24 DE JANEIRO DE 1990 1231
e o perfil dos membros a designar pelo Governo como «representantes da opinião pública, da comunicação social e da cultura», devendo figurar, neste particular, os representantes da classe dos jornalistas, dos empresários dos jornais e dos autores portugueses.
Estamos de acordo com aqueles que defendem que «não foi constitucionalmente atribuído à AACS o monopólio das funções de fiscalização nas áreas que lhe foram atribuídas, pelo que a sua acção poderá o deverá articular-se com a de outros órgãos, como o Conselho de Imprensa, e funções no plano deontológico em que o seu papel é insubstituível», como escreve o Sr. Deputado José Magalhães na obra atrás referida.
O Conselho de Imprensa, desde a sua criação, tem funcionado entre nós como uma verdadeira provedoria da comunicação social, pela sua actuação como instância de conciliação, quer nos conflitos entre leitores e jornalistas, quer nos conflitos internos à empresa jornalística quando decide sobre os limites deontológicos ao exercício da actividade informativa, quando contribui, com a sua reflexão, para elaboração das normas jurídicas aplicáveis ao sector, ou ainda quando concorre para a necessária auto-contenção dos profissionais da informação - o que os tribunais não fazem - no cumprimento das regras que se lhes aplicam. Como se lê num seu comunicado, recentemente distribuído aos grupos parlamentares, «a especificidade das funções do Conselho de Imprensa, que se move, sobretudo, no domínio do cumprimento das regras deontológicas, que visa persuadir e conciliar, que actua como uma consciência cívica dos vários sectores da actividade informativa, desaconselha a sua extinção sumária e injustificada, como faz a proposta governamental.
Em nosso entender, o Conselho de Imprensa deve manter-se com a sua independência e as atribuições não absorvidas pela Alta Autoridade, e que tão necessárias são para a democracia interna do sector da comunicação social».
Em vez de Alta Autoridade, pelo nosso lado, gostaríamos de ver instituído entre nós um órgão que em França substitui aquele em que o PS se foi inspirar, o CSA, o Conselho Superior de Áudio-Visuais, estabelecido pela Lei de 17 de Janeiro de 1989, que reformulou muitas das antigas atribuições, libertando o sector privado da sua jurisdição e, mesmo relativamente ao sector público, distinguindo as actividades de produção e de difusão para sujeitar apenas estas últimas à competência do CSA.
Finalmente, referiremos uma lacuna que terá de ser preenchida no debate da especialidade. A intervenção da Alta Autoridade, mesmo que a título consultivo, no tocante aos dossiers internacionais sobre os áudio-visuais. Se é inquestionável que a negociação internacional 6 da exclusiva competência do Governo, a audição prévia da Alta Autoridade, quanto à elaboração de directivas comunitárias, à televisão transfronteiras, à liberdade de circulação dos programas, entre outros aspectos, devem merecer a nossa atenção e a da Alia Autoridade na feitura ou na importação destas directivas.
Como ficou exposto, aprovaremos, na generalidade, a proposta governamental e os três projectos de lei para, em conjunto, serem analisados em sede de especialidade.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, uma vez que admitimos que o Sr. Deputado Narana Coissoró consegue responder em 30 segundos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, se o Sr. Deputado Narana Coissoró não conseguir responder em 30 segundos, conseguirá, provavelmente, fazê-lo no dobro desse tempo, ou em alguma coisa similar, que, pela nossa parte, estamos dispostos a ceder.
O Sr. Deputado Narana Coissoró citou dois aspectos, que creio serem particularmente importantes, em relação aos quais penso valer a pena aprofundar.
O primeiro aspecto tem a ver com a natureza desta Alta Autoridade. E um facto que quem fizer o contraponto entre esta Alta Autoridade e o Conselho a que sucede verificará que, entre outras diferenças, há uma, importante, que é a de que a Alta Autoridade diz respeito a todos os órgãos da comunicação social, incluindo, naturalmente, os privados.
É óbvio que seria injusto - e creio que nesse ponto o Sr. Deputado tresleu o projecto de lei do PCP - aplicar o mesmo regime aos órgãos de comunicação social privados, em particular à imprensa privada, às entidades públicas, em especial à imprensa pública, e aos órgãos de outra natureza. Porquê? Porque é óbvio que continua a aplicar-se constitucionalmente todo o acervo de princípios decorrentes do artigo 38.º da Constituição, em matéria de liberdade de imprensa, e, portanto, sendo certo que o Estado deve garantir, nos termos do n.º 4, a liberdade e a independência de todos os órgãos de comunicação social perante o poder público, político e económico, impondo, para esse efeito, determinadas regras, é óbvio que isso não legitima uma intervenção indébita, ou uma ingerência, na sua estruturação, organização, funcionamento e expressão de ideias. Logo, a Alta Autoridade está limitada neste ponto de vista.
De qualquer modo, é bom que a lei clarifique esse aspecto, e o projecto de lei do PCP procura fazê-lo, enquanto o texto governamental não o faz, e esta é uma diferença significativa.
O outro aspecto que refiro articula-se com aquilo que poderemos chamar «o princípio da articulação».
É óbvio que a existência de uma Alta Autoridade, tal qual é configurada na Constituição, tem de articular-se com outras estruturas. Desde logo, entre nós, aconteceu que foi por sedimentação e por saltos sucessivos que o direito da comunicação social se foi gerando. Por exemplo, neste momento, o licenciamento, se assim se lhe pode chamar, de antenas para recepção de televisão via satélite é alguma coisa que está na esfera governamental, embora seja susceptível de ser devolvida a outras entidades.
A matéria relativa aos licenciamentos de rádio é da competência do Governo, mas com a intervenção de um Conselho da Rádio; a intervenção em matéria de licenciamento de frequências televisivas é da competência do Governo, embora com esse elemento fundamental e condicionador que é um parecer relevante da Alta Autoridade. Há, portanto, uma pulverização.
Curiosamente, o Governo, face a este quadro de pulverização, mantém a má e liquida a boa pulverização, que é a que decorria da existência de um conselho autónomo e independente, como o Conselho de Imprensa.
Gostava que o Sr. Deputado Narana Coissoró pudesse aprofundar a visão do seu partido em relação ao que se deve entender por uma pulverização saudável e uma pulverização doentia, porque creio que aquela para que o Governo aponta é de todas a mais doentia, e não acredito que, desse ponto de vista, o CDS possa ser tão perversamente pulverizador como este Governo, que está preocupado, obviamente, numa pulverização governamentalizadora.