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1594 I SÉRIE - NÚMERO 45

indicadores quantitativos cujo significado vem sendo questionado pelo menos desde a década de 60.
E o Sr. Primeiro-Ministro chegou, inclusive, ao despudor de ter afirmado perante esta Assembleia aquando da discussão final do Orçamento do Estado que «A elevada taxa de crescimento, dupla da média registada na CEE, proporcionou já a subida do rendimento per capita dos portugueses, de 2100 dólares em 1985 para cerca de 4300 dólares em 1988». E refere ainda o Sr. Primeiro-Ministro que «isto é mais do que 105%».
Ora, isto é despudor e na altura foi uma falta de consideração muito grande por esta Câmara e por todas as bancadas aqui representadas.
E se falamos nisto nesta altura é só para dar oportunidade ao Sr. Primeiro-Ministro de apresentar desculpas públicas a esta Câmara e ao país, porque isto teve alguma ressonância em termos dos meios de comunicação social. Alguns meios de comunicação social referiram isto em primeira página.
Srs. Deputados, fazer isto é despudor; é não ter em conta que estes 105% só foram possíveis porque entretanto e neste período ocorreram duas coisas: por um lado, uma desvalorização extremamente pronunciada do dólar na ocorrência de um pique mais elevado e de um pique mais abaixo. Por outro lado, porque não se teve em conta a depreciação da moeda na evolução relativa das taxas de inflação de Portugal e dos países da CEE.
Isto foi muito grave e mostra como, de facto, em matéria de propaganda o Sr. Primeiro-Ministro trata a Assembleia da República e o País.
Este Governo, como disse, está fora do tempo. É escusado pedir-lhe que equacione os desafios de futuro.
A integração na CEE e principalmente a construção do grande mercado interno colocam a um país pequeno e periférico questões vitais para o seu futuro. Entre elas ganham relevo, em primeiro lugar, a questão do papel que podemos assumir na Europa, das apostas que merece a pena fazer e do esforço necessário para as ganhar. Deixar funcionar livremente a lei das vantagens comparativas será perpetuar Portugal como um parente pobre da Europa embora podendo beneficiar dos restos que caiem da mesa dos ricos. Não se pede que o Estado controle e imponha mas que enquadre, oriente e estimule. O desafio é o de encontrar políticas criativas capazes de mobilizarem os recursos e o potencial de iniciativa dos portugueses.
Em segundo lugar, os problemas da organização do espaço e do futuro das regiões. A livre prestação de serviços por empresas sediadas no estrangeiro não poderá ter impacto negativo no desenvolvimento das grandes metrópoles como Lisboa e Porto? As regiões fronteira poderão ter algum benefício de uma maior proximidade à Europa e de uma maior integração com as regiões espanholas? O aprofundamento das vantagens comparativas não poderá levar a uma maior exploração de recursos naturais e a um acelerar da desertificação de algumas regiões? Estarão as nossas cidades em condições de oferecer as infra-estruturas, os equipamentos, os serviços e facilidades capazes de atraírem actividades que não apostem apenas nos baixos salários dos portugueses?
São questões que até hoje o Governo não quis equacionar. Melhor dizendo, não pôde.
Não pôde porque o Governo está prisioneiro do complexo do «grande irmão». Sabe tudo. Quer controlar tudo.
Não pôde porque é incoerente. Ao mesmo tempo que defende a libertação da sociedade civil e promove o liberalismo económico, aprofunda o carácter centralizador do aparelho do Estado e investe contra a autonomia do Poder Local.
Não pôde porque lhe falta humildade, por que não é intelectualmente honesto, porque lhe basta o respeito da lei mesmo em prejuízo da moral.
O Governo vem recentemente a delinear uma estratégia de ataque ao Poder Local acompanhada da criação de fantasmas contra a regionalização, usando despudoradamente o argumento do desafio de 1992.
Tal actuação só se compreende se aceitarmos quatro premissas como válidas:

1.ª O papel do Estado limita-se à distribuição de recursos dados por usos predeterminados por forma a atingir a máxima existência.
2.ª O Governo central é quem melhor é capaz de definir esse usos e proceder a escolhas alternativas.
3.ª O Governo central dispõe de maior capacidade técnica e é menos imune aos conflitos de interesses, pelo que pode decidir com maior racionalidade.
4.ª O Governo central é capaz de interpretar os interesses homogéneos da população.
Se olharmos a experiência dos nossos parceiros da CEE em todos encontramos um esforço para pôr sobre o terreno agentes institucionais capazes de promoverem uma política criativa visando directamente a dinamização do potencial económico e carregando novas energias e novas fontes de financiamento de desenvolvimento. As autarquias locais, em particular as de nível regional têm sempre um papel fundamental.
A experiência portuguesa revela que o grande empecilho à tomada de decisões é o conflito de interesses entre os níveis idênticos da administração corporizados nos diversos ministérios. Porque não avançam Alqueva e a Cova da Beira? Porque tarda a implementação da OID da Península de Setúbal? Em matéria de desenvolvimento regional, a experiência portuguesa e de outros países está cheia de erros colossais cometidos pela administração central. Quem foi o responsável pelo projecto (hoje inútil) do Douro navegável? Quem foi o responsável por Sines? Quem conduziu erradamente a política de parques industriais? Quem não sabe hoje o que fazer com decisões que tardam sobre o plano ferroviário, a rede de gás natural, o aeroporto de Lisboa, etc? Não se nega que estas são decisões de nível nacional. O que se nega é que o Governo seja mais eficiente nas suas decisões do que qualquer outro nível do poder. A experiência italiana, por exemplo, revela bem que os grandes erros da política regional foram da responsabilidade de organismos centralizados.
Não se compreende num regime democrático que o Governo entenda em abstracto os interesses nacionais e se julgue o fiel intérprete de todas as aspirações, mesmo das que são específicas de uma dada área. Fará sentido, por exemplo, que se imponha à população algarvia um traçado da via longitudinal que vai contra os seus interesses e que os próprios organismos oficiais inicialmente não defendiam? Mas foi seguramente uma solução à Governo do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Não se tratou aqui, sobretudo nesta parte final da intervenção, de fazer mais um discurso regionalista. Trata-se, sim, de lembrar ao Governo que deve