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18 DE MAIO DE 1989 3939

esse debate vivíssimo, porque tenho, de facto, respeito por essa sinceridade, devo dizer que às vezes me parece que temos aqui PSD e PCP numa «tracção à corda», fora do mundo real, bloqueados um face ao outro, ambos a mesma moeda em que uma face é a de que é preciso privatizar os meios de produção e a outra em que é preciso colectivizar os meios de produção. Isso não é um debate do nosso tempo e nunca será, espero eu, um debate da civilização do imaterial.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É muito pouco europeu e do nosso tempo?!

O Orador: - Nestas condições, temos de fazer face a modificações profundas no enquadramento da regulação económica, porque o que estamos aqui a tratar no artigo 83.° é de uma matriz, que não é evidentemente a única, de regulação económica fundamental.
E há quatro mutações para as quais queria chamar a vossa atenção: a primeira tem a ver com a profunda internacionalização da economia portuguesa, ainda que não tenhamos dado por isso e às vezes não chamemos as coisas por esse nome. Uma economia tão aberta e tão pequena como a nossa, é uma economia que, de facto, já não tem a menor capacidade de se repensar, de se reflectir, de se ver sequer a não ser num espelho de fantasia, num espelho de formato seja ele A ou de B, como uma economia não profundamente internacionalizada, mesmo que os gestores da maior parte das nossas empresas não sejam ainda espanhóis, franceses ou não sei quê. São-no, muitas vezes, por interposto mecanismo.
A segunda mutação importante é a de que os pontos de controlo e de orientação dos sistemas económicos têm hoje de estar precisamente no domínio do imaterial, na possibilidade de gerar, de absorver, de transferir e de controlar o imaterial - e aqui Portugal tem uma enorme debilidade organizacional, porque, de facto, quanto a esse aspecto temos anos-luz de atraso e todos sabemos porquê!...
A terceira mutação é esta: no novo sistema, em que a lógica combinatória integrativa é de uma extrema mobilidade, sucede que não há fronteiras entre actividades, instituições, empresas, sectores e produtos. Um dos maiores bancos americanos é a General Electric, uma das maiores empresas de telecomunicações entra no campo da IBM e esta, por sua vez, entra no campo das telecomunicações; hoje, por exemplo, as companhias de águas são procuradas pelas companhias de seguros e pelas de vendas de serviços, que antigamente se faziam em balcões nas ruas principais; e os exemplos multiplicam-se.
Num mundo destes, eu, que fui um forte defensor dos sectores básicos e tinha algumas definições pseudo-rigorosas, hoje tenho outras definições e outros conceitos de sectores básicos...

A Sr.» lida Figueiredo (PCP): - Já demos por isso!

O Orador: - ..., que me parecem bastante mais relevantes e mais próximos do que é a realidade não digo portuguesa mas mundial. Não são os mesmos conceitos! Se o paradigma mudou não podem ser os mesmos. E se antigamente se pensava que era possível inserir o sector nacionalizado em certo tipo de regulação, hoje é perfeitamente patente que na situação em que a economia portuguesa se encontra não é possível fazer isso. Nestas condições, temos efectivamente de mudar e de mudar racionalmente, com paixão de futuro e não de passado, com vontade de fazer futuro e não de defender e de «ser o último soldado a cair morto em Goa» - não sou nem quero ser, pois ninguém em Portugal o merece!!
Deste modo, o que aqui se diz é que nos próximos cinco anos a economia portuguesa vai ser sujeita a um tal teste de mudança - e sabendo-se o que se sabe do passado sobre esta querela constitucional, interpretada nalguns casos como uma defesa fixa de um mundo que já não existe e, noutros, como um ataque fixo a um mundo que já não existe - que é preciso encontrar um modo de proteger, de um lado e de outro, os recursos nacionais, que ainda existem (e, esses sim, estão a ser pura e simplesmente delapidados pelo estrangulamento sistemático do Governo PSD face ao sector público e pela defesa cega que outros fazem contra esse estrangulamento sistemático); há que encontrar uma saída nacional para o futuro e não organizar um cortejo de carpideiras para enterrar aquilo que o PSD, pela sua lógica de ataque do século XIX, vem querendo enterrar.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Isso não é verdade!

O Orador: - E este artigo é concebido com essa largueza, salvaguardando integralmente aspectos de moralidade, de transparência e de direitos dos trabalhadores. Eu, acima das fábricas, defendo os homens que lá estão, acima das fábricas que os querem para delas se apoderarem como se isso si por si lhes desse poder, e os outros que as querem defender, como se isso só por si fosse a marca do seu compromisso para com o futuro, quando elas já são do passado. Acima disso, há que salvar e dar futuro e perspectivas não só àqueles trabalhadores que ali estão mas, também, aos outros que com eles são solidários e que deles dependem, ou seja, no fundo, dos recursos nacionais. Esta é a grande lógica desta transformação que abre perspectivas com algum risco, sejamos claros!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Isto é o risco que importa viver em democracia, o risco que importa viver sem ser em comando central, o risco que importa viver em liberdade e apelando para a liberdade e solidariedade de todos.
É evidente que um governo que queira subverter e combater o sector público empresarial, que continua a ter razão de existir sob uma forma diferente, pode fazê-lo. Aliás, já hoje o pode fazer como vai fazendo, todos reconhecemos, não há aqui nada de novo. E essa possibilidade é inerente ao jogo democrático da maioria e resulta de se querer ou não a democracia.
Então, esse é um outro problema que não é o que estamos aqui a discutir, ou seja, é o risco da democracia, que alguns não querem correr, porque ao fazê-lo correm outros riscos que rejeito, pelo que gostaria que acabassem os alibis.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Exacto!

Vozes do PCP: - Já não havia!

O Orador: - É por isso que se fazem estas alterações constitucionais. Daqui por diante não há mais alibis...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Só há mais um!