cortina rígida entre a economia e a sociedade, nas suas mais diversas manifestações. O reforço simultâneo dos factores de coesão económica, de coesão social e de afirmação de identidade cultural constituem a chave do desenvolvimento, quer do projecto europeu, na sua globalidade, quer do projecto nacional na especificidade da nossa contribuição para a Europa do futuro.
Para o Governo, a versão económica e social é para uso externo. É afinal uma óptica constante e desintegrada reclamação de pagamento pelo vínculo que, na falta de um desígnio nacional, nos condena, infelizmente, estatuto quase de Estado cliente a que, pela nossa parte, nos não resignaremos. É afinal o resultado inevitável da actuação de quem confunde crescimento com desenvolvimento, de quem identifica modernização com conflitualidade permanente, para quem a cultura é tantas vezes algo de restritivo quando não de mercadoria.
Neste contexto, que é o que se vive entre nós e que desejamos ultrapassar, a adesão como futuro arrisca--se a ser e combatê-lo-emos, a unicidade do mercado. Para nós, o futuro está também no reforço das tradições da cultura, da democracia, da participação, da liberdade, da criatividade, da solidariedade que, no seu conjunto, constituem a força do modelo civilizacional europeu. É urgente colmatar este défice sobre a nossa participação, sobre a participação de Portugal na CEE.
Igual e fortemente nos preocupa que mesmo do ponto de vista do Mercado Interno, a visão do Governo seja simplista e simplificadora. Sem dúvida que o Mercado Interno trará benefícios para Portugal, mas também trará a preocupação dos prejuízos se não forem devidamente compensados os efeitos cumulativos negativos que a experiência mostra acompanharem sempre a integração de economias débeis em vastos espaços económicos dominados por outras economias muito mais fortes. Que se saiba - e repito, que se saiba - o Governo não estudou minimamente esta questão, ou não nos disse onde é que está o resumo dos seus estudos. Tem-se limitado a ponderar a superfície dos problemas postos pelas centenas de medidas em que se vai traduzindo a aplicação do «livro branco» sobre o Mercado Interno. São raríssimos os estudos sectoriais que permitem tirar conclusões fundamentais. Com uma ou outra excepção, as posições portuguesas não são definidas em função de profundas fundamentações técnicas, ou pelo menos não as conhecemos.
Neste momento, e que conste, sublinho, o Governo não dispõe de qualquer estudo global sobre os efeitos do Mercado Interno na economia nacional, na sociedade portuguesa. Será que poderemos continuar assim?
O Governo parece louvar-se nas conclusões do relatório Cechini. Porém, este limita-se a afirmar de passagem o que é, manifestamente, óbvio. Ou seja, que os benefícios do Mercado Único serão desigualmente repartidos. Mas seria interessante que o Governo nos desse também a sua opinião sobre o que foi o relatório Padoa-Schioppa, singularmente esquecido, e que demonstra que se corre o risco, sempre fundado, de economias mais desenvolvidas sofrerem consideráveis penalizações relativas se não forem postas em prática adequadas políticas a essas consequências.
Como pode o Governo assegurar que é isso mesmo que se está a fazer se, até agora, não há qualquer estudo global sobre o impacto, positivo ou negativo, do Mercado Interno na economia portuguesa? Não é à comissão que compete a iniciativa desse estudo, é a Portugal que cabe, em primeiro lugar, essa responsabilidade. Está em cima da Mesa, na Assembleia da República, resolução que apresentámos, em Julho de 1988, na esperança de sobre ela se criar um consenso, que até agora se não verificou, sobre o estudo daquilo que poderia ser o impacto do projecto do Mercado Único na economia e na sociedade portuguesa. Oxalá esse debate sirva, ao menos, para que se estabeleça um consenso sobre a criação e a necessidade desse estudo feito pelo Governo, pela Assembleia da República e demais parceiros.
Na realidade, uma sessão, como esta, organizada e desejada na ausência de informação prévia - e entendamos sobre o que deve ser informação prévia - que não é um roteiro de meia hora ou de duas horas de mês a mês, mas sim uma prática consequente e permanente em que essa cooperação informativa permita destacar as opções. Não é um desfile que faz uma política. O que faz uma política é a cooperação institucional.
Tudo isto parece-se mais com o consagrar da falta de hábito quanto a uma discussão institucionalizada permanente e, portanto, nessa medida, não pode ser um verdadeiro debate parlamentar de forma a ser a conclusão de um trabalho concertado e permanente, através de meses e meses de conjunto de trabalhos na Assembleia da República. É por isso que propusemos em Julho o que propusemos.